Filomena Oliveira (Caixagest): “A indústria tem de se adaptar e aprender a viver com o risco”

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“Vivemos numa nova era de transformação para a indústria de gestão de ativos”. Foi com esta expressão que Manuel Puerta da Costa, presidente da APAF, começou a moderação do painel de discussão do recente fórum Asset Management 2020, organizado pela Thomson Reuters. Esse painel de discussão teve a presença de Paulo Freire de Oliveira, CEO/CIO da BPI Gestão de Activos, Filomena Raquel Oliveira, CEO da Caixagest e Ulugbek Suyumov, presidente da CFA Society Portugal. O tema: os desafios que enfrenta a indústria da gestão de ativos. Neste sentido, foram focados os temas da gestão ativa vs gestão passiva, as valuations elevadas nos mercados de ações e as rentabilidades nulas ou negativas no universo das obrigações e instrumentos relacionados.

Gestão ativa vs passiva

20160929_193032Manuel Puerta da Costa deu realce a algumas estatísticas que apontam exatamente para a relevância do primeiro tema no mundo da gestão de ativos: “Globalmente os investidores alocaram, nos últimos cinco anos, cerca de 2.000 biliões de dólares a estratégias passivas de equity, ao mesmo tempo que desinvestiram 1.500 biliões de estratégias ativas, cimentando uma tendência que se está a tornar cada vez mais relevante, e que se está a estender para o segmento fixed income”. Por outro lado, não deixou de apontar que “as estratégias de smart beta são cada vez mais baratas, especialmente considerando que o custo implícito está a decrescer a um ritmo de 50% ao ano desde 2011”, e que vemos já “40% do S&P500 gerido de forma passiva, bem como 20% do Russel 2000”.

Perante estes dados, Filomena Oliveira não pôde deixar de assumir o desafio, apontando que “vivemos numa era de transformação global que se verifica também em todo o mundo financeiro”, sendo que as estratégias de gestão passiva vieram para ficar e não “são já disruptivas, mas sim, parte do funcionamento e da dinâmica contínua ​do mercado”. Para a CEO da Caixagest, “a indústria vai-se adaptar sempre à situação global da sociedade e às suas preferências”, pelo que “há que encontrar um equilíbrio entre as duas abordagens, e procurar o melhor de ambas”. No entanto, para Filomena Oliveira “o caminho na indústria portuguesa passará muito provavelmente por explorar os vazios e os nichos de mercado e não em repetir ou imitar o que há de muito bem sucedido noutras jurisdições”.

É uma opinião partilhada por Paulo Freire de Oliveira que vê a indústria a continuar a crescer, embora “de forma completamente diferente”. “Nós, os gestores de ativos, temos é que procurar abordagens diferentes e novas lógicas de investimento, para satisfazer o que os clientes procuram, principalmente no sentido de uma geração de alpha”, destacou o CIO da BPI Gestão de Activos, complementando com a ideia de que “os gestores vão tender a concentrar-se em produtos únicos, onde têm vantagem comparativa”. Há semelhança do defendido pela CEO da Caixagest, para Paulo Freire de Oliveira “existem muitos nichos para explorar, muitas oportunidades, não só em Portugal e Península Ibérica, mas também noutros contextos mais focalizados”. Para o profissional é isso que os clientes querem: “Os investidores estão sempre à procura de coisas novas, descorrelacionadas e que façam sentido, que provem que criam alpha”.

Risco assimétrico e a procura de retornos

20160929_194612Confrontados pelo moderador com a questão da assimetria de risco e ausência de retornos nos mercados, Filomena Oliveira e Paulo Freire de Oliveira concordam que retornos objetivo anteriormente considerados normais e adequados já não são possíveis. Neste sentido, a CEO da Caixagest foi peremptória: “Temos que ter noção que os níveis de retorno esperado do passado não se podem manter, mesmo que se verifique alguma recuperação, não podemos ter os mesmos objetivos”. “Esse é o ponto fundamental: a questão da incerteza e do risco”, destacou apresentando como ‘solução’ que “a indústria não pode ver isto como um problema, tendo sim que se adaptar e aprender a viver com o risco”.  Por outro lado, a profissional destaca que se “começa cada vez mais a dar valor a critérios que não são tangíveis”, exemplificando com a tendência de a geração millenial “dar cada vez mais importância a retornos não quantitativos, como por exemplo a questão da responsabilidade social”.

E como se adaptam os analistas financeiros à nova conjuntura?

Já o representante da CFA Society, Ulugbek Suyumov,  vê nos analistas financeiros nacionais uma grande capacidade e proatividade na procura pela formação e certificação, considerando que são factores cada vez mais exigidos para ocupar uma posição de gestor de ativos. Para o presidente da CFA Society, esta formação e certificação permite reduzir o risco de encontrarmos no futuro o equivalente a “um Nick Leeson no passado”. “Temos que ter a certeza que as decisões de investimento estão a ser tomadas em prol do interesse do cliente e não da entidade para o qual se trabalha”, defende Ulugbek que acrescenta também uma nota sobre a essência do analista financeiro nos dias de hoje: “A formação do analista financeiro é cada vez mais específica e vemos cada vez mais os profissionais a abraçarem as competências mais adequadas para fazer face às novas tendências”.