Radiografia dos selecionadores de fundos em tempos de coronavírus

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JDRAMIRE, Flickr, Creative Commons

Os selecionadores profissionais de fundos anteciparam a crescente volatilidade do mercado que se registou em 2020 e, para isso, adaptaram uma abordagem mais defensiva no posicionamento das suas carteiras, segundo um inquérito da Natixis Investment Managers. A sondagem, realizada a mais de 400 selecionadores de fundos, responsáveis por selecionar produtos - incluindo banca privada, seguros, fundos de fundos e outras plataformas de retalho -, revela que 79% esperavam uma maior volatilidade nas ações e 72% antecipavam uma maior volatilidade nos mercados de obrigações.

Ainda que ninguém poderia prever os níveis históricos de volatilidade pelos que passaram os mercados de todo o mundo desde fevereiro de 2020, os selecionadores de fundos já tinham referido que pensavam adotar uma abordagem defensiva face ao risco na seleção de fundos em 2020. Quase metade (44%) esperavam diversificar relativamente à posse de ações norte-americanas, enquanto 73% disseram que estavam dispostos a ter um desempenho inferior ao dos seus concorrentes a troco de uma maior proteção contra quedas.

Também consideravam improvável que o rally dos mercados continuasse em 2020, dada a preocupação com as valorizações estratosféricas das ações, as dúvidas sobre a viabilidade de um contexto de taxas baixas, assim como os efeitos a longo prazo da incerteza geopolítica.

Como resultado, o inquérito demonstra que os selecionadores de fundos mostram a sua preferência por gestores de fundos ativos que os ajudem a navegar num contexto de maior dispersão sectorial nos mercados, com 75% dispostos a pagar maiores comissões a troco de um potencial rentabilidade superior. Referiram os investimentos passivos como uma fonte de risco sistémico e volatilidade, já que os ativos que têm um melhor rendimento recebem um maior peso na alocação de investimentos. Os selecionadores de fundos ressaltaram a sua preocupação com as potenciais grandes perdas no caso de uma grave crise.

Para Matthew Shafer, responsável de Distribuição Internacional na Natixis Investment Managers, “os selecionadores entraram em 2020 já a antecipar uma maior volatilidade de mercado e um maior risco, mas o fator de incerteza era que evento poderia ser catalisador das quedas e quando podia acontecer exatamente. Os investidores estão a enfrentar condições de mercado sem precedentes devido à pandemia do coronavírus, mas o seu objetivo fundamental permanece centrado em proteger os seus clientes, mediante a criação de carteiras suficientemente sólidas para resistir à volatilidade extrema do mercado e ao mesmo tempo bem posicionadas para a recuperação. Estamos a começar a ver os selecionadores profissionais a retornar ao risco com um foco permanente em estratégias ESG, ações bem avaliadas e obrigações alternativas”.

Posicionando-se para o risco e o retorno

Apesar da elevada volatilidade e das distorções de curto prazo, os objetivos dos selecionadores de fundos para gerar um retorno consistente a largo prazo permanecem razoavelmente estáveis, tendo já em conta as oscilações dos ciclos de mercado. Este ano não é exceção e a vasta maioria dos selecionadores (85%) classificaram os objetivos de retorno das suas respetivas organizações como realistas e alcançáveis. Não obstante, já antes do estalar da crise, muitos tinham antecipado uma certa reversão dos retornos após um forte 2019, com mais de 38% dos inquiridos a esperarem um retorno inferior em vez de superior.

O inquérito também revelou que as preferências sectoriais dos selecionadores refletiam as suas já débeis expectativas de crescimento económico. Poucos esperam um desempenho superior à média nos sectores de materiais, pro-cíclicos e industriais. Pelo contrário, mostravam mais entusiasmo quanto a sectores com fortes motores de crescimento seculares, esperando um desempenho superior à média em tecnologias da informação (44%), saúde (42%) e finanças (32%).

ESG em ascensão

Nos mercados turbulentos, o ESG está a ser cada vez reconhecido como um importante fator de risco que os gestores de fundos ativos podem ter em conta. Quando os inquiridos foram questionados acerca da razão fundamental para incorporar fatores ESG no seu processo de decisões de investimento, 22% considerava que reduz o risco; 21% expressou que gera retornos mais ajustados ao risco e 19% respondeu que melhora a diversificação. O inquérito revelou que 62% dos selecionadores de fundos estão a registar uma maior procura por parte dos clientes por estratégias que se alinhem com os seus valores pessoais.

Os ativos privados como uma fonte de diversificação

Enquanto alguns dos selecionadores expressam uma certa preocupação pelo uso de investimentos alternativos, a convicção generalizada é que os ganhos superam os riscos, particularmente no caso dos ativos privados (private assets). Cerca de metade (49%) considera que estes vão desempenhar um papel proeminente nas estratégias das suas carteiras.

O inquérito também revela que oito em cada 10 selecionadores de fundos (82%) percebem que o atual contexto de baixa rentabilidade das obrigações vai impulsionar uma mudança para investimentos alternativos. A procura por rentabilidade explica o interesse em ativos alternativos relacionados com rendimentos, como são as infraestruturas, o imobiliário e a dívida privada. Claramente, depois da volatilidade experimentada nas últimas semanas, os selecionadores apreciam mais as estratégias que ajudam a obter retornos descorrelacionados e oferecem um maior potencial para a gestão do risco.

Segundo Sophie del Campo, diretora-geral da Natixis IM para a Península Ibérica, América Latina e Estados Unidos Offshore, “com a tela de fundo da forte volatilidade no mercado, os selecionadores profissionais de fundos estão a enfrentar grandes desafios no momento de gerar retornos. Aos riscos já existentes no mercado, como o de carácter geopolítico causado pelo ano eleitoral nos Estados Unidos, ou às considerações do meio ambiente e ESG, soma-se agora  o forte impacto da pandemia do Covid-19. Num contexto de volatilidade como este e no qual há uma grande procura por informação por parte dos investidores, na Natixis IM consideramos que a análise de carteiras é mais relevante do que nunca, já que cada carteira tem uma composição própria e um mesmo ativo tem um encaixe diferente dentro de cada carteira. Os selecionadores são obrigados a seguir de muito perto a evolução da crise epidémica, mas as conclusões deste inquérito sugerem que estão bem preparados para o contexto atual do mercado”.