Sell in May and go away?

Carlos_Bastardo
Vitor Duarte

Uma das velhas máximas dos mercados financeiros é sell in May and go away. Muitos analistas financeiros, suportados pelas evidências dos volumes transacionados em bolsa e pela evolução dos preços dos ativos com risco em muitos anos, levantam por esta altura a mesma questão e 2019 não escapa à regra: será que se vai repetir aquela máxima?

Depois de 4 meses em que o mercado de ações teve um comportamento positivo, recuperando de um último trimestre de 2018 desastroso, eis que o mês de maio trouxe novamente volatilidade, causada pelos fatores suspeitos do costume: guerra comercial, Brexit e risco geopolítico (EUA versus Irão e Coreia do Norte).

A época de resultados do primeiro trimestre até decorreu melhor que o esperado, mas a estratégia de Trump (se é que se pode chamar estratégia!...) faz com que o fator de risco com mais influência na confiança dos agentes económicos seja a guerra comercial EUA / China e EUA / Europa. Há já empresários americanos de diferentes setores que estão contra as medidas de Trump, uma vez que os seus negócios são os primeiros a ser prejudicados.

Alguns analistas ainda consideram ser possível um acordo entre as duas maiores potências económicas, mas as recentes evidências, nomeadamente o novo agravamento de tarifas alfandegárias dos EUA e da China e as questões da segurança tecnológica referidas pelos responsáveis americanos, vieram causar algum desconforto aos investidores.

A OCDE já veio dizer que a guerra comercial, caso se prolongue e intensifique, pode causar danos complicados. Reduziu novamente a previsão de crescimento do PIB mundial. No início de 2019, a OCDE previa um crescimento de 3,9% no PIB mundial para este ano; agora, prevê 3,1%.

A atitude “incendiária” de Trunp já teve como consequência vários tiros nos próprios pés. Este homem de negócios (bom ou mau, não está aqui em causa!), não conseguiu até agora que o défice comercial dos EUA com a China se tivesse reduzido substancialmente. Ou seja, até agora, as decisões de aumento das tarifas alfandegárias pouco ou nada contribuíram para um menor desequilíbrio do valor das trocas comerciais entre os dois países. Pelo que se pode perguntar, porquê estar a criar instabilidade económica a nível mundial com resultados perto de zero?

Na minha opinião, o maior receio dos EUA não é o défice comercial, mas sim a perda da hegemonia tecnológica. Os avanços que os operadores chineses e de outras partes do mundo registaram nos últimos anos colocam em risco, segundo Trump, a segurança dos EUA.

Todos nós sabemos que o mundo tecnológico tem sido dominado por empresas americanas (Google, Amazon, Apple, Facebook…) e que a tecnologia é a chave do sucesso no futuro.

Os EUA começam a ver ser beliscado o seu amplo domínio e este é para Trump o seu principal combate: não deixar que tal aconteça. Perder o poder de controlar os outros em termos tecnológicos é que é o grande problema para Trump e para quem o apoia. Trump esquece-se é que hoje, a relação de forças a nível económico é diferente do que era no início deste século.

No meio disto tudo, a Europa “continua a vê-las passar”… A imagem que eu tenho da Europa é esta: uma “pessoa” gorda que passa a vida no sofá a ver séries e a comer, que está habituada a ter tudo e a trazerem-lhe tudo de bandeja. Ou seja, um corpo rígido, com muitas gorduras e colesterol, com pouca flexibilidade e cujos responsáveis políticos passam demasiado tempo a discutir os problemas internos de cada país, em vez de definir e batalhar por uma estratégia de liderança económica para a Europa. Vamos ver qual vai ser o desencanto dos europeus, isto é, qual vai ser a abstenção no dia 26/5.

Os efeitos que esta instabilidade pode trazer nos dados macroeconómicos a nível mundial (investimento, produção e consumo) e, consequentemente, nos negócios e nos lucros das empresas não podem ser minimizados ou desprezados.

Eu sou um otimista por natureza. Contudo, se continuarmos a assistir a este tipo de episódios oriundos principalmente dos EUA, se calhar a velha máxima do sell im May and go away, poderá mesmo voltar a acontecer em 2019. Oxalá me engane!