Onde estão os problemas do índice português?

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Cedida

Um benchmark como o próprio nome indica deveria ser um índice de referência e, nesse sentido, representar quase plenamente o mercado de investimento do país ou região que tem como objeto. Mas, referências tendem a ser, hoje em dia, insuficientes ou pela enorme heterogeneidade de países agrupados nos índices como se verifica no MSCI Emerging Markets, ou pelo facto de a ordenação das empresas ser feita por capitalização bolsista, o que beneficia as maiores empresas e condiciona a diversificação sectorial. Além disso, as regras aplicadas aos índices e aos fundos tendem a ser diferentes, o que cria distorções aquando da comparação dos retornos obtidos, aspecto particularmente importante quando está em causa a atractividade dos índices.

Durante este mês, têm lugar algumas alterações na composição do índice português com a saída da Cofina e da Sonae Indústria, e a entrada da Impresa, CTT Correios de Portugal e Teixeira Duarte. Além disso, há alterações em termos de número de ações, free float e factores de capitalização. Neste sentido, a Funds People questionou alguns gestores de fundos de ações em Portugal, perguntando-lhes onde estão os problemas do índice nacional? Ficarão resolvidos ou minorados com a entrada em vigor da última revisão anual?

Paulo Joaquim, da equipa de ações da ESAF, introduz bem a questão, referindo que “desde sempre se questionou até que ponto é que o principal índice acionista português representava efetivamente a diversidade do mercado nacional e se deveria ser considerado um verdadeiro benchmark, contra o qual seria medido o desempenho dos vários fundos de ações nacionais”.

Este questionamento é comum a todos os outros profissionais, até porque, como explica o gestor da ESAF, “no seu formato vigente, até dezembro as regras limitavam a 15% o peso máximo de cada empresa no índice, (mas) num passado não muito longínquo esse limite chegou mesmo a ser de 20%, quando os vários fundos, como os harmonizados, são obrigados a respeitar um limite máximo de exposição por empresa de 10%, impedindo uma maior aproximação com o índice e distorcendo qualquer comparação com este”. Diogo Pimentel, gestor do fundo Santander Ações Portugal, acrescenta, neste sentido, aquela que considera ser a primeira questão quando se analisa a constituição do PSI-20: a impossibilidade de réplica do índice “que faz com que qualquer comparação de performance entre os fundos de acções nacionais e o PSI20 esteja sempre distorcida”. Pedro Pintassilgo, da F&C, tem uma opinião semelhante, mostrando-se positivo relativamente às alterações que entrarão em vigor no próximo dia 24 de março, nomeadamente a redução do peso máximo de cada título para 12%. Esta modificação, no seu entender, “torna a realidade do índice português mais próxima da seguida pelos fundos”, cujo limite de investimento por título é de 10%. Paulo Joaquim diz ainda que “tornará o PSI-20 um benchmark mais efectivo”.

O problema das capitalizações bolsistas

Paulo Monteiro, da Invest Gestão de Activos, retoma a pergunta inicial, julgando que “os problemas do índice português são os comuns à maioria dos índices onde as empresas são ordenadas pelas respectivas capitalizações bolsistas, o que leva tendencialmente à sobreponderação das maiores empresas e uma potencial redução da diversificação sectorial”. Também neste ponto se vão verificar modificações, como enuncia o especialista da gestora do grupo Espírito Santo: “as novas regras incluem ainda um mínimo de free-float de 15% representando um valor mínimo de 100 milhões de euros, e permitem ainda que o índice tenha apenas 18 constituintes, podendo deixar de fora algumas das capitalizações menos relevantes para os investidores institucionais”. A questão do número é lembrada pelo gestor da F&C, numa lógica, de considerar que “mais importante que um PSI-20 é ter um índice “investível” independentemente do seu número de empresas constituintes, não vendo por isso problema em que este seja reduzido para PSI-18”, muito embora o seu nome esteja registado como PSI-20. Na verdade, sublinha, “falamos internacionalmente de S&P, de FTSE, de CAC, de DAX e não dos respetivos números que lhe estão associados”. “No entanto e observando a questão por outro ângulo, lembra Paulo Joaquim, a nova fórmula de cálculo potencia a possibilidade de algumas empresas com menores capitalizações terem um peso no índice superior ao que a sua capitalização espelharia e desproporcionada a sua posição relativa em relação às grandes capitalizações”.        

E ainda: o problema da liquidez

No caso concreto do índice português, ao problema da distribuição por capitalização e da difícil comparação com a realidade dos fundos dado as diferenças de limites de investimento por título, acresce, conforme afirma Paulo Monteiro, “a fraca liquidez de algumas das empresas cotadas”. Esta que é uma das maiores limitações e que “coloca um desafio adicional a todos os fundos de acções nacionais”, observa Diogo Pimentel, do Santander Asset Management, que pensa que “para ultrapassar estas questões, não devíamos focar-nos na constituição do PSI20, mas sim, na regulação dos fundos de acções nacionais que poderiam ter maior flexibilidade na sua política de investimento. Neste contexto, os reguladores nacionais poderiam, nomeadamente, seguir o exemplo de Espanha, onde os fundos locais têm menores restrições de investimento de forma a conseguirem replicar o IBEX35 e têm ainda a possibilidade de investir até 10% do seu património fora de país”, conclui.

Mercados acionistas: nunca reconhecidos como tal

Para Nuno Marques, gestor de fundos da Banif Gestão de Activos, o problema do índice português reside na sua “excessiva concentração”.  O especialista exemplifica dizendo que “de facto, as 5 empresas mais importantes no índice pesam cerca de 65% do mesmo e, se olharmos para as 10 maiores empresas, o peso ronda os 90%”.

Enunciando uma espécie de dificuldade histórica, Nuno Marques diz que “em grande parte, o problema surge porque os mercados accionistas nunca foram encarados em Portugal como uma fonte de financiamento das empresas”. Por isso, o “PSI 20 é representativo do tecido empresarial nacional mas insuficiente para quem quer investir na economia nacional, por duas razões”, indica. A primeira razão prende-se com o facto de o “universo de empresas com capital disperso no mercado em Portugal” ser muito limitado, sendo muitas dessas empresas “de dimensão reduzida perdendo toda a relevância quando estão lado a lado com as empresas de referência em Portugal, não sendo veículos de investimento viáveis para investidores de dimensão relevante”.  A segunda razão, também já enunciada pelos restantes especialistas, indica que o "PSI-20 é um índice impossível de replicar, por questões legais e de regulação, num formato de fundo harmonizado, cujas regras são desenhadas para proteger os participantes da concentração excessiva”.

Em conclusão, o profissional deixa uma possível solução para o problema do mercado acionista nacional: “um aumento do número de empresas cotadas e dos sectores representados no mercado, o que faria do índice português mais representativo da economia nacional e potenciaria o interesse de investidores de maior dimensão”.

Igualmente ouvido sobre a questão, Abel Sequeira Ferreira, Director Executivo da AEM, a associação que representa as empresas emitentes e que, no passado recente, já se pronunciou sobre o tema, confirma que a AEM entende que as alterações agora introduzidas não resolvem os principais problemas, de liquidez, volatilidade e baixa representatividade do nosso Índice, e que as regras relativas à composição do PSI-20 continuam a suscitar problemas de clareza e  de aplicabilidade prática, dando como  exemplo a ausência de uma fast entry rule que evitasse dificuldades como “a recente demora na entrada dos CTT para o índice, a qual demorou mais de 100 dias, pelo que, durante esse período, o índice não beneficiou do acréscimo de liquidez, maior representatividade da economia e maior equilíbrio na ponderação das diferentes empresas, que essa entrada trará”. O mesmo responsável acrescentou ainda que a AEM já apresentou propostas concretas e detalhadas, à Euronext Lisbon, no sentido do aperfeiçoamento e clarificação das regras em vigor (incluindo as novas regras).

 

(Na foto, da esquerda para a direita: Abel Sequeira, da AEM, Paulo Joaquim, da ESAF, Paulo Monteiro, da Invest Gestão de Activos, Nuno Marques, da Banif Gestão de Activos, Pedro Pintassilgo, da F&C e Diogo Pimentel, do Santander Asset Management).