Imposto sobre Transacções Financeiras - parte da solução?

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Nas circunstâncias actuais, a questão do financiamento internacional apresenta-se como fundamental, senão mesmo vital para os Estados que dele dependam para fazer frente aos seus desequilíbrios orçamentais e alcançar a sustentabilidade das dívidas públicas geradas pela crise financeira mundial.

A Proposta de Directiva da Comissão Europeia (CE) sobre a criação de um imposto comum que incida sobre as transacções financeiras (ITF) surge, assim, da necessidade da procura de formas inovadoras de recursos.

Partindo da premissa que o ITF irá gerar um aumento de receita e reduzir os incentivos à especulação nos mercados internacionais e alicerçando-se na ideia de que o sector financeiro deveria dar o seu contributo de forma equitativa para os custos da crise, o Relatório provisório da Reunião dos Ministros do G-20 (FMI 2010, A fair and substantial contribution by the financial sector; Abril 2010), apontou para o facto de o ITF permitir transferir para o sector financeiro a carga tributária extra imposta aos contribuintes em geral.

A ideia não é novidade. O primeiro ITF remonta ao tempo de Keynes, que em 1936 advogou a sua introdução em reacção à Grande Crise de 1930, visando desincentivar e combater a especulação na compra e venda de acções nas bolsas que passariam a ter um custo monetário. A sua Teoria, não sendo incompatível nem repudiada pela ortodoxia económica, conduziu à implementação em vários países de ITFs, a maioria de carácter temporário.

Neste entendimento, na actual Proposta, confirmada por estudos (entre os quais do FMI) e com o apoio de alguns proeminentes economistas, de organizações da sociedade civil e opinion leaders, o ITF é apontado como sendo uma opção viável e sensata.

Porém, para que cumpra o seu objectivo e de forma a poder ser aplicado no combate à evasão fiscal e assegurar uma escala de receitas, o ITF teria, idealmente, de ser acordado e implementado numa base mundial.

Na prática, não é de surpreender que tenhamos de admitir como não viável um ITF mundial. Esta poderá, no entanto, vir a ser uma possibilidade exequível, pelo menos relativamente a um bloco de países, mas para isso há que alcançar o consenso. Numa posição de compromisso entre 11 países e ao abrigo do mecanismo da cooperação reforçada, a UE avançou com a sua abordagem, aprovada recentemente pelo Parlamento Europeu.

Mas a pergunta impõe-se: é possível criar um imposto sobre todas as transacções financeiras do mercado, às taxas de 0,1% para a compra e venda de títulos e acções em bolsas de valores e 0,01% nos contratos de derivados, tendo como sujeitos passivos deste imposto todos aqueles que transaccionem produtos financeiros, sem que seja com base numa implementação gradual?

A evidência afigura-se clara. Não obstante o mérito da Proposta da CE, temos de admitir a fragilidade das premissas fundamentais deste tipo de imposto, o qual demanda um capítulo prévio de reformas a fim de assegurar a sua eficácia. Dito por outras palavras, é preciso criar todo um “ecossistema” integrado para o seu acolhimento, sendo desaconselhadas quaisquer iniciativas individuais por parte dos Estados e, em particular, ao Estado Português prudência no uso que fizer da autorização legislativa constante do corrente Orçamento de Estado.

Pois que, os custos, quer os visíveis (diminuição da liquidez no mercado, risco de fuga de capitais, transferência de custos para clientes, e, numa linha subjacente, acção de grupos de pressão e isenções fiscais desintegradas), quer os invisíveis (custos no tratamento de informação para apuramento e pagamento do imposto, obrigações conexas, custos de prevenção da fraude, evasão e abuso fiscais, risco de litigância, etc.), no actual contexto e enquadramento jurídico apontam, com evidência, para defeitos que impedem o seu desenvolvimento natural, correndo-se o risco de fragmentação e ineficiência.