Poderá a reforma fiscal dos EUA impactar o investimento das empresas?

EUA
Bert Kaufmann, Flickr, Creative Commons

Paradoxo. É assim que Anton Brender, chief economist da Candriam, apelida atualmente a situação económica dos EUA. Vejamos: na opinião do especialista está instalado uma espécie de ‘cenário perfeito’ em relação à economia do país, que nos faz estar positivos em relação à evolução da mesma. “A economia está a crescer acima de 2%, e esse crescimento tem vindo a ser largamente suportado pelo consumo doméstico, mas não só. Outras fontes primárias de crescimento – como a procura interna ou global – têm suportado este número”, justificou o profissional na conferência realizada em Lisboa no início de dezembro, na qual a entidade traçou um vasto outlook económico e financeiro para o ano que se avizinha.

Neste otimismo que pode parecer desmedido à primeira vista, há para o profissional dois factores de ainda maior (aparente) conforto. “O key driver para este crescimento é a criação de empregos e o crescimento de salários. Atualmente a criação de postos de trabalho, por exemplo, está a melhorar de mês para mês, ao contrário do que muitos de nós esperávamos há uns tempos atrás”, inferiu.

Perante este cenário aparentemente perfeito, afinal porque é que os investidores devem estar preocupados – ou pelo menos cautelosos - com os EUA?

Deixando portanto de parte os já referidos dados económicos, para Anton Brender as dúvidas e incertezas prendem-se com as políticas levadas a cabo pelo executivo de Trump. A tão aguardada reforma fiscal encabeçada por Trump foi talvez o assunto mais abordado pelo profissional da Candriam, e em específico o corte da taxa de imposto para as empresas. Na altura desta conferência, Anton Brender estimava que a taxa de imposto para as empresas deveria passar dos 35% para os 21%, e foi esse corte de 14 pontos percentuais que acabou por acontecer no passado dia 19 de dezembro. Mas a este nível o especialista realça ainda outro  pormenor importante: “tanto o senado como o congresso incluíram na sua proposta a possibilidade de abater aos lucros durante cinco anos a totalidade do investimento em equipamento efetuado pelas empresas”.

Como é que este corte na taxa de imposto das empresas afetará os investimento corporativo?

O profissional entende que este corte é de facto significativo, mas o impacto no investimento parece ser pequeno, ou pelo menos, de certa forma, incerto. O profissional argumenta que não será pelo facto de as empresas libertarem lucros que seriam pagos em impostos que o investimento se verá impulsionado.  

Numa análise das duas últimas décadas (visível no gráfico abaixo) é possível inferir que “desde meados dos anos 90, a percentagem dos lucros  depois de impostos no valor agregado das empresas tem-se mostrado numa tendência clara de subida”. Na finalidade aplicada a estes lucros, prosseguiu o especialista, é importante olhar para “todos os recursos em que as empresas podem investir”.

Analisando os empréstimos efetuados menos o investimento financeiro, verifica-se, como é visível abaixo, “que estes adicionam algum valor aos lucros impostos, ou seja, representam sempre uma percentagem de valor adicional”.  

A resenha histórica prosseguiu: “O investimento líquido não tem sido afetado pelo aumento dos lucros” (como se verifica no gráfico abaixo). O dinheiro que “sobra”, como lembrou o profissional, tem obviamente de ser aplicado em algo, e a este nível o que os dados mostram é que “tem sido usado para aumentar os dividendos e adicionar mais recompras de ações”. A pergunta que o Anton Brender deixou em aberto é portanto óbvia: “Porque é que este cenário mudaria com os lucros a aumentarem agora?”.

EUA companhias

Outro movimento que quem investe deve ter em conta, e para o qual o economista chefe chamou a atenção, foi a recente atuação do Senado sobre o corte dos impostos para as empresas. “Eles têm vindo a argumentar que o corte de impostos só deveria ser executado apenas em 2019. Essa situação fez com que algumas empresas executassem os seus investimentos mais cedo para beneficiarem da diminuição do impacto da subida de taxas de juro”, referiu.