Investimento em dívida pública nacional por parte dos OICVM atinge mínimos

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Tomas alexender, Flickr, Creative Commons

A variação do investimento em dívida pública é indicativo de qual o nível de risco percepcionado de um país, conferindo, também, alguma informação sobre a postura que os investidores institucionais têm no que toca à alocação a este instrumento.

Através da informação disponibilizada pela CMVM no seu site, nas séries longas referentes ao investimento que os OICVM protagonizam em dívida pública portuguesa, é possível, em primeira análise, verificar-se que em maio de 2016 se verificou o valor mais baixo desde 2011 no que toca a este investimento: 110,3 milhões de euros.

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Esta evolução histórica, acima ilustrada, revela vários pontos de inflexão no investimento em dívida pública, que podem ser lidos e interpretados de várias formas. David Pinheiro, da IM Gestão de Ativos e atual gestor de dois fundos com selo Funds People, Blockbuster e Consistente (o IMGA Extra Tesouraria III e o IMGA Prestige Conservador) e ainda do fundo IMGA Poupança PPR, este com o selo de Consistente Funds People, explica precisamente alguns desses timings.

Logo no início de 2011, o gestor recorda que “Portugal encontrava-se numa situação económica e financeira desfavorável, com o défice fiscal acima de 10% do PIB e um nível de endividamento público acima da média dos países da Zona Euro”, juntando-se a isso “um contexto internacional a deteriorar-se com o resgate à Grécia e a crise na banca irlandesa a acentuar-se”. Perante uma conjuntura política também ela adversa, o governo minoritário do PS demonstrava “incapacidade em encontrar apoio parlamentar, o que culminou numa crise política em março com a rejeição do PEC IV, e posterior pedido de assistência financeira em abril por parte do governo liderado por José Sócrates”.

O aumento de probabilidade de default

É precisamente por esta altura que chegamos a uma zona crucial de interpretação do gráfico acima referido: “verifica-se uma subida das yields a 10 anos da dívida pública portuguesa desde 2011, dado o aumento da probabilidade de default do país”. A partir de abril do mesmo ano, o profissional destaca “a queda do investimento em dívida pública por parte dos OICVM, no seguimento do pedido de ajuda financeira”. Chega junho de 2011: um novo governo com maioria parlamentar toma posse, e é fechado um compromisso para aplicação do programa acordado com a Troika. “Não obstante, o prémio de risco da dívida pública portuguesa continua a subir atingindo o seu pico num nível acima de 16% em janeiro de 2012”, lembra David Pinheiro, com os investidores portugueses a “continuaram a reduzir o investimento em dívida pública ao longo de 2012”, como é visível no gráfico.

Julho de 2012: ‘whatever it takes’

No verão de 2012, mais precisamente em julho, assistia-se a um momento histórico, protagonizado por Mario Draghi. O presidente do BCE referia que iria fazer tudo o que estivesse ao seu alcance para preservar o Euro, garantindo que esse esforço seria suficiente. Precisamente a partir dessa data é possível inferir um momento determinante para a análise que efetuamos: “Acentua-se o movimento de redução das yields na dívida pública portuguesa”, diz David Pinheiro, acrescentando que isso “levou a um aumento do investimento por parte dos OICVM em dívida portuguesa”.

O efeito ‘irrevogável’

Este caminho ascendente de investimento em dívida pública portuguesa foi contudo interrompido em julho de 2013: as yields subiram e o investimento em dívida portuguesa caiu 100 milhões de euros, fruto “da ameaça ‘irrevogável’ de demissão de Paulo Portas, que levaria o país para uma nova crise política”. Com a manutenção do governo de coligação, os fundos portugueses reforçaram novamente o investimento em dívida pública para um nível superior a 700 milhões de euros (o valor mais elevado de toda esta série histórica).

Já em 2014 a banca portuguesa dá que falar, o que culmina em “mais volatilidade e subida nas yields portuguesas”. No verão de 2014, “o Banco de Portugal decide aplicar uma medida de resolução ao BES, restaurando novamente a confiança na dívida soberana portuguesa”. Logo quando se coloca o pé em 2015, é a vez do BCE voltar a intervir com uma medida histórica, anunciado “o programa de compras de dívida pública, no qual o banco central se compromete a comprar €60bn por mês de dívida pública da Zona Euro, e que leva a yield portuguesa a atingir um mínimo histórico em abril de 2015”. Esta é portanto uma altura determinante nesta análise, já que se verifica “uma redução gradual do investimento dos OICVM em dívida pública portuguesa”, que se mantém praticamente até aos dias de hoje.

Em outubro mais um momento determinante no que toca à política nacional: as eleições legislativas que deram “origem a um novo governo minoritário de PS com apoio parlamentar dos partidos de esquerda”.  É por esta altura que se “verifica uma subida gradual das yields, dada a conjuntura política mais frágil, e incerteza relativamente à manutenção do caminho de contenção fiscal que tinha vindo a ser seguido pelo anterior governo”, conclui David Pinheiro.