Forte recuperação bolsista: o quão lucrativo é não entrar em pânico

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journeyman62, Flickr, Creative Commons

Durante as duas últimas sessões os mercados de ações têm experimentado a primeira recuperação séria do ano desde que começaram a cair, logo nas primeiras sessões de 2016. A recuperação foi significativa e permitiu reduzir as avultadas perdas acumuladas pelos mercados desde o início do ano. As sessões de 19 e 20 de janeiro foram especialmente duras, a colocar à prova os nervos dos investidores. “Toda a gente tem capacidade mental para ganhar dinheiro na bolsa, mas nem toda a gente tem estômago para aguentar. As pessoas que caem na tentação de vender tudo ao mesmo tempo num momento de pânico deveriam evitar totalmente as ações e os fundos de investimento”, assegura Peter Lynch, um dos profissionais mais reputados da indústria. Aos investidores experientes a volatilidade não lhes diz muito. É algo habitual nos mercados... que tem de se esperar. Os que não têm tanta experiência, por vezes, tomam decisões equivocadas.

Embora seja algo que inquieta – e muito – os investidores, é fundamental manter a calma quando os mercados caem. Devemos lembrar-nos que a volatilidade é o preço que se paga por se estar perante rentabilidades superiores, a longo prazo, nas ações, comparativamente com outras classes de ativos. Importante é também a manutenção dos investimentos ao longo dos ciclos de mercado, já que basta estar “fora” de alguns dos melhores dias do mercado para que as rentabilidades a longo prazo fiquem em perigo”, refere Tom Stevenson,  diretor de investimentos pessoaos da Fidelity no Reino Unido. O conselho que dão é que se evite entrar e sair  dos investimentos, já que se corre o risco de perder lucros. Fazer market timimg é algo muito difícil até para os profissionais do mundo do investimento.

A história é testemunha do grave impacto de se estar fora do mercado em alturas de recuperação. Tomando como exemplo o S&P 500, observa-se como é que um investidor que tenha vindo a investir num produto que replique o índice no ano de 1988 e, mantendo o seu investimento durante 26 anos, conseguiu uma rentabilidade de 733%. Se desses 9.500 dias nos quais se manteve investido, tivesse perdido as cinco sessões de maior subida e a rentabilidade teria caído até os 452%. E, se não tivesse estado presente nas 30 sessões mais ‘bull’ registadas pelo S&P 500 nesse período, o retorno teria sido ainda mais baixo (concretamente 72%). “Com estes dados na mão é importante que os investidores não sucumbam ao pânico nos dias maus e que continuem a investir mantendo a consistência e a calma”, sublinha.

David Lafferty, estratega chefe de mercados da Natixis Global AM, considera importante recordar que as decisões relativas à carteira são únicas para cada investidor: primeiro relativamente ao horizonte temporal, e depois em relação à tolerância ao risco. Estes dois factores adquirem maior importância quando os preços caem porque os investidores se sentem em stress. “A tolerância ao risco é importante porque revela indícios sobre a capacidade do investidor de comprar quando os preços estão a cair. Os investidores não conseguem tirar partido dos benefícios do rebalanceamento se se recusarem a comprar quando as ações não estão a ser favorecidas pelos investidores. O horizonte temporal também tem uma relevância muito grande, já que a tormenta que os mercados vivem é improvável que passe rapidamente. Nenhum dos problemas atuais que levou este nervosismo aos mercados se vai resolver no curto prazo. O atual contexto é provável que recompense o investidor que é paciente e o que assume risco, ao mesmo tempo que sai castigado aquele que tem medo ou os que têm uma visão ‘miope’ da situação”.

É certo que a história evidencia que os anos que começam mal nos mercados costumam terminar com rentabilidades negativas. Esta tendência é preocupantemente consistente, cumprindo-se em 78 dos últimos 86 anos. No entanto, também é certo que, nos anos em que os índices bolsistas registam subidas, existem momentos nos quais acontecem quedas interanuais muito significativas. No caso do MSCI Europe, as rentabilidades anuais conseguidas pelo índice são positivas nos últimos 35 anos. No entanto, em todos esses anos existiram momentos nos quais o índice esteve a registar rentabilidades intra-anuais negativas. Os casos mais paradigmáticos viveram-se em 1998, 2003 e mais recentemente em 2009, quando o índice fechou o ano com uma subida de 23%, depois de estar a perder, no início de março, cerca de 26%. Segundo Manuel Arroyo, o atual contexto de volatilidade é normal.

“Nunca nos últimos ano os ativos de risco se comportaram tão bem num contexto de baixa volatilidade. As correções que estamos a sofrer nos mercados não respondem a fundamentais, mas sim ao medo e a aspectos técnicos. O rally registado pelas bolsas durante os últimos anos fez com que os mercados se tenham tornado mais sensíveis. O S&P 500 subiu desde março de 2009 250%. Qualquer desculpa é suficiente para gerar um nível de volatilidade desproporcionado”, afirma o diretor de Análise e Estratégia da J.P. Morgan AM para Ibéria. Neste caso, as desculpas foram a China (desvalorização do yuan e má gestão por parte das autoridades no que toca à crise dos seus mercados) e ainda a queda dos preços do petróleo. A maioria dos gestores mostram-se convencidos de que as bolsas provavelmente continuarão a sofrer com a volatilidade, e o melhor é habituarem-se.

Aguentar é o mais importante. Ainda para mais quando as correções acontecem em contextos  que não são acompanhados por mudanças significativas no cenário base. “As últimas semanas de 2015 revelaram-se complicadas para os mercados, já que a maior preocupação sobre o crescimento mundial, os aspectos geopolíticos e a primeira subida de taxas por parte da Fed afectaram a confiança”, reconhece Rory Bateman, responsável de ações europeias da Schroders. No entanto, na sua opinião, o mercado europeu de ações continua a mostrar uma interessante tendência de recuperação. “As perspectivas são aceitáveis”, afirma. A volatilidade é habitual nos mercados e algo que importa esperar. É o resultado das reações dos investidores às mudanças económicas, políticas e empresariais. “Se recordarmos esta ideia e nos mantivermos centrados racionalmente nos objectivos a longo prazo, surgem as oportunidades”, enfatizam da Fidelity.