Investir em tecnologia em contexto de pandemia: uma discussão virtual

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Pela segunda vez, a entidade gestora nórdica DNB Asset Management promove em conjunto com a FundsPeople um encontro com profissionais portugueses da gestão de ativos para discutir um tema que lhes diz muito: o investimento em tecnologia. Isto porque Annotation_2020-04-23_094418apesar de a entidade gestora ter uma gama relativamente diversificada de fundos, tem também um especial carinho pelo DNB Funds Technology e o seu parente long-short. E se na primeira vez que a entidade gestora promoveu um debate em Portugal este aconteceu à mesa do pequeno-almoço, num restaurante, desta vez, foi a tecnologia que proporcionou que Fernando Castro Solla, diretor da gestão de ativos do Haitong em Portugal, Nuno Sousa Pereira, responsável de Investimentos da Sixty Degrees e Carlos Pinto, gestor de carteiras sénior na Optimize IP se juntassem a Mikko Ripatti, responsável da entidade gestora nórdica para Portugal e à equipa da FundsPeople numa discussão acerca do impacto da epidemia do Covid-19 no sector tecnológico.

Nuno Sousa PereiraNuno Sousa Pereira considera que, acima de tudo, o que esta conjuntura veio mostrar foi que a generalidade da população tinha adotado já muitas das soluções tecnológicas, mas também que pessoas que nunca tinham sido forçadas a recorrer a esses meios, têm agora que o fazer. “O melhor exemplo que tenho é o meu próprio avô, que com toda esta situação começou a questionar como se faziam compras online. O sector tecnológico vai, no geral, beneficiar desta crise. Por um lado vai ser realizado um maior investimento para otimizar e adotar as ferramentas disponíveis e, por outro, vai haver um maior público para as consumir”.

Fernando Castro Solla mostra-se de acordo, mas deixa uma ressalva. “Há que distinguir nesta questão o curto prazo do longo prazo. Apesar de todos os efeitos positivos que toda esta situação deverá ter nos diferentes sub-sectores tecnológicos, no curto prazo não podemos ignorar o facto de que vamos ter um efeito negativo para as empresas de tecnologia: a quebra de rendimentos”. Para o gestor, o comércio online será um claro vencedor e, provavelmente, “tornar-se-á na norma” de consumo, sendo um claro exemplo de uma das tendências estruturais e seculares que deverá sair reforçada. Por outro lado, “outros produtos e serviços tecnológicos serão impactados num contexto de quebra de receitas e rendimentos. Há que ponderar o entusiasmo.”

Vítor DuartePara Carlos Pinto, “esta nova conjuntura veio reformular as necessidades, tanto das empresas como dos consumidores”. “Não é por acaso que o Nasdaq está a ser muito menos penalizado do que o Dow Jones. O sector tecnológico surge neste contexto como sendo a solução para colmatar as consequências do confinamento da população, com especial enfoque na agilização do trabalho à distância, bem como nas soluções de entretenimento e de consumo”, introduz. Para o profissional da Optimize IP, todas as soluções relacionadas com o trabalho à distância, sistemas de pagamentos, cibersegurança e digitalização “sairão vencedoras desta crise”.

Mikko Ripatti mostra-se de acordo com a ideia de que a crise que vivemos vai acelerar muitas das tendências que já se vinham a verificar. “Ao mesmo tempo que os restaurantes estão fechados, as pessoas mudaram-se para um mundo virtual onde não há restrições. Espero que não tenhamos que enfrentar uma situação destas novamente, mas se acontecer, vamos deparar-nos com um mundo muito mais preparado e, certamente, nessa altura, a realidade aumentada ou a realidade virtual ajudarão a suportar melhor o confinamento”.

Saúde financeira em contexto Covid-19

Mas porque os negócios de tecnologia não são só um conceito, mas sim empresas com ativos e passivos, receitas e custos, no atual contexto de mercado não poderíamos deixar de analisar o seu impacto. A análise cuidada dos dados financeiros e previsões faz parte de qualquer processo diligente de investimento e mais relevante se torna nesta fase de instabilidade. Para Nuno Sousa Pereira, o risco existe, até “porque as empresas tecnológicas são conhecidas por explorar modelos de negócio que ainda não estão disseminados, e estão, portanto, baseados em previsões de crescimento significativo. Demoram tempo a transformar esse crescimento em fluxos de caixa. Precisam de um balanço sólido para aguentar ao longo dos anos. Temos o exemplo de uma grande empresa como a Netflix que teve uma adição recorde de subscritores, mas tem dificuldade em gerar lucros. Outro exemplo é a Airbnb, uma empresa que domina o seu sector, mas que está agora a fazer grandes esforços para obter financiamento”.

Fernando Castro Solla_HaitongA abordagem, nesta fase, “recomenda um stock picking muito afinado e que seja temática, no sentido de maximizar a diversificação”, comenta Fernando Castro Solla. “Eu não sei qual é a biotech que mais  vai beneficiar deste contexto, mas sabemos que, como ‘tema’ de investimento, é muito provável que o sector continue a beneficiar. Nesse sentido, uma abordagem muito diversificada é o que faz mais sentido, sem prejuízo de que se escolham, de forma diligente, alguns potenciais vencedores”.

Carlos Pinto alerta para outro pormenor: “Muitas das empresas do sector tecnológico, que têm florescido recentemente baseiam-se em modelos de partilha de recursos”. É o caso da Uber que, segundo o profissional, está a enfrentar uma tempestade perfeita. “A Uber é um serviço de partilha de mobilidade e num contexto como o atual é algo a que as pessoas não recorrem tanto. Temos que dividir entre as empresas que se estão a lançar e aquelas que já estão lançadas. Destaco as gigantes tecnológicas com modelos de negócio consolidados, têm liquidez suficiente e um balanço sólido que lhes permite não só acomodar esta crise como continuar a investir e a criar alternativas para a sociedade mantenha um ritmo mínimo de atividade económica. Mas quando falamos dos negócios e ideias que ainda estão a ser lançadas, há que fazer uma gestão minuciosa e muito diversificada”.

Mikko RapattiMikko Ripatti realça que na sua casa de investimentos, a DNB AM, o investimento no sector tecnológico é, regra geral, mais value, do ponto de vista dos balanços. “Aquelas empresas que estão mais dependentes de sectores em específico, e especialmente os sectores mais impactados pela crise, vão passar tempos difíceis, mas as empresas maiores e mais estabelecidas veem este momento como uma oportunidade. Vemos como exemplo a aquisição por parte da Facebook uma parcela da indiana Reliance Jio por mais de 5 mil milhões de dólares. Esta aquisição não foi motivada pela crise atual, mas uma empresa preocupada com cash flows e balanço não faria uma aquisição deste tamanho. Isto só mostra que estas empresas maiores de tecnologia, que têm um balanço saudável, poderão ver este momento como adequado e aproveitar para fazer aquisições. Nós preferimos essas empresas”, conclui.