Das bancas privadas às plataformas de fundos nacionais: a implementação de MIFID II

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vapor_trails, Flickr, Creative Commons

O processo de entrada em vigor da DMIF II em Portugal pode dizer-se que foi tardio, ainda para mais se tivermos em conta que, há um ano atrás, como recordávamos numa newsletter especial dedicada ao tema, tudo indicava que a diretiva seria transposta a 3 de julho de 2017.

Mais de um ano depois a transposição acabou por acontecer – no passado dia 1 de agosto. A CMVM, por essa altura, lembrava que com a nova lei passava a ser obrigatória “a definição de características e tipologias de clientes que configuram o mercado-alvo de cada produto”, mas não deixava também passar em branco a obrigatoriedade de “adoção de procedimentos internos e políticos que previnam e minimizem conflitos de interesse, de forma a dar cumprimento ao dever de agir no interesse do cliente”.

Como é que as entidades portuguesas receberam este contexto, e como se têm vindo a posicionar relativamente a ele? Reunimos alguns dos insights mais recentes da indústria financeira relativamente a este tema.

Banca privada

Numa recente “consulta” às bancas privadas para a Revista Funds People número 20, as entidades que responderam enveredaram por duas vias nas suas respostas: oportunidades, mas também constrangimentos que da diretiva advieram. A título de exemplo, um dos pontos negativos apontados foi a possível estandardização da relação com o cliente. Foi o caso do Santander Totta, que evidenciava nessa altura que os “controlos inerentes” à diretiva poderiam ser prejudiciais a esse nível. Afirmavam que ao mesmo tempo que se é compliance, não se pode colocar em causa a “agilidade dos processos”. No espectro oposto – o das oportunidades – foram várias as vantagens enunciadas. Do Private Banking do Bankinter, por exemplo, lembraram que o negócio seria positivamente impactado “na qualidade do serviço prestado aos clientes e na clareza da informação de suporte às decisões de investimento em todo o mercado”. E ao nível da definição do negócio, o que mudou?

Outro dos desafios impostos às entidades prendeu-se com a definição interna que tiveram de executar relativamente ao serviço que prestam aos clientes. Não independente ou independente? No que toca ao serviço de advisory ou consultoria para o investimento, as entidades de Banca Privada, ao que tudo indica, seguiram um caminho homogéneo: a definição de um serviço não independente, em que não cobram um fee ao cliente, mas são remunerados através das gestoras internacionais com as retrocessões que estas lhes proporcionam. Nestas condições estão portanto entidades como o Banco Carregosa, Millennium BCP, Santander Totta e Bankinter (segundo o relatado na revista número 20). Esta decisão das entidades é, obviamente, um reflexo da própria clientela nacional: dificilmente os clientes veriam com bons olhos a cobrança de um fee para receberem aconselhamento financeiro.

Relativamente ao serviço de gestão discricionária o caso muda de figura. O “valor” das entidades é cobrado e, por isso, muitas são as que optaram pela definição de um serviço independente. Era o que reportava também por exemplo o Millennium BCP, o Santander Totta, o Bankinter e o Carregosa. Estas entidades optam então pela disponibilização de classes limpas ou institucionais de fundos, sendo por isso cobrada uma comissão pelo serviço que executam.

A lógica da arquitetura aberta ganha portanto um fôlego renovado neste contexto, em que a ‘precificação’ dos serviços é mais clara e transparente.  A disponibilização do serviço de consultoria de investimento pode dizer-se que ganha também uma nova dimensão, e passa a ser um serviço disponível em entidades onde até então não existiam. Falemos portanto dos Bancos que têm plataformas que distribuem fundos de investimento estrangeiros ou usualmente conhecidos por ‘supermercados de fundos’.

Plataformas que disponibilizam fundos de investimento estrangeiros

Num recente pequeno-almoço realizado pela Funds People com as plataformas que disponibilizam fundos de investimento estrangeiros (cujo conteúdo poderá conhecer na edição número 22 da Funds People Portugal já em distribuição), percebeu-se que precisamente o serviço de  advisory passou a ser um “trunfo na manga” para algumas entidades. O Banco Best, por exemplo, por via da introdução de MiFID II, passou a disponibilizar o serviço de consultoria de investimento com o recebimento de retrocessões por parte das gestoras internacionais – ou seja, um serviço não independente. No caso do ActivoBank, este também deverá ser o caminho seguido, e a entidade pondera fortemente a inclusão deste serviço na sua oferta para breve.

Tal como acontece com as bancas privadas, as plataformas não veem MiFID II só com a palavra “oportunidade” acoplada. Por altura deste encontro com a FP fizeram questão de mencionar desafios como o record keeping bastante exigente imposto pela diretiva que de certa forma poderá até melindrar a relação mantida com o cliente. Incongruências apontadas foram também a “não padronização relativamente à perfilagem e ao targeted marketing ao cliente”.