Legislação num Minuto – Proibição de comercialização de CFDs e opções binárias

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(Esta semana, a rubrica Legislação num minuto é da autoria de Manuel Cordeiro Ferreira, Principal e responsável pela área de Mercado de Capitais e Serviços Financeiros, da RRP Advogados)

Foi publicado recentemente o Regulamento da CMVM n.º 5/2019, que restringe a comercialização de contratos diferenciais (CFDs) e proíbe a comercialização de opções binárias a investidores não profissionais. Estas medidas tornam permanentes em Portugal as decisões temporárias adotadas e sucessivamente renovadas pela Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e do Mercado (ESMA) desde final de 2018.

O Regulamento suscita duas questões: O que são estes instrumentos financeiros? Porquê proibir/restringir a sua comercialização?

Respondendo à primeira, ambos são derivados a prazo, que permitem assumir uma exposição longa (expectativa de subida) ou curta (descida) ao valor de um determinado subjacente.

Nos CFDs o pagamento devido resulta da diferença do valor do subjacente entre a celebração do contrato e o seu termo. Já nas opções binárias - que, apesar do nome, não estabelecem qualquer opção de compra ou de venda - o pagamento é determinado em função da verificação de uma condição (por exemplo, a subida de um índice para um certo nível): se esta se verifica (o índice atinge esse nível), paga um montante predeterminado; se não se verifica (não atinge), não há pagamento ou pode até haver um pagamento em sinal contrário.

A expressão “assumir uma exposição” é um eufemismo para “apostar”[1].

O que nos leva à segunda questão.

Desde 2004, com a Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros (DMIF), a defesa dos investidores deixou de assentar na aprovação ou proibição de produtos a priori, mas sim no momento da sua comercialização, com as regras de suitability e deveres de informação. Esta perspetiva manteve-se com a DMIF 2, de 2014, reforçada com as novas regras de governance dos produtos financeiros.

A decisão adotada de limitar (permitindo apenas em certas circunstâncias) a comercialização de CFDs e proibir a de opções binárias é uma medida drástica dentro desse paradigma[2]. É um reconhecimento que o sistema de proteção de investidores desenhado desde 2004 falhou[3] e que o único modo de garantir essa proteção é proibir a oferta de certos instrumentos financeiros. Estará aberta a porta para nova mudança de paradigma?

 


[1] Com efeito, segundo dados da ESMA (em https://www.esma.europa.eu/press-news/esma-news/esma-agrees-prohibit-binary-options-and-restrict-cfds-protect-retail-investors), 74% a 89% dos investidores não profissionais que investem em CFDs perdem; as perdas situam-se, em média, entre €1.600 e €29.000. A expectativa de perdas se se apostar sempre na mesma cor na roleta não é mais de 50%... Por sua vez, adquirir uma opção binária não é distinto de apostar no resultado de um evento desportivo: 1x0 paga €10; 0x0 não paga nada.

[2] Segundo dados recolhidos pela IOSCO, o mercado de negociação de CFDs e opções binárias atingia as várias centenas de milhares de milhões de euros no conjunto de vários países da UE como o Reino Unido, Alemanha, França e Espanha (ver https://www.iosco.org/library/pubdocs/pdf/IOSCOPD550.pdf).

[3] Para conhecer um elenco exaustivo das razões que sustentam a decisão de restrição/proibição, é útil consultar os documentos de consulta pública do projeto de Regulamento da CMVM em https://www.cmvm.pt/pt/Legislacao/ConsultasPublicas/CMVM/Documents/Documento%20Consulta%20P%C3%BAblica_2_2019.pdf.