Três coisas que podem acontecer nas eleições dos EUA e que o mercado não prevê

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No próximo dia 3 de novembro os cidadãos dos EUA têm um encontro com as urnas no qual vão decidir entre a continuidade do polémico Donald Trump como presidente dos EUA ou o democrata Joe Biden. As sondagens indicam que será Biden que ficará com a presidência do país, mas isso não quer dizer que as próximas semanas vão estar isentas de uma incerteza que também se vai fazer sentir nos mercados de valores.

Ao fim e ao cabo, não nos podemos esquecer que há apenas quatro anos o mundo amanhecia com a vitória contra todos os prognósticos de Donald Trump pelo que a pergunta é óbvia: pode voltar a haver surpresas este ano? Segundo explica Ronald Temple, diretor-geral, corresponsável de Multiativos e responsável de Ações dos EUA da Lazard Asset Management, há algumas diferenças entre como se chegam a estas eleições e como se chegou há quatro anos que convidam a limitar o efeito surpresa.

“Acredito que em 2016 muita gente que dizia estar em dúvida provavelmente não estava e já sabia que ia votar em Trump, mas tinha vergonha. Agora não há essa vergonha, já que os indecisos são agora de 5% face aos 16% de 2016. Outra diferença é que as sondagens hoje são mais consistentes que as do passado. Agora também há terceiros partidos e há um melhor rating dos candidatos. Há muita dispersão a favor de Biden, cujo rating é positivo face à visão negativa de Trump. Em 2016 os ratings de ambos os candidatos eram negativos”, afirma este especialista.

Apesar de considerar que atualmente são dois os cenários principais nos quais podem derivar as eleições: uma blue wave (onda azul) na qual os democratas tomam o controlo do congresso e senado, e um resultado de goldilocks no qual o congresso fica nas mãos dos democratas e o Senado nas mãos dos republicanos, expõe outros três cenários que, se acontecerem, poderão aumentar a volatilidade por não ser nenhum deles o que o mercado espera.

O primeiro deles refere-se a que haja falhas na contagem dos votos, rejeição de votos, supressão de votantes e/ou intimação dos mesmos, como aconteceu na Florida no ano 2000 ou nas primárias deste ano em Wisconsin, o que implicará a intervenção dos Tribunais. O segundo, conforme aponta Temple, é que o presidente Trump não aceite o resultado no caso de perder as eleições, algo que nunca aconteceu antes. A solução neste caso “não é clara porque a Constituição dita que a presidência mude de mãos no dia 20 de fevereiro ao meio-dia”, afirma Temple. E o terceiro é que pode haver um empate técnico. “É altamente improvável, mas matematicamente possível e implicará que a Câmara dos Representantes eleja o presidente com a fórmula de cada estado com um voto e o Senado o vice-presidente”, afirma Temple.

A incerteza não acaba a 3 de novembro

Além destes três cisnes negros que poderão acontecer após a data eleitoral, há outro acontecimento que inquieta os especialistas: a possibilidade de que se conheçam tarde os resultados. “Espero que saibamos os resultados a 9 de novembro. Caso contrário, pode haver muita volatilidade”, afirma Temple.

“O pior cenário para os mercados a curto prazo é uma eleição disputada, pois a maior dependência do voto por correio pode dar lugar a atrasos nos resultados de Estados-chave e qualquer dos candidatos podem impugnar a eleição se for muito renhido. Isso atrasará qualquer estímulo pós-eleitoral e no pior dos casos conduzirá a distúrbios públicos. Na eleição de 2000 entre George W. Bush e Al Gore os mercados caíram 8% desde as eleições até ao mínimo durante o mês que demorou o veredicto”, recorda Supriya Menon, estratega de Multiativos, e Marco Persimoni, gestor da Pictet AM.

Devido à irrupção da COVID-19 nestas eleições, espera-se que votem pelo correio um número record de 80 milhões de americanos. “Isto significa que os intervenientes oficiais da votação vão processar mais do dobro dos votos por correio dos que processaram durante a última campanha presidencial em 2016”, recorda John Emerson, vice-presidente da Capital Group International, Inc. e ex-embaixador dos EUA na Alemanha. Além disso, sublinha que o número de democratas que estão a solicitar o voto por correio é muito maior do que os republicanos, “o qual pode produzir uma situação onde os resultados dos comícios sejam aparentemente favoráveis a estes últimos e depois, com os votos por correio, que demoram mais a ser contados, deem uma vantagem aos democratas”.