O Mundial afecta a economia e a bolsa? As gestoras internacionais respondem

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Edmar Moreira, Flickr, Creative Commons

O apito inicial para o Mundial aconteceu na semana passada. Resultados futebolísticos à parte, e aproveitando o início recente do torneio, a Funds People foi saber junto das gestoras internacionais a sua opinião sobre o evento. O ING IM, a DeAWM, a Fidelity, a Loomis Sayles & Company, a Threadneedle, a Henderson e a Schroders  debatem o possível impacto que a Copa do Mundo pode ter na atividade económica e na bolsa do Brasil.

A maioria das entidades acredita que o impacto do evento será limitado, mas ainda assim com nuances ou possíveis efeitos derivados que merece a pena ter em conta. No entanto, durante o torneio “qualquer impacto que possa existir sobre o mercado irá sentir-se apenas a nível local e será de curta duração”, diz Bianca Taylor, sénior sovereign analyst na Loomis Sayles & Company, gestora filiada da Natixis Global Asset Management. O que vai ter impacto na economia brasileira nos próximos 18 meses, acrescenta, “será a capacidade para reformar e investir em infraestruturas. No entanto, isto é algo que só poderá ser abordado pelo governo seguinte”.

Da Henderson, o investment manager do Global Emerging Markets, Nicholas Cowley, coloca a tónica no facto de o seguimento massivo que o desporto rei tem no Brasil não ser motivo suficiente para resultar num impulso para a atividade económica, podendo até acontecer o efeito contrário. “Na última temporada de resultados trimestrais no Brasil foi notável o número de empresas que alertaram para o impacto negativo nos seus negócios resultantes da Copa do Mundo. O “amor” que os brasileiros têm pelo futebol é tal, que muitas empresas costumam encerrar nos dias em que a equipa nacional joga, e isso não será compensado pela afluência de turistas e pelos gastos associados”, considera. Para além disso, o Mundial também não jogou a favor da credibilidade política do governo, “já que vários projetos de infraestruturas não ficaram prontos a tempo. Esta má gestão já teve um papel importante na diminuição da taxa de aprovação da presidente”.

Também há algumas entidades que acreditam que o efeito do Mundial na parte económica e financeira é praticamente inexistente, como é o caso de Manu Vandenbulck, portfolio manager emerging markets high dividend do ING Investment Management: “Na nossa opinião é um evento muito limitado a um curto espaço de tempo, pelo que não tem efeito significativo nem na economia, nem na bolsa”. Rubén García Paéz, diretor geral Iberia & Latam da Threadneedle, adverte que o efeito pode até ser negativo: “Tendo como exemplo outros mundiais, podemos comprovar que durante os jogos a atividade económica chega a cair”.

Da Fidelity Worlwide Investment, também veem como limitado o possível efeito do Mundial, apesar do ânimo dos aficionados do futebol - que não são poucos no Brasil - será afetado pelo desenvolvimento do torneio. No entanto, “o acontecimento chave em 2014 para a economia brasileira são as eleições”.

Precisamente as eleições são uma matiz a ter em conta. “Alguns analistas pensam que o Mundial pode ter impacto nas eleições. É, no entanto, difícil de explicar o canal de transmissão exato entre os resultados do torneio e os eleitorais. Mas parece que quanto mais tempo o Brasil ficar no torneio, melhor é para a atual presidente. Ganhar a Copa do Mundo ajudaria a melhorar o sentimento momentaneamente, mas há outros desafios para que a presidente seja reeleita: a economia está a desacelerar mais do que o esperado e a procura popular pela mudança política está a aumentar. Se a Copa do Mundo afetar a eleição, então poderia ter um impacto direto sobre a política económica e sobre todo o sentimento dos investidores num futuro próximo”, explica Luis Ribeiro, responsável de ações latino americanas do Deutsche Asset & Wealth Management.

Da Schroders, Craig Botham, economista especializado em mercados emergentes, também entende que as eleições poderão marcar o ano e ser mais importantes do que a própria Copa. “A candidatura de Dilma pode sair ferida das greves e dos protestos, sobretudo devido aos custos e à corrupção envolvida com o Mundial, ainda para mais se a seleção da casa tiver uma performance fraca”, explica. “Se a Copa trouxer um presidente mais reformista, então seria um verdadeiro legado de crescimento, embora os brasileiros  não vejam uma luz tão positiva”, termina o especialista.

Esta ideia também é corroborada por Nicholas Cowley: “Alguns estudos mostram uma relação entre o êxito desportivo e a possibilidade do governo ser reeleito. Daí que uma decepcionante atuação do Brasil em campo possa aumentar a probabilidade de uma troca no governo, o que seria positivo para o mercado de ações”.

E para o país campeão?

O tradicional relatório da Goldman Sachs sobre o Mundial de futebol, infere na sua última edição que historicamente houve um crescimento em média de 3% durante os três meses seguintes ao campeonato, no país da seleção vencedora. Só um caso foi exceção: precisamente o Brasil, em 1994. Pode o sentimento desportivo dos aficionados impulsionar o mercado de ações? Neste caso o consenso dos gestores questionados é o cepticismo. “Na medida em que o Mundial impulsiona os investidores de retalho locais a investir nos seus próprios mercados de ações devido a alguma exuberância, seria plausível que isso acontecesse, mas caso contrário é muito difícil correlacionar e estabelecer uma efeito de causa-efeito”, indica Bianca Taylor.

Mas há que ter em conta que há um momento, pelo menos no curto prazo, no qual o Mundial afeta o sentimento do consumidor do país campeão, acrescenta Nicholas Cowley. Mas “no Brasil estão habituados a ganhar e qualquer outra coisa seria considerado um fracasso”, o que poderia enfraquecer o efeito. O estudo da Goldman Sachs não contempla o Mundial de 1966, mas Cowley recorda que durante os dois anos e meio que seguiram “o emocionante triunfo de Inglaterra” o FTSE All Share Index revalorizou cerca de 80%.

Da gestora britânica Schroders, Craig Botham destacou ainda que “no curto prazo, a principal consideração é a grande concentração de turistas e as respetivas despesas que vão fazer no país”, destaca o especialista. O governo, liderado por Dilma Rousseff, estima que durante o mundial de futebol passem pelo país mais de 600 mil estrangeiro. “Segundo as estimativas, o PIB poderá aumentar entre 0,1 a 0,6% com os gastos durante o evento”, antevê o economista.

Brasil favorito mas não tanto

Alguns dos gestores acima mencionados também se atreveram a analisar o resultado do modelo de regressão da Goldman Sachs, que atribui probabilidades de ganhar a cada seleção participante, com o favoritismo absoluto e sem sombra de dúvidas a ir para o Brasil (48% de opções). “O Brasil merece ser favorito”, reconhece Cowley, mas avisa que há tendência para existir maior pressão quando as expectativas são tão altas e, por isso, “existe a possibilidade de decepcionar”.

Luis Ribeiro também acredita que os 48% correspondentes ao Brasil é um valor desproporcionado. “A diferença entre a probabilidade de ganhar o Brasil e a Argentina é muito grande no estudo. Entre 25% e 30% para o Brasil e cerca de 20% para a Argentina seria mais adequado. Também consideramos que as probabilidades da Alemanha e da Espanha são similares às da Argentina e deveriam estar mais próximas das do Brasil, do que aquilo que o estudo demonstra”.