O que posso dizer aos meus clientes quando me perguntarem como se vão comportar as ações este ano?

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Como se vão comportar as ações este ano? É a pergunta que os clientes fazem aos seus banqueiros privados e assessores financeiros todos os anos. É também a pergunta que estes profissionais mais temem, já que responder a isto não é fácil. Quando questionado, banqueiro ou assessor, pode fazer duas coisas. Arriscar-se a fazer um prognóstico que não acontecerá dentro de doze meses e que pode ser reprovado pelo seu cliente, ou pode optar pela prudência e apostar em pôr em cima da mesa os dados históricos irrefutáveis, que não ofereçam margem para interpretação e que ajudem o próprio investidor final a entender que, no mundo dos investimentos, não se pode falar de certezas, mas de probabilidades. O mês de fevereiro assim o provou, bem como os primeiros dias do mês de março. Dia após dia, estas últimas semanas têm sido ricas em incerteza e deitaram por terra a grande maioria das previsões que se fizeram no início do ano. 

Prever como se vão comportar os mercados de ações a um ano é muito complicado porque se trata de um período de tempo demasiado curto. De todos os modos, são muitos os banqueiros privados e assessores financeiros que, numa tentativa de se agarrar a algum argumento que permita dar uma resposta concreta aos seus clientes, apoiam-se nas perspetivas de fontes independentes. É aí onde entram em jogo das gestoras internacionais e, mais concretamente, os diretores de análise e estratégia das diferentes entidades, aos quais o banqueiro ou assessor costuma passar esta difícil questão nas reuniões, ou apresentações.

Talvez uma das respostas mais coerentes seja a que deu Philipp Vorndran, estratega de mercados da Flossbach von Stroch. “Não faço ideia de como se vão comportar as ações este ano”. É de tal contundência e honestidade que chama a atenção quando vem de alguém que se supõe que seja especialista na matéria. Mas, por muito especialista no mundo dos mercados financeiros que seja, prever qual vai ser o comportamento das ações a 12 meses é impossível. Não se pode falar de perspetivas e até de intuições pessoais, mas em nenhum momento de certeza porque, na realidade, ninguém o sabe. Não obstante, nem toda a gente o diz desta forma tão franca.

Vorndran prefere mostrar dados históricos irrefutáveis, que ninguém pode questionar. Tomando como referência o S&P 500 desde a sua criação, o estratega de mercados da Flossbach von Storch recorda que a rentabilidade anual média do índice é de 11,4% e que em 74% dos anos o índice registou subidas. E após um ano marcadamente bullish, apenas em 15% das ocasiões o mercado foi bearish no ano seguinte. “Toda a gente teme as correções, mas é como se num jogo entre o Real Madrid e o Maiorca apostarmos na vitória da equipa insular. Pode acontecer o Maiorca ganhar, mas esse é um cenário muito menos provável. Não obstante, nos mercados toda a gente tende a apostar no Maiorca".

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São estes os dados. Não obstante, o dinheiro é medroso e os investidores agarram-se ao tema do momento para justificar os seus medos. “A guerra comercial, as eleições americanas, o Brexit... São assuntos que não interessam aos mercados de capitais. O Brexit é um problema para o Governo britânico, para a UE, e até para algumas empresas, mas em nenhum caso é uma questão relevante para os mercados de capitais. A prova mais evidente é que, desde que se conheceu o resultado do referendo, o MSCI World Index subiu mais de 50%. Todos os dias se fala de temas que não são muito relevantes para os mercados e apenas se mencionam marginalmente outras questões muito mais importantes, que vão ajudar os investidores a manter um olhar mais tranquilo”.

Cita, por exemplo, o facto de que, ainda que estejamos perante o período de crescimento mais longo do período pós-guerra, esse crescimento é mais ténue que em períodos expansivos anteriores. O que, apesar da forte subida registada pelas bolsas desde 2009, o prémio de risco das ações (diferença entre a taxa de lucros e média de taxas de juro) permanece em níveis elevados... exatamente nos mesmos níveis em que estava antes da queda da Lehman Brothers (ver gráfico). São realidades que mostram os dados e que se costumam ignorar, levando os investidores a centrarem-se em questões menos relevantes que lhes criam nervosismo e os incitam a sair do mercado.

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"É certo que ninguém morreu por realizar mais-valias, mas há que reconhecer que fazê-lo no contexto atual significa sair do mercado à espera que aconteça uma correção que nos permita comprar o mesmo ativo mais barato, porque não há alternativas nas quais se pode investir para satisfazer as expectativas dos clientes. O problema é que fazer market timing é muito difícil. Como disse Warren Buffett, o verdadeiro risco é não estar investido”, afirma. No mundo dos investimentos há duas leis fundamentais, que não deveriam ser violadas. A primeira é evitar entrar e sair dos mercados ao ritmo que marcam as notícias dos meios de comunicação.

Tal como recordam na Fidelity, os que mantêm os seus investimentos geralmente beneficiam da tendência bullish a longo prazo das bolsas. “Quando os investidores tentam acertar com os tempos de mercado e entram e saem dos seus investimentos, podem correr o risco de desgastar as rentabilidades futuras, já que se podem perder os dias de maior recuperação do mercado e as oportunidades de compra mais atrativas que geralmente aparecem em períodos de pessimismo. Perder as cinco melhores jornadas bolsistas pode ter um impacto importante nas rentabilidades a longo prazo”, sublinham.

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A segunda lei que nos ensinam os mercados é que os investidores e ações geralmente obtêm recompensas pelo risco adicional que assumem na forma de maiores rentabilidades médias a longo prazo. “As negociações dos ativos desviam-se regularmente do seu valor intrínseco quando os mercados reagem excessiva ou insuficientemente, pelo que os investidores podem esperar que a volatilidade dos preços gere oportunidades. A longo prazo, os preços das ações movem-se ao ritmo que marcam os lucros empresariais e geralmente as ações superaram qualquer outro tipo de investimento em termos reais, ou seja, depois da inflação”, concluem na Fidelity.

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