Terão efeito no longo prazo as medidas do Banco de Inglaterra?

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Bank of England, Flickr, Creative Commons

O Banco de Inglaterra (BoE) optou, na semana passada, por utilizar toda a artilharia pesada para responder ao impacto negativo do Brexit sobre a economia britânica. O seu governador, Mark Carney, anunciou um corte nas taxas de juro para um mínimo histórico de 0,25%, um programa de aquisição de obrigações corporativas, a ampliação do programa de QE de dívida soberana já existente e a criação de uma linha de liquidez para a banca (TFS na sua sigla em inglês). Além disso, reduziu drasticamente as previsões de crescimento para 2016 (ler mais). Ian Spreadbury e Sajiv Vaid, gestores de fixed income britânica da Fidelity International, acreditam  que “poderá afirmar-se que a decisão marcou o nascimento do “tudo o que for preciso” de Mario Draghi na versão Carney”. Agora, no seu ponto de vista, a pergunta chave é se esta política monetária agressiva funcionará para a economia inglesa.

Os analistas analisam, em primeiro lugar, o efeito no longo prazo da redução da taxa de juro. “A teoria das taxas de juro baixas diz que estas enfraquecem a moeda e sustêm a economia, ou estimulam o crédito e impulsionam o PIB. Mesmo que no Reino Unido tenha funcionado até certo ponto, o problema da primeira opção é que, num cômputo geral, é um jogo de soma zero”, explica o duo de especialistas, referindo-se a que, na competição para desvalorizar a moeda tem sempre que haver alguma contraparte que se aprecie.

No que respeita a segunda opção, opinam que “incentivar as pessoas a pedir créditos quando a relação entre a dívida mundial e o PIB está já em máximos históricos tem poucas probabilidades de êxito”. Spreadbury e Vaid têm especificamente em mente a geração de britânicos que planeia reformar-se nos próximos cinco a dez anos, pois consideram que esta classe de aforradores poderá ser a mais prejudicada: “Vão precisar de um capital muito maior para conseguir o mesmo rendimento depois das taxas de juro terem caído para um nível tão baixo. À medida que as taxas de juro vão caindo mais e mais, existe a possibilidade real de que as pessoas digam “preciso de poupar mais” e, até certo ponto, as taxas baixas podem ter o efeito contrário ao desejado”, resumem.

Adicionalmente, sobre o TFS, Spreadbury e Vaid consideram que, ao estar desenhado para conseguir que os bancos continuem a emprestar, “devemos ajudar a mitigar em parte o efeito do corte de taxas de juro sobre as suas margens”.

O terceiro ponto da análise é o programa de obrigações corporativas, que representará cerca de 10% do volume de títulos em circulação admissíveis. “Um aspeto crucial é que a entidade assinalou que as compras de obrigações se estenderão durante 18 meses, enquanto que as compras de dívida pública durarão seis meses, o que implica reconhecer o impacto que terão na liquidez”, indicam os gestores. Ainda que estes indiquem que a medida do BoE tem uma magnitude inferior à sua homóloga do BCE, consideram igualmente que “ajudará a manter abertos os mercados de dívida corporativa em libras esterlinas e poderemos ver uma subida do volume de emissões desde os baixos níveis atuais”.

Que ferramentas tem ainda o BoE?

Apesar de 100% do consenso esperar já um corte nas taxas de juro, a instituição conseguiu surpreender o mercado com a contundência das restantes medidas do pacote de estímulos. Os especialistas perguntam-se que truques pode ter o banco central na manga, agora que as taxas estão próximas de zero. Além disso, há que recordar que a instituição está a adquirir dívida soberana há vários anos.

“Mesmo que possa parecer que o BoE está a ficar sem margem de manobra, o mais certo é que o Banco do Japão e o BCE demonstraram este ano que qualquer coisa é possível no plano da política monetária”, afirmam os especialistas da Fidelity. Dito isto, veem “improvável nesta altura”, que o BoE se junte ao clube das taxas negativas, embora consideram que “é totalmente possível a mais longo prazo”. Portanto, para eles a questão não é se o banco central pode ou não, mas se deverá fazê-lo, considerando que “a grande interrogação é se as taxas negativas são realmente uma estratégia que funciona”.

Por outro lado, os investidores não devem esquecer que a instituição monetária poderá recorrer a outras medidas pouco ortodoxas que apoiem os estímulos quantitativos. “No entanto, no caso de que os estímulos monetários fracassem, uma melhor opção para estimular a economia seria que o BoE embarcasse num programa de estímulos orçamentais”, afirmam Spreadbury e Vaid. Estes também consideram que é “demasiado cedo para começar a falar de helicópteros a largar notas e demais estratégias”.

Funcione ou não, a bateria de estímulos, a dupla de especialistas tem algo bem claro que expõe em conclusão: “Estamos completamente seguros de que o BoE manterá a sua postura expansiva e as probabilidades de que se apliquem novos cortes de taxas de juro e medidas quantitativas constituem um factor muito positivo para o investimento em obrigações”.