O ouro está caro?

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O preço do ouro subiu constantemente e na passada segunda-feira alcançou um máximo histórico de 1.944 dólares por onça, superando o seu anterior recorde de 1.922 dólares de 2011. Estes níveis levaram alguns investidores a lamentar não se terem dado conta dos recentes movimentos do ouro. De facto, alguns acreditam que está demasiado caro ou até que se está a formar uma bolha. Após uma subida de mais de 20% este ano, depois de um crescimento semelhante em 2019, esta é uma reação compreensível. Estará caro o metal amarelo?

Olhando para a história, vale a pensa assinalar que os mercados bullish de ouro tendem a terminar em movimentos bruscos ascendentes, virtualmente em linha reta.

Tal como recordam James Luke, cogestor do Schroder ISF Global Gold e Mark Lacey, responsável de matérias-primas na Schroders e gestor de Schroder ISF Global Energy Transition, em 2011, por exemplo, o ouro subiu cerca de 15% no mês anterior ao pico e só negociou acima dos 1.800 dólares durante 19 dias. O preço médio anual máximo foi, na realidade, de 1.669 dólares em 2012, muito abaixo dos níveis atuais. E, entre dezembro de 1979 e janeiro de 1980, os preços do ouro moveram-se 80%, num movimento parabólico ainda mais agressivo.

Na equipa fizeram uma lista de sinais de advertência para ajudar os investidores a avaliar se o ouro se encontra em algum tipo de fase de bolha. A conclusão a que chegam é que existem diferenças muito óbvias entre agora e 2011 (ver gráfico).

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Mas, com uma onça que se aproxima dos 2.000 dólares… há algum sinal que nos leve a pensar que nos encontramos perante uma bolha no ouro?

“Uma área onde o impulso foi claramente agressivo é na compra de ouro físico por parte dos ETP. Foi a área mais destacada (de facto, a única) onde cresceu a procura no mercado do ouro em 2020. Os números em si são muito surpreendentes”, indicam. De acordo com os dados publicados pelo Conselho Mundial do Ouro, 643 toneladas foram acrescentadas aos ETP de ouro físico este ano, em comparação com as 372 toneladas acrescentadas em todo o 2019. Em 2009 vimos um aumento anual record de 665 toneladas.

Note-se que 656 toneladas equivalem a quase 40% da produção mundial de ouro. Desde que a Reserva Federal declarou em abril que faria o que fosse necessário para impedir o colapso da economia, as participações em ETP de ouro aumentaram 72 de 79 dias. A questão é... a escala total de ETP de ouro (3.200 toneladas métricas no total ou 104 milhões de onças) provavelmente representará uma bolha insustentável?

Ambos os especialistas não acreditam. “Numa era de criação de liquidez global verdadeiramente gigantesca e de valorizações de ativos financeiros muito elevadas, o que realmente importa é o quão grandes são estas participações em termos relativos”.

Visto desta maneira, as participações em ouro não são particularmente altas. Em 2011, as participações em ETP de ouro representaram 10% de todas as participações de ETF no mundo. Hoje este número está mais próximo de 2,5%. Numa medida mais agregada, estimam que os stocks físicos de ouro representam pouco mais de 2,7% do total de ativos financeiros globais, um número muito menor do que em 2011, 1980 ou 1974.

Segundo Bert Flossbach, co-fundador da Flossbach von Storch, cada vez mais investidores consideram que as taxas de juro zero serão permanentes e estão a baralhar possíveis alternativas de investimento. “A política monetária expansiva e o aumento do gasto público deverão trazer consigo um regresso da inflação a médio prazo. É provável que os investidores tenham uma maior necessidade de proteger os ativos contra este perigo, que não acontece há muito tempo”, afirma.

Na sua opinião, a maior crença de que o ouro é o vencedor da crise não é a interpretação mais acertada. “Mais propriamente, é uma das consequências da crise, em concreto, as taxas de juro prementemente baixas e a inundação de liquidez dos bancos centrais, trouxe de volta o tema da inflação. Como ativo líquido, o ouro é uma boa proteção contra a inflação”, sublinha. No ser ver, a forte procura de ETP de ouro reflete uma crescente procura dos investidores, que provavelmente tenha menos que a ver com a crise do coronavírus em si do que com as suas consequências.