Na tentativa de perceber a guerra entre a gestão ativa e passiva…

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FMG2008, Flickr, Creative Commons

2016 vai ficar na história como um ano positivo para a indústria de fundos europeia. Os ativos sob gestão atingiram um novo máximo histórico ao alcançar os 9,4 bilhões de euros, enquanto as entradas líquidas foram de 268.700 milhões, segundo dados da Lipper Thomson Reuters. Ainda que este valor esteja abaixo dos 368.000 milhões de 2015 e dos 351.000 de 2014, continua a ser um volume muito acima da média de longo prazo (162.200 milhões). O problema é que se se analisar cuidadosamente estes dados, eles revelam uma realidade pouco agradável para os defensores dos fundos de gestão ativa. É que desses 268.700 milhões de captações líquidas recebidas pelo setor em 2016, 111.000 milhões foram captados por produtos do mercado monetário, enquanto outros 41.000 foram para ETFs. Ou seja: mais de metade do que foi captado pela indústria europeia no ano passado foi gasto em estratégias de baixo custo.

Analisar com detalhe os números é importante, já que permite compreender as tendências e as alterações das mesmas. Se se separar os números por classes de ativos podem observar-se dinâmicas preocupantes para o setor. É este o caso, por exemplo, nas ações.

“Percorrendo os dados globais de fluxos de ações (-28.200 milhões), pode concluir-se que os investidores europeus se tornaram mais cautelosos na redução do risco das suas carteiras. Mas, enquanto os fundos de gestão ativa registaram em 2016 saídas líquidas de 43.700 milhões de euros, os fundos passivos obtiveram entradas líquidas de 15.500 milhões. Esta situação pode levar a crer que os investidores europeus decidiram contra os fundos de ações geridos ativamente e agora parecem favorecer os ETFs”, assegura Detlef Glow, responsável de Ánalise da Thomson Reuters Lipper para a Europa, Médio Oriente e África (EMEA).

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Estão os ETFs a "morder os calcanhares" aos fundos de gestão ativa? Para responder a esta pergunta é preciso ter em conta certas realidades. A primeira é que que parte do gap nos fluxos se explica pela criação de posições de asset allocation, em países ou sectores onde se considera mais eficiente fazer uma alocação passiva. Isto significa que os fundos de gestão ativa deveriam tirar partido das ineficiências dos mercados e ganhar um prémio em comparação com as estratégias passivas, e o contrário se um setor ou mercado concreto for considerado eficiente. Não obstante, em determinadas categorias torna-se muito difícil compreender a evolução dos fluxos. Exemplo disso é representado pelas categorias da bolsa americana e bolsa britânica, onde os fluxos nos fundos ativos foram negativos. Nos produtos passivos, por sua vez, os fluxos foram positivos nestas categorias.

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“Uma suposição simples pode ser a de que os investidores venderam os fundos ativos para os substituir parcialmente por ETFs, mas dados os números das eleições nos Estados Unidos e no Reino Unido no ano passado, esta explicação não mostra o cenário completo. Na realidade, creio que os investidores reduziram a sua exposição estratégica a ambos os mercados através de produtos ativos antes do Brexit e da eleição de Donald Trump para posteriormente voltar ao mercado taticamente. Isto significa que os investidores europeus não preferem necessariamente os ETFs por defeito, mas sim que tomaram uma decisão tática de asset allocation e utilizaram estes produtos para uma estratégia a curto-médio prazo, em vez de recorrerem aos fundos ativos, que geralmente seguem uma abordagem de longo prazo, o que poderia não gerar resultados positivos num horizonte de investimento a curto prazo”, explica Glow.

Se esta observação for errada, 2016 podia ser o ano em que se viu uma grande mudança na mentalidade dos investidores europeus, que teriam começado a substituir as suas posições em fundos de ações de gestão ativa por produtos de baixo custo. Ou então talvez o fenómeno da gestão passiva seja uma tendência puramente cíclica. É cedo para dizer. O que fica claro é que os ETFs são produtos amplamente aceites e usados por investidores europeus, e que se estão a converter numa ameaça para os fundos ativos. “Há que reconhecer o avanço da gestão passiva ao nível dos custos, e também porque a gestão ativa nem sempre tem proporcionado os resultados previstos. Mas, com os mercados de ações em valores máximos, entramos num momento de alfa e é previsível que a gestão ativa comece a oferecer melhores resultados”, defende Gonzalo Rengifo, diretor geral da Pictet AM para a Península Ibérica e América Latina.

A experiência diz-lhe que, estruturalmente, a medio prazo (três anos), a gestão ativa é mais recomendável, pois proporciona um valor acrescido. “Nesse período, em geral, as 20 melhores estratégias costumam manter-se, oferecendo rentabilidades acima do mercado”, afirma. Por outro lado, Rengifo reconhece que a gestão passiva pode ser mais útil a curto prazo, uma ideia que encaixa com a tese defendida por Glow sobre o sucedido no ano passado com os fluxos para as bolsas dos Estados Unidos e Reino Unido. No futuro, a chave pode estar nos efeitos da MiFID II e na estratégia que sigam os investidores para gerar alfa. “Determinadas instituições consideram que para carteiras globais, metade do alfa é proveniente da alocação de ativos, enquanto em carteiras específicas até 80% do alfa pode vir da seleção dos títulos”, sublinha o responsável da Pictet AM em entrevista à Funds People.