“Queremos que as populações sintam que ganham directamente com o investimento do fundo”

Em entrevista à Funds People Portugal, o director-geral da sociedade gestora Floresta Atlântica destaca ainda a grande biodiversidade e os diferentes ecossistemas que um país tem, o que permite ter um fundo muito diversificado, mas que por vezes torna difícil explicá-lo aos investidores. As boas condições biofísicas, de mercado comprador, de exportador e de logística, salienta, são trunfos para a captação de investimento.

O fundo tem tido o desempenho esperado? Quantos hectares tem em carteira?

O fundo tem cerca de 5.100 hectares comprados (45%) e arrendados (55%), predominantemente centro e norte do país; acabamos por ter um predomínio do pinheiro bravo porque é a espécie que predomina nestas geografias, no interior de Portugal. Temos só um núcleo no sul, na Serra de Marvão (concelhos de Portalegre e Marvão). A rendibilidade anualizada desde início é de cerca de 5%, isto numa altura de elevado investimento e de poucas receitas; este ano já começámos a vender alguns produtos como madeira, cortiça, cogumelos, caça, pastagem. Tivemos o trabalho de, em dois, três anos, colocar “em cima da mesa” cerca de 5.000 hectares, em mais de 400 propriedades, com área média de cerca de 7 hectares. Por exemplo temos negócios de 1.000m2, o que não é fácil, e estamos na fase de gerir, recuperar e investir no património que adquirimos, só agora é que começa a haver ‘cash in’ e, no futuro, a poder haver algumas transacções imobiliárias. 

Têm sobretudo área florestal...

Sim. Temos também alguma área agrícola porque está dentro das propriedades florestais que adquirimos. Penso que andará entre os 200 a 300 hectares no total dos 5.100, mas em que não praticamos agricultura pura; temos espécies florestais, pomares de frutos de casca rija, amendoal e nogueiral, e também madeiras de qualidade regadas, como madeiras de alto valor, tipicamente nogueira negra. Com o Primeiro Fundo Floresta Atlântica exploramos, gerimos e optimizamos a gestão de toda a gama de produtos silvestres não lenhosos, os cogumelos, o mel, as ervas aromáticas, os frutos vermelhos, a caça, a pastagem e conseguimos ao longo do ano manter em termos de horas/homem/mulher entre 150 a 200 postos de trabalho. E a venda desses produtos dá-nos uma melhoria da rendibilidade materialmente relevante, que pode chegar a um ponto percentual, e é um ‘cash in’ anual, enquanto o ‘cash in’ da parte lenhosa tem ciclos de caixa tipicamente muito longos.

Acabam então por ter também um impacto relevante nas economias locais...

Isso sente-se, sim, temos esse ‘feedback’, criamos uma dinâmica empresarial. Frequentemente o que acontece é que ajudamos a criar novas empresas, porque no interior não há por vezes massa crítica de empresas prestadoras de serviços. E nós próprios, ao garantirmos determinado volume de trabalho durante algum tempo, damos confiança para alguns pequenos, micro, empresários,  acabarem por se estruturar sob a forma de empresa. Acabamos por induzir uma organização de mercado e o desenvolvimento de uma série de empresas locais. Está no nosso DNA contratar primordialmente e dar direito de preferência a prestadores de serviços locais. Queremos com isto também que as próprias populações sintam que ganham directamente com o investimento do fundo e que ajudem também a proteger, é uma técnica de mitigação de risco.

Em termos de gestão de risco, como são escolhidas em áreas em que investem?

Considerando as áreas onde podemos trabalhar, que são áreas de montanha, tipicamente minifúndio, para gerir o risco o que fizemos foi dispersar os núcleos de investimento. Temos 15 núcleos diferentes espalhados por muitos concelhos do país e a ideia foi ter núcleos de investimento cujo valor e área não fossem superiores a 5% do valor global da carteira de áreas do fundo. Para, no caso de uma ocorrência, de um sinistro catastrófico, não colocar em causa o próprio fundo.

São áreas com grandes riscos de incêndios...

Sim. Nesta actividade temos dois tipos de riscos, os sistemáticos e ou não sistemáticos. Os não sistemáticos são o de incêndios, de pragas e doenças, e depois os sistemáticos são os riscos de mercado; neste caso devemos ser o fundo que conheço, a nível internacional, que tem uma menor exposição aos riscos de mercado porque temos muita segmentação de produto, muitas espécies, muitos produtos diferentes, mesmo num país tão pequeno conseguimos ter uma diversificação enorme o que proporciona uma mitigação desses riscos bastante assinalável.

Mas há uma predominância para o pinheiro bravo...

Sim, mas temos muitas outras espécies, como nogueira, castanheiro, chopo, salgueiros, várias espécies de carvalhos... 50% da biodiversidade europeia está dos Pirenéus para sul e Portugal é uma pérola em termos de biodiversidade. Às vezes temos uma grande dificuldade em explicar aos investidores internacionais a questão portuguesa e ibérica, que conseguimos no nosso território fazer efectivamente uma diversificação dentro do próprio fundo. Porque temos diferentes ecossistemas, com diferentes características climáticas, biofísicas. Temos um território pequeno diversificado de uma forma que outros em países maiores não conseguem ter. E acabamos por ter vantagens – elevado nível de diversificação e possibilidade de criação de sistema de créditos de biodiversidade - , e algumas dificuldades em estruturar produtos que sejam fáceis de “entender” pelos investidores internacionais e em que se consiga alinhar com os mesmos a estratégia de investimento do fundo. 

“Temos alguns trunfos para jogar na captação de investimento estrangeiro”

Em vez de ‘roadshows’ têm que trazer os investidores a Portugal para lhes mostrar o território...

Também. Tentamos fazer esse tipo de vista. Portugal está em todos os indicadores de risco sempre como tendo das maiores percepções de risco. Não quer dizer que o risco seja real, que o é em algumas situações, mas a percepção desse risco é muito grande, daí termos metodologias de gestão de risco que são ‘the state of the art’. Sabemos que a percepção de Portugal, da Península Ibérica em termos gerais, para os investidores é de risco muito elevado. O ‘trade off’ disto neste momento e também estarmos a ser intervencionados pela Troika, é que há outro lado, os nossos activos podem apresentar uma perspectiva para o investidor de ‘distressed assets’, sendo apercebidos como activos com valor de desconto perante a média do valor de mercado pré-crise. Diria que os próximos dois serão, historicamente, a melhor altura para captar investimento nacional e internacional para a floresta e agricultura.

Em que sentido?

Porque há sempre uma grande diferença de expectativa de valor entre aquilo a que o proprietário está disponível a arrendar ou a vender a sua terra e os valores expectáveis de rendimento.  Neste momento de crise ele está a aproximar-se um pouco mais, quer dizer que já começamos a ter preços razoáveis, não temos preços ainda muito baixos comparado com outros países, nomeadamente com os nossos concorrentes na captação de investimento, que são os países de Leste, como Bulgária, Roménia, Ucrânia, Polónia, que têm grandes maturidades florestais, extensas áreas, que estão agora a ser reprivatizadas. Temos uma localização privilegiada do ponto de vista logístico, quase podemos ser um ‘hub’ em termos de distribuição e, quer queiramos quer não, os produtos lenhosos, tendem a ser uma ‘commodity’ e portanto são exportáveis, têm preços mundiais, etc. Temos uma estrutura industrial de primeira água em termos de consumidores de matérias-primas, temos acessibilidades do melhor da Europa, ou seja, temos condições biofísicas, de mercado comprador, de exportador e de logística, que são muito boas. Portanto temos alguns trunfos para jogar na captação de investimento estrangeiro.

Dos 20 milhões do fundo quanto foi já investido?

Do valor de entrada do fundo já foram investidos cerca de 16,5 milhões. Agora, a taxa de execução - o rácio entre de património sobre activo total -, já excede os 80%, porque o património vai subindo de valor. Fazemos por registar os prédios rústicos pela média das avaliações independentes a cada momento. A CMVM desde há mais de um ano vem dizendo que vai alterar a regulamentação – neste momento pode registar-se o valor de cada activo entre o custo de aquisição e a média das avaliações independentes, há alguma discricionariedade e nós, a partir de certa altura, eliminámos essa discricionariedade e colocamos a média das avaliações. Depois vamos tendo receitas, é dinâmico. A intenção é ter sempre a tesouraria necessária para cobrir os gastos operacionais de gestão dos activos.

E têm estado a olhar para mais alguma oportunidade de aquisição para este fundo?

O fundo neste momento está fechado. Estamos em negociação com algumas áreas de predomínio de pinho, porque neste primeiro fundo é algo que é ‘core’. Estimo que consigamos fechar completamente os investimentos em 2013 na casa dos 6.000 hectares, com algumas áreas de arrendamento que estamos a negociar e, portanto, para este fundo não estamos à procura de mais nada em especial.