Guia para aprender a distinguir entre um colapso e uma correção bolsista (e como se deve agir em cada caso)

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Colapso e correção são dois termos muito utilizados para definir fases de quedas dos mercados. Habitualmente, ambos são utilizados como sinónimos, mas na realidade não o são. Cada um deles tem um significado muito específico. Um investidor não deve agir da mesma forma perante um colapso bolsista e perante uma correção. Não saber distinguir quando estamos perante um ou outro é um dos erros mais comuns que os investidores cometem, o que, em muitas ocasiões, os leva a agir de forma errónea nos mercados financeiros, com consequências diretas sobre a rentabilidade dos seus investimentos.

“Um colapso são quedas de 20% (ou mais) que se prolongam durante mais de um ano. Em contrapartida, definimos outros episódios de vendas maciças (quedas de 15% ou mais) que duram menos de um ano como correção. Esta dimensão adicional do tempo é importante, uma vez que muitos investidores podem ser capazes de enfrentar as turbulências que as correções provocam mais a curto prazo, mas irão sentir os efeitos de um colapso bolsista nas suas carteiras de forma muito mais acentuada”, explica Jeff Schulze, diretor de estratégia da ClearBridge, filial da Legg Mason Global AM.

Deste ponto de vista, é claro que os colapsos dos mercados de ações e as recessões parecem andar de mãos dadas. No geral, os colapsos duram três vezes mais e implicam quedas 2,3 vezes mais graves do que as correções. E, o mais importante: os colapsos têm historicamente 2,5 vezes mais probabilidades de coincidir com recessões.

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Quando estamos perante um colapso bolsista, historicamente o melhor a fazer é abandonar o mercado ou, pelo menos, reduzir o risco da carteira. “O ideal será desinvestir no princípio das recessões e investir no final, mas tem de se ter em conta que existe uma grande lacuna de tempo entre o momento no qual acontecem e o momento no qual são anunciados estes factos”, assinala Fernando Luque, editor financeiro na Morningstar.

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Cinco dos seis últimos colapsos bolsistas estiveram ligados a uma recessão. O sexto episódio ocorreu em 1987 e não constitui um exemplo equiparável às condições atuais. Em 1987 aconteceu uma flutuação drástica das taxas de juro a longo prazo, dos 6% até aos 9%, e os mercados de ações recuperaram cerca de 30% durante o ano. Neste contexto, a liquidação de posições de cobertura nas carteiras provocou a queda intradiária mais marcada da história dos mercados num dia que passou a ser designado “Segunda-feira Negra”. “Hoje em dia, a conjuntura é muito mais moderada: os rendimentos das obrigações do Tesouro norte-americano subiram pouco mais de 20 pontos base em 2018, a queda do mercado bolsista foi muito mais contida e não existem catalisadores evidentes que puderam propiciar vendas maciças”, indica Schulze.

A queda do mercado durante o quarto trimestre do ano passado evocou a lembrança dos colapsos de 2008, com o S&P 500 a retroceder cerca de 19% desde o seu máximo de final de setembro, mas tudo aponta para que estejamos perante uma correção. E quando estas acontecem o que tem de se fazer não é vender, como quando um colapso acontece, mas sim manter a calma e aguentar. Se o cenário macroeconómico é o mesmo, não há razões para perder as estribeiras.

A questão chave para os investidores é determinar se a economia está a entrar num período de recessão económica. Cada um pode apoiar-se nos dados que quiser para tentar responder a esta pergunta e tomar uma decisão em relação aos seus investimentos. A ferramenta ClearBridge Recession Risk Dashboard, por exemplo, apresenta doze indicadores focados nos mercados financeiros. Oito deles continuam verdes, apontando para uma fase expansiva do ciclo, apenas quatro encontram-se a amarelo e nenhum aponta para uma recessão (os dados referem-se à economia dos Estados Unidos).

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Consequentemente, mais do que estarmos perante um colapso, iremos estar perante uma das correções a que o mercado está habituado. Embora possa ser complicado determinar o nível no qual as ações irá alcançar o seu nível mínimo, é importante analisar as correções não recessivas de três dimensões: o preço, o momento e a confiança. Embora várias sondagens sobre a confiança tenham mostrado recentemente uma evolução em queda, continuam a manter níveis elevados em termos gerais. E os preços são mais atrativos hoje do que eram há um ano. “As bolsas passaram por muito  na última década, embora as valorizações estejam atualmente num nível muito mais interessante do que estavam há doze meses”, afirma Carla Bergareche, diretora geral da Schroders para Portugal e Espanha.

Os múltiplos de preço/lucro (PER) sofreram os efeitos da recente volatilidade do mercado. A combinação de um contexto de lucros sólidos e rentabilidades negativas afetaram as valorizações de forma considerável. Na verdade, no ano passado deu-se a terceira maior queda anual nos níveis dos PER das últimas quatro décadas, maior até do que a compressão dos PER registada em 2008. “Hoje, os múltiplos de mercado situam-se próximos dos seus níveis mínimos dos últimos cinco anos, em consonância com os últimos choques relativos ao crescimento. Além disso, a contração dos PER centrou-se nos setores cíclicos, que estão a descontar em excesso a probabilidade de que aconteça uma recessão este ano”, sublinham da Legg Mason.

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O PER do mercado americano está hoje em dia em torno das 17 vezes. E neste caso, tem de se ser muito claro com o investidor: o PER não serve para prever o comportamento da bolsa a um ano, mas a dez anos existe uma relação muito clara entre este rácio e a rentabilidade anualizada no futuro oferecida pelo mercado. “Se tivesse comprado nos últimos 30 anos a um PER de 11 vezes, a rentabilidade anualizada dos dez anos seguintes estaria entre os 15% e os 20%. À medida que vai comprando com PER mais elevados, essas rentabilidades tendem a cair. Desta forma, quando se compra com um PER de mais de 20 vezes, historicamente, as rentabilidades geradas a dez anos são negativas. Agora estamos num PER de 17 vezes, o qual historicamente lhe deu a dez anos uma rentabilidade anualizada de entre os 5% e os 10%”, conclui Manuel Arroyo, diretor de Estratégia da J.P. Morgan AM para Portugal e Espanha.

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