Porque é que o consenso fracassou sistematicamente ao calcular o preço do petróleo?

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anekphoto, Flickr, Creative Commons

Agora que o petróleo tocou a barreira psicológica dos 80 dólares por barril, há que olhar para trás e comparar o que, nos últimos dois anos, o consenso de mercado tinha previsto de forma continúa que o Brent (referência na Europa) se iria manter por volta dos 50 dólares por barril. Trata-se de um cálculo mais modesto do que o efetuado pelos analistas da Brandywine Global, filial da Legg Mason Global AM, que tinham estimado um intervalo entre os 60 e 80 dólares por barril. Que explicação está por trás desta lacuna de avaliação?

Em primeiro lugar, os especialistas lembram que os participantes no mercado do crude – traders, produtores, economistas – “tendem a gravitar à volta do preço atual em qualquer altura, tomando-o como o preço correto”. Ironicamente, como muitos poderão recordar, nos últimos dez anos o preço do crude chegou a alcançar cotações tão altas como os 100 dólares por barril, e tão baixas como os 30 dólares.

Da Brandywine afirmam que as razões que explicam a dificuldade para realizar uma previsão correta sobre o preço do petróleo são primordialmente do tipo comportamental. Citam especificamente a bias para o imediato (o mercado tem como referência o preço mais recente do Brent), a  bias de ancoragem (muito semelhante ao anterior) e a bias de extrapolação (utilizar o preço do crude como referência para calcular outras cotações). Também a bias de prognóstico de mercado, que descrevem como “a crença de que também os preços não foram previstos corretamente no passado, mas que no futuro será diferente”. Neste último caso, dão como exemplo padrão, a falha dos cálculos para determinar o ritmo de produção de petróleo de xisto nos EUA e os motivos dos produtores.

Estudo de caso

“Os dados podem ajudar a ultrapassar alguns destes erros, mas tem de estar claro o que os dados estão a refletir”, acrescentam os analistas. Dão como exemplo seguinte, como uma ou outra interpretação dos dados podem levar a conclusões diferentes: partindo da premissa – a partir da análise de resultados financeiros corporativos – de que as petrolíferas deixam de ser rentáveis com o petróleo a 30 dólares, e que um barril a 30 dólares representa um aumento brutal dos déficit da balança corrente das petrolíferas estatais, a conclusão a que os especialistas chegaram foi que os 30 euros não eram sustentáveis para ninguém em longos períodos de tempo.

Também observaram que o nível dos 50 dólares foi visto pelos investidores e empresas, como um ponto mais próximo do breakeven, embora indiquem que esta premissa representa aceitar duas afirmações: que as empresas privadas não teriam necessidade ou quereriam obter um retorno aceitável sobre o capital, e que o barril a 50 dólares seria um nível mais confortável para as petrolíferas estatais (ver tabela).

Kasia Kadis Fidelity

 “Estas duas suposições precisam de estar juntas, a não ser que acredite que a produção de xisto na América do Norte possa subir de forma significativa e indefinida”, afirmam da Brandywine Global. O que conseguiram constatar em retrospetiva, é que a primeira das afirmações ainda é operacional: “A produção norte-americana de xisto está a aumentar outra vez, embora não ao mesmo tempo da procura global, e as novas notícias recentes estão a começar a identificar o efeito “bottleneck” e desafios em áreas como a Bacia Permiana (o maior campo de petróleo dos EUA, situado no Texas e no Novo México)”.

Kasia Kadis Fidelity

Em contrapartida, os analistas acreditam que a publicação dos dados dos últimos três anos questiona a segunda suposição: “O investimento está em queda, tal como as receitas provenientes do serviço e dos fornecedores de equipamento refletem, e o número de novas descobertas caiu dramaticamente. A maior parte do gasto focou-se em áreas de produção existentes”. A cadeia de todos destes acontecimentos, causou a queda de produção na maior parte dos poços produtores, embora da Brandywine acreditem que “isto não pode ser sustentável indefinidamente”.

Também em relação à segunda premissa, os analistas afirmam que “a ideia de que as petrolíferas estatais começariam a investir dinheiro outra vez com o barril acima dos 50 dólares, parece agora ter falhas.” Citam, por exemplo, que agora o preço-objetivo do crude segundo a OPEP, situa-se nos 70 dólares por barril. “Os membros da OPEP diminuíram a produção numa percentagem de um dígito coletivamente, e viram que as receitas subiram mais de 50%. Porque terminariam esta política?”, refletem.

Voltando à ideia inicial sobre o preço-objetivo de 50 dólares, os analistas concluem que este preço “não estimulou globalmente a atividade como se previa, e agora temos uma escassez de oferta em relação à procura”. Como consequência, os inventários reduziram rapidamente, de forma a que, depois dos máximos históricos vistos durante o último grande bear market do crude, voltem agora a estar próximos da sua média de cinco anos… com a nuance de que “a média a cinco anos não tem em conta o facto da procura estar a crescer, e por isso, o número de dias de inventário encontra-se agora abaixo da média de cincos anos. Isto ajuda a explicar a subida do preço de crude”, afirmam.

Alexandre Lefebvre

O que esperar no futuro?

Da Brandywine concluem com uma última nota: consideram que a escassez atual de oferta se pode reverter com facilidade. “O xisto continuará a crescer este ano, mas os fornecedores de maior dimensão acreditam que a forte falta de investimento fora dos EUA começará a refletir-se nas quedas da produção normal”.

Consequentemente, observam o crescimento da preocupação em relação à possibilidade de que o preço do barril volte à gama dos 80-100 dólares, enquanto constatam a descida de popularidade do prognóstico de 40-60 dólares no curto e médio prazo. “Não se pode descartar a gama dos 120-150 dólares num cenário de aumento da volatilidade, que poderá ser causado pela regulamentação sobre o combustível naval, que taxará os custos do transporte, ou por eventos geopolíticos no Médio Oriente.