Quatro lições importantes sobre o risco político que os investidores não devem esquecer

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Duncan, Flickr, Creative Commons

"Não estaremos demasiado preocupados com o risco político?". Essa pergunta foi o mote de uma série de reflexões de Paras Anand, diretor de investimentos em ações europeias da Fidelity, a propósito da conferência de imprensa acolhida recentemente pela gestora no seu escritório em Londres. 

Anand argumenta que as mudanças políticas exercem "muita influência psicológica" sobre os mercados, mas na realidade os seus efeitos apenas são perceptíveis a longo prazo. Para reforçar o seu argumento, centra-se no que aconteceu em 2016, um ano político por excelência. "Apesar dos eventos políticos de 2016, os mercados comportaram-se muito bem. Os eventos causaram impactos significativos, mas não nas ações: o Brexit provocou o colapso da libra, enquanto a eleição de Trump deu aso a uma correção dos treasuries", detalha o especialista. 

Na sua opinião, estas reações responderam ao facto de "os eventos políticos mudarem as expectativas a médio longo prazo para a economia global", mas também indicam que, meses depois de se produzirem, "os EUA continuam a mostrar força económica, enquanto no Reino Unido se nota o impacto negativo do Brexit sobre a economia subjacente". 

Portanto, a partir dessas observações, Anand extrai quatro lições importantes que crê que os investidores deveriam ter em mente. A primeira é que é mais importante o impacto psicológico do que a realidade dos factos: "para os parcipantes de mercado, o mais importante é posicionar-se em antecipação a um evento, não em relação ao que se passa depois". A segunda lição é mais uma recordação: "o sistema financeiro finalmente recapitalizou-se e o risco de contágio minimizou-se", pelo que Anand asevera que "os aspetos top down têm menos importância sobre a direção do mercado". 

Em terceiro lugar, o diretor de investimentos reitera que "o impacto político sobre a economia real é marginal, e contudo mais pequeno sobre as empresas". Na sua opinião, "as políticas necessitam alcançar um ritmo de evolução", isto é, precisam de se desenvolver ao longo do tempo antes que se note um impacto. Por outro lado, declara que "é mais importante para as empresas preocupar-se com a evolução da tecnologia e o seu impacto disruptivo". 

Finalmente, Anand expõe em quarto lugar uma teoria que desenvolveu a partir da análise dos mercados: que existia uma espécie de curva de Laffer na política monetária. Recordemos que a curva de Laffer expõe que o aumento dos impostos nem sempre vem acompanhado de um aumento no valor arrecadado. Seguindo com esta lógica, o que diz o profissional da Fidelity é que "a estratégia dos bancos centrais pode chegar a ter o efeito oposto ao que se pretendia, ao deixar de estimular a economia para na realidade contribuir para uma quebra da confiança". Anand refere-se neste caso ao comportamento visto nos mercados depois da introdução das taxas negativas na Europa e Japão. Na sua opinião, o que na verdade é necessário é "reintroduzir um efeito multiplicador na economia, para que quando comece a melhorar o crescimento se recupere a concessão de crédito". Para o especialista, esse efeito multiplicador poderia conseguir-se "se se aumentar o enfoque sobre a política fiscal em vez de ser sobre a monetária nos próximos anos". 

Fim da tendência de bull market?

O diretor de investimentos de ações europeias da Fidelity define o cenário com que está a trabalhar como de "supreendente normalidade", no sentido em que os mercados vão voltar a concentrar-se nos fundamentais depois de anos em que têm estado impulsionados pela expansão de múltiplos. "As ações europeias não estão baratas, mas cotam a níveis razoáveis. A rentabilidade por dividendo é superior, as empresas cotam baratas em comparação com outras regiões, os balanços são fortes e o crescimento é sustentável", argumenta Anand. A isto acrescenta que os investidores também começaram a prestar mais atenção ao crescimento dos salários e ao seu efeito potencial sobre as margens de lucro nas empresas. 

Neste cenário, observa-se que a competição a nível corporativo se intensificou como consequência do desenolvimento de novos modelos de negócio baseados em novas tecnologias: "o ciclo médio de vida de uma empresa reduziu-se a 14 anos. Isto é devido ao facto de a tecnologia disruptiva estar a criar competição de preços e inclusivamente a acabar com a mediação em casos extremos". 

Como resultado desta mudança de tendência, o diretor de investimentos crê que a sólida tendência de bull market até recentemente está a mudar num mercado de intervalos, no qual "as medidas do mercado importam menos".

Anand diz que "este cenário não deveria reduzir o entusiasmo pelas ações, mas os investidores deveriam centrar-se mais num stock picking concreto antes de pensar no resultado agregado dos índices".