“Os estilos e os gestores podem mudar, mas há que ser disciplinado e fiel ao processo porque isso é o que gera retornos de longo prazo”

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“Para mim ser value é ser capaz de comprar títulos que valem mais do que pago por eles. Quando penso no investimento value, penso numa abordagem sistemática e estruturada. Como dizia Benjamin Graham, trata-se de colocar a estrutura num investimento, algo que hoje em dia é muito importante”. Esta declaração de princípios pertence a Tom Stubbe, gestor do Nordea 1- European Value Fund. É um veterano da indústria com um impressionante track record: foi capaz de gerar um retorno anualizado de 350 pontos base acima do mercado nos últimos 17 anos. Isto converte o fundo no de maior track record com o mesmo gestor a seu cargo na categoria de ações europeias.

Stubbe assinala que também é crucial ter dentro do seu processo de investimento “uma atitude crítica”: “Olhamos para a história da empresa, o que tem sido capaz de fazer, e perguntamo-nos porque deveríamos pensar que será diferente no futuro”. A partir daqui, o especialista da Nordea procura dois elementos fundamentais para tomar uma decisão de compra. A primeira é o poder de geração de receitas: “Necessitamos de nos sentir cómodos com o poder de geração de receitas, ter uma elevada convicção sobre qual o valor intrínseco da empresa e a sustentabilidade dos seus lucros ao longo do tempo”. O segundo elemento é a margem de segurança, ou seja, comprar com um desconto de 40% sobre a valorização da empresa porque é uma forma de obter proteção face às quedas: “Se a tese de investimento não sai como se esperava, acabo por não perder muito dinheiro”.

A partir destes requisitos, Stubbe pode fazer três tipos de investimentos, que reflete numa carteira concentrada em 40 ou 50 títulos que apresentam ponderações similares com independência da capitalização. O primeiro em empresas capazes de gerar retornos elevados sobre o seu investimento em capital, que costuma comprar quando apresentam problemas a curto prazo e são castigadas pelo mercado. Dá como exemplo as empresas de consumo básico, que recentemente foram penalizadas pelas sua exposição a mercados emergentes: “O risco é real, mas existe uma boa oportunidade para gerar rentabilidade”, comenta. Um exemplo desta classe de investimentos é o Novo Nordisk, que é também uma das posições de maior tamanho na carteira.

A segunda classe de investimento são os títulos cíclicos de alta qualidade. Entre as caraterísticas que Stubbe procura estão por exemplo o facto de a empresa ter um modelo forte de franquia, uma boa posição de mercado e uma equipa de direção forte. Costuma comprar empresas e mantê-las entre dois e três anos em carteira, o que explica que agora o gestor tenha procurado ideais no sector da energia.

O terceiro tipo de investimentos são as histórias de restruturação. O gestor precisa que o tipo de histórias que compra sejam aquelas em que já tenha acontecido uma mudança da equipa de direção ou naquelas em que já se tenha traçado uma nova estratégia para a empresa. “Necessitamos de uma prova tangível da restruturação e do que se possa passar nos próximos dois ou três anos”, comenta a esse nível. Um título presente em carteira que cumpre com esta temática é a UBS.

Além desta classe de investimentos, a carteira atualmente conta com uma posição de 6% em cash, devido ao facto de nos últimos tempos Stubbe ter reduzido a sua exposição a alguns títulos e vendido outros por terem alcançado o seu fair value. “Não me sinto forçado a vender se o título tiver alcançado o seu preço justo, porque uma das regras mais importantes dos investimentos é não me "apaixonar" por um determinado título. Se vender antes de tempo, é melhor aceitar o erro e colocar o dinheiro a trabalhar noutra parte do que continuar com algo que não gostamos”, declara.

Historicamente o fundo tem tido uma rotação muito baixa de ativos, entre os 25% e os 30%. Isto deve-se não só à visão de longo prazo de Stubbe, mas também à filosofia que está por detrás das suas decisões de compra. “Não me vejo como um investidor de ações, mas sim como um acionista. Eu estou a comprar um negócio e não uma simples participação. Compro por isso os negócios dos quais gostaria de ser proprietário”.

Porquê investir em ações europeias com um enfoque value?

O gestor admite que no contexto atual é mais difícil gostar de empresas com margem de segurança requisitada, mas manifesta que as ações europeias continuam a apresentar oportunidades tanto a nível dos fluxos provenientes de investidores que venham das obrigações, como pela própria habilidade de casa gestora: “Estamos a viver uma situação extraordinária por causa da grande distorção das obrigações, com taxas negativas e o a apoio dos bancos centrais de todo o mundo. Não é saudável para o sistema financeiro, nem hoje nem a longo prazo. Neste contexto existe a possibilidade de que muitos gestores tenham ideias a curto prazo e que pensem que desta vez vai ser diferente; é um perigo porque geralmente não costuma acontecer”.

O especialista mostra-se muito crítico em relação à ação dos bancos centrais, pois acredita que a “sua” classe de ativos é prejudicada: “O impacto económico do QE é questionável. Teve impacto sobre o mercado financeiro e sobre as valorizações, mas não se deveria confundir com as valorizações fundamentais dos negócios. Temos visto a queda do investimento sobre o capital a um nível extremamente baixo; parece-me algo preocupante tendo em conta o longo prazo, porque o investimento futuro em relação às capacidades da empresa ou aos recursos tecnológicos é o que cria emprego e crescimento. Não necessitamos da recompra de ações: é bom para os acionistas, mas não para a economia”.

Dito isto, o gestor acredita que terminará definitivamente a expansão de múltiplos na Europa e se comece a ver um crescimento real dos lucros. “Estamos a começar a assistir isso agora”, indica. Admite que sim, que as ações do BCE possam ter contribuído de forma positiva, no sentido de que a debilidade do euro servirá de apoio para os lucros, juntamente com a queda do preço do petróleo. “Existe a probabilidade de que os lucros na Europa sejam superiores aos dos EUA por algum tempo”, vaticina, resumindo sobre este ponto.

O gestor faz uma defesa cerrada do estilo value, que considera poder ser adequado para qualquer momento do mercado e não só para o atual: “Já conto com 20 anos a ser um gestor value e para mim é a maneira de investir que tem mais sentido quando avalio um modelo de negócio, e quando necessito de passar de algo abstrato para algo operacional”. Neste sentido, insiste sobre a necessidade de que “o processo seja repetível; os estilos e os gestores podem mudar, mas há que ser disciplinado e fiel ao processo porque isso é o que gera retornos de longo prazo e assegura a longevidade face a outras estratégias”. “É um enfoque fundamental que é sempre válido no longo prazo”, acrescenta.