Brasil: Deterioração dos fundamentos ainda sem ruptura?

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Cedida

Desde o ano passado nossa descrição do cenário macroeconômico do Brasil é de uma deterioração de fundamentos, mas sem uma ruptura, ou melhor, sem uma grande crise financeira. Nossa percepção era devido ao ponto de partida extremamente favorável ao Governo Dilma no final de 2010. Na altura, os índices de endividamento do País, assim como o déficit fiscal e o déficit de conta corrente estavam em níveis aceitáveis. A tabela abaixo mostra a evolução de alguns indicadores entre o final de 2010 e de 2014.

 

Brasil: Piora nos indicadores entre 2010 e 2014 

 

2010

2014

Déficit Público Nominal (%PIB)

2,5

6,7

Déficit de Conta Corrente (% PIB)

2,2

4,2

Inflação ao Consumidor (% a.a.)

5,9

6,4

Dívida Pública Bruta (% PIB)

53,3

63,5

Reservas Internacionais (USD Bi)

288

374

Taxa de Câmbio (BRL/USD)

1,66

2,66

Fonte: Bloomberg

Nota-se uma piora no gasto público e no endividamento externo, sem impactos positivos de crescimento econômico, mas um consequente aumento da taxa inflação e uma depreciação cambial. O aumento da dívida pública causado pelo aumento de gastos e pelos estímulos de crédito através dos bancos públicos (BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal). O excesso de Reservas Internacionais proporcionou uma possível conivência com esta deterioração. Mas tamanhos desequilíbrios cobram seu preço através de inflação elevada e crescimento econômico mais baixo.

O Brasil viveu nos últimos anos uma política de subsídios a setores pouco competitivos, desonerações de impostos, aumento desordenado dos gastos e do crédito público, além da busca quase irresponsável por juros baixos na economia, que levou a redução de boa parte da credibilidade conquistada pelo Banco Central do Brasil.

Em 2014, o processo eleitoral no Brasil deixou alguns rastros negativos. Mas sem dúvida, os riscos elevados dos racionamentos de energia e de água foram os piores. Pagaremos o preço elevado por isso, mas a economia possivelmente incorrerá numa penalidade ainda maior.

Dado o possível aperto de política monetária do FED americano, chegamos ao ponto inevitável de implementar um plano de austeridade, apertar a política monetária e ajustar a casa, como se diz aqui.

O ajuste fiscal de Levy arrumará a casa novamente?

O pacote de medidas fiscais do Ministro Levy será eficiente e suficiente para evitar uma crise financeira, mas será muito difícil alcançar todo o ajuste prometido, devido à acentuada retração econômica. No cenário-base, a economia brasileira contrairá 0,8% do PIB em 2015. E no possível cenário de racionamento de energia, alguns estimam uma contração de aproximadamente 2% do produto.

Esta perspectiva de atividade econômica torna o ajuste fiscal mais desafiador e sugere, que mais medidas de austeridade, cortes de gastos e de investimentos, e substancial aumento da carga tributária componham as medidas deste governo para os anos de 2015 e 2016.

Acreditamos, que as metas fiscais sejam alcançadas, mas com um custo bastante elevado para a atividade econômica e maior ainda o seu custo político para as bases do governo.

O que pensamos dos ativos brasileiros em 2015:

Os ativos brasileiros ainda refletem em parte estes fundamentos atuais. Ou seja, apesar de uma desvalorização cambial de aproximadamente 9% este ano, acreditamos que este ajuste possa ser maior ao longo do ano. E da mesma forma, o mercado de ações parece estar sujeito a revisões negativas de lucros ao longo do ano, a novos aumentos de impostos e a uma política monetária mais apertada, ao menos no curto prazo.

Com respeito à politica de juros, acreditamos que o Banco Central continuará a aumentar os juros da taxa SELIC até 13,00% em sua reunião de abril, no mínimo. Ele permanecerá atento aos fluxos de capitais nos próximos meses, a fim de responder a uma eventual deterioração do risco de crédito soberano, possíveis revisões das notas de crédito do País e de empresas, e da capacidade do setor corporativo em financiar-se internacionalmente, efeitos similares à economia da Russia em 2014.

Encaramos esse momento, possivelmente no 2º trimestre de 2015, como um importante teste à credibilidade e ao valor dos ativos brasileiros. E possivelmente, uma oportunidade de investimento em ativos de renda fixa e de crédito para um horizonte de médio prazo. Agora, continuamos a exercitar a nossa paciência.