O que é o Blockchain e como pode mudar a indústria da gestão de ativos

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amillionideas, Flickr, Creative Commons

O Blockchain é uma tecnologia que há três anos faz com que seja possível o funcionamento da bitcoin. Simplificando, trata-se de uma base de dados descentralizada que armazena informação encriptada, que permite replicar em tempo real os dados armazenados numa cadeia de blocos. Especialistas da Fidelity International detetaram um fluxo massivo de investimentos de capital de risco neste sector. “Ironicamente, se se tiver em consideração que a tecnologia nasceu como uma alternativa contra o sistema, alguns dos maiores investidores neste âmbito são agora os grandes bancos, que formaram um consórcio internacional (R3), composto já por 42 entidades, para fomentar o desenvolvimento desta tecnologia”, detalham. Segundo algumas estimativas, em 2019 poderemos alcançar até 400 milhões de dólares de investimento total dos mercados de capitais nesta tecnologia.

Da Fidelity International fornecem mais detalhes sobre o funcionamento da arquitetura do blockchain para poder compreender melhor o seu poder revolucionário: “Atualmente, as bases de dados estão descentralizadas logicamente e centralizadas fisicamente. As empresas mantêm as bases de dados fisicamente diferenciadas, protegidas por um perímetro de segurança de rede, mas a informação que armazenam não está encriptada. Os servidores são independentes, o que significa que quando partilham a informação (para processar operações financeiras, por exemplo) devem verificar a informação de forma independente. A conciliação de diferentes conjuntos dos mesmos dados representa, anualmente, um custo de dezenas de milhares de milhões de dólares no sector mundial dos serviços financeiros”.

Pelo contrário, numa blockchain, essa informação está centralizada do ponto de vista lógico e descentralizada do ponto de vista físico. Pode aceder-se à informação num registo central através de múltiplos pontos de acesso. O acesso aos dados produz-se de forma mais ou menos instantânea e podem ser replicados em tempo real. Além disso, esta informação está encriptada, ou seja, está protegida por mecanismos matemáticos que fazem com que seja impossível piratear o registo de propriedade e transações. As blockchain podem ser públicas, como ocorre com o bitcoin, ou privadas. A estas últimas o acesso é feito através de permissões restritas.

“A negociação de muitos títulos baseia-se ainda em sistemas antiquados de contratos negociados entre compradores e vendedores. Por exemplo, a liquidação de operações com empréstimos sindicados demora ainda quase 20 dias”, comentam da Fidelity. Este atraso gera para a indústria um custo total pela compensação, liquidação e gestão associado a operações entre 65.000 e 80.000 milhões por ano. Por isso, especialistas da entidade indicam que “a utilização de redes descentralizadas para os pagamentos e as liquidações poderão ajudar os bancos a poupar milhares de milhões de dólares por ano(entre 15.000 e 20.000 milhões por ano a partir de 2022, segundo o Santander) melhorando e externalizando os procedimentos administrativos de liquidação lentos e ineficientes”.

Nos próximos 18-24 meses poderão surgir empresas especializadas na tecnologia blockchain noutras indústrias. No que concerne a modernização do intercâmbio de dados nos mercados de capitais, na Fidelity não são tão otimistas, já que arriscam estimar que um prazo realista será superior a 10 anos. A forma de acelerar o processo poderia passar por um maior esforço de promoção por parte das autoridades “considerando o interesse destas em contar com infraestruturas de mercado que reduzam os custos para os consumidores e mitiguem os riscos operacionais e sistémicos”. A recomendação que efetuam da fidelity aos investidores que queiram beneficiar desta revolução é que tenham em conta estes prazos ao procurar oportunidades de investimento.

Por agora, da entidade apontam um par de exemplos de empresas pioneiras na utilização do blockchain: a BitProof, que oferece certificações notariais on-line para a propriedade intelectual e outros ativos digitais, enquanto a Otonomos permite aos utilizadores criar empresas abrindo uma carteira de ações digitais que podem posteriormente ser transferidas entre particulares.

Aspectos positivos e negativos

Positivamente, a Fidelity opina que “o desenvolvimento com sucesso do blockchain poderá melhorar a rentabilidade empresarial de todo sector financeiro e ter um efeito benéfico para os consumidores em forma de preços mais baixos nos produtos financeiros de grande difusão”. Também especulam sobre outras possíveis ramificações do uso deste tipo de registos, como por exemplo a sua aplicação à distribuição, ao comércio electrónico, aos meios de comunicação ou à indústria musical.     

Do lado negativo, a entidade considera que “a capacidade das redes de comunicação, será provavelmente um problema para os developers dos blockchain”. Não acreditam que possa ser comparável ao funcionamento da bitcoin. “Embora a negociação e liquidação de valores mediante este tipo de registo seja possível, a complexidade resultante - embora vá admitir milhões de participantes a mais - vai exigir um salto considerável na capacidade das redes”. Para dar uma ideia, explicam que a Visa processa em média cerca de 2.000 transações por segundo (tps), enquanto que a rede bitcoin está limitada a 7tps devido ao limite de 1 MB no tamanho dos blocos.

Também não se deve ignorar os custos transacionais: “Atualmente está a debater-se na comunidade bitcoin se esta moeda deverá ter um maior peso como instrumento de câmbio, com a conseguinte necessidade de aumentar o volume de transações, ou se, contrariamente, deve manter-se como está: um ativo ultra-seguro e escasso, com uma utilidade bastante limitada como instrumento de câmbio. Aumentar a escala da rede e acrescentar diferentes ativos poderá ter novos e importantes custos, bem como complexidades”, resumem.

A conclusão provisória a que chegam na gestora é que “embora os grandes bancos e as clearing houses pareçam estar a dar as boas vindas ao blockchain, poderá tratar-se de uma medida defensiva concebida para conter uma ameaça competitiva, mais do que uma adopção entusiasta do conceito”.