Porque estão a cair os mercados? Fevereiro de 2016

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thetaxhaven, Flickr, Creative Commons

As bolsas estão em plena fase de correção. A queda significativa dos preços do petróleo e a crise dos emergentes, com a China a encabeçar a lista, têm sido as causas que explicam as perdas de mais de 10% que acumulam os mercados desenvolvidos desde início do ano. No entanto, o cerne da questão está ao nível corporativo. “Os lucros das empresas estão a crescer a ritmos anémicos em todo o mundo e os rácios descontam um crescimento muito maior. Muitos ativos estão sobrevalorizados e os mercados movimentam-se no sentido de valorizações mais razoáveis. Não convém esquecer que a economia real e os lucros das empresas estão na base da economia financeira e da especulação. O preço justo dos ativos e o senso comum acabam sempre por imperar” como diz David Levy, presidente da Diverinvest EAFI.

Estaremos perante uma correção ou um ajustamento? Ou perante uma mudança nas tendências na economia mundial? São muitas as perguntas e, por agora, poucas as respostas. No entanto, existem algumas certezas. Uma delas é o efeito negativo que a queda dos preços do petróleo pode ter na economia. Ninguém duvida que a médio prazo o preço baixo do barril de crude é positivo para a economia. Por outro lado, a curto prazo, poderá ter efeitos muito negativos sobre determinados sectores. O break-even da curva de custos do petróleo a nível mundial mostra que os preços atuais de 30 Dólares por barril só são lucrativos no Médio Oriente. As restantes regiões enfrentam assim uma situação complicada com um impacto direto em muitas empresas do sector energético, cuja sobrevivência está em jogo. O mercado estima que este ano, cerca de 50% das empresas norte-americanas do sector entrarão em default, antes do outono. Isto significa que 160 empresas não conseguirão fazer face ao seu serviço de dívida.

Adicionalmente, o petróleo pode ter um o impacto relevante (e de efeitos ainda imprevisíveis), não só nas empresas de outros sectores vinculadas ao sector energético, mas também sobre as entidades financeiras, muitas das quais têm financiado os projetos petrolíferos, especialmente nos EUA. Não será descabido, portanto, que os sectores da energia e finanças estejam a ser os mais penalizados. “Com o petróleo a 40 Dólares, calculava-se que muitas empresas do sector energético poderiam sobreviver mas, com o barril abaixo de 30 Dólares, quais poderiam ser as consequências?”, interroga-se Jeremy Leung, gestor da UBS AM. Numa perspectiva macroeconómica, o colapso do petróleo pode ter um claro impacto sobre os países produtores (Canadá, Angola, Rússia, Brasil,...) e sobre as suas economias, cujo crescimento é mais do que provável que se comece a ressentir. De facto, muitas destas economias encontram-se já em recessão, com o consequente impacto a nível do crescimento global.

Este abrandamento económico afecta também a China, em pleno processo de rebalanceamento dos seus motores de crescimento, num contexto de instabilidade dos mercados financeiros e numa fase de depreciação da sua divisa. Destes três factores, talvez o mais importante seja o último. “Uuma rápida depreciação do Yuan prejudicará muitas empresas chinesas por causa da dívida em Dólares em balanço. A gradualidade da depreciação do Renmimbi é desejável porque a taxa de câmbio Yuan/Dólar atua como uma espécie de foco de atenção das expectativas de depreciação das divisas dos mercados emergentes no geral. Neste sentido, uma rápida depreciação do Yuan pode desencadear a depreciação cambial de outras moedas de países emergentes”, explica a NN Investment Partners.

No entanto, o factor mais preocupante passa pelo potencial impacto do abrandamento do crescimento chinês nas economias desenvolvidas. Robert Wescott, membro do Conselho de Assessoramento Macroeconómico da Pioneer Investments, crê que a China não deve representar um risco muito elevado. “No atual cenário, poderá, quanto muito, retirar meio ponto de crescimento ao PIB norte-americano”, assegura. Na sua opinião, os efeitos negativos seriam mais evidentes no comportamento dos mercados financeiros, se bem que o impacto na Europa seria maior devido à quebra nas exportações. Isto explicaria porque os mercados de ações europeus têm mostrado uma maior sensibilidade ao tema China.

No entanto, é importante recordar que não são só as ações que sofrem as consequências. Outros ativos de risco, como as obrigações high yield – segundo Talib Sheikh, gestor do JPM Global Income – cujos spreads atuais descontam uma probabilidade de default própria de um contexto de recessão nos EUA. Isto também se verifica em algumas emissões BBB, revela Richard Woolnough, gestor do M&G Optimal Income.  Pelo que parecem concordar os especialistas, estando o mercado a descontar uma recessão, caso este cenário não aconteça, o mais provável será uma recuperação dos mercados. É o que muitos esperam. “Os mercados descontam uma probabilidade muito alta de uma recessão global. Mas o pessimismo parece exagerado e os investidores deverão ter reagido excessivamente aos dados económicos dos EUA e China. Adicionalmente, mais de metade dos indicadores preditivos fiáveis não estão no vermelho. Pela liquidez, valorizações e posições dos investidores, uma recuperação é mais provável que uma contínua liquidação de ativos. Cada vez que a economia americana evita uma recessão, as ações sobem em média 30% em 12 meses”, destaca o departamento de estratégia da Pictet AM.