As três ramificações do programa de Donald Trump: dólar, dívida e emergentes

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Michael Vadon, Flickr, Creative Commons

As sondagens voltaram a falhar e a ameaça que representava Donald Trump materializou-se no dia 8 de novembro. No entanto, o pavor inicial dos investidores rapidamente passou a uma ovação generalizada. Esta chegada de Donald Trump à Casa Branca terá importantes ramificações em três classes de ativos ou segmentos muito concretos: o dólar, a dívida e os mercados emergentes. Didier Saint-Georges, membro do comité de investidores da Carmignac, analisa cada um deles.

A robustez do dólar é a primeira ramificação do programa de Donald Trump. “Os investimentos em infraestruturas do programa do presidente eleito dificilmente alcançarão os montantes anunciados, mas o défice de equipamento público nos EUA é absolutamente real e os dois candidatos tinham o objetivo de o remediar nos seus programas. Assim, este componente keynesiano das políticas anunciadas deve ser levado muito a sério. Não obstante há que estar consciente de que a execução destes projetos, e mais ainda os seus efeitos multiplicadores sobre o resto da economia, demorarão o seu tempo e terão que enfrentar restrições financeiros. Os mercados, como ocorre com frequência, apressaram-se a descontar as previsões”, explica. Mas há outras ramificações. A segunda passa por uma deterioração duradoura dos mercados de dívida.

Aqui também convém enquadrar o fenómeno Trump no seu contexto. “Os mercados de fixed income estavam muito caros e descontavam, em conjunto, umas perspectivas de estagnação a longo prazo. A este respeito, cabe assinalar que as estratégias ativas de fixed income tinham tido ocasião para reduzir consideravelmente a sensibilidade das suas carteias às taxas de juro desde o início do verão. Várias semanas depois da eleição de Donald Trump, pode-se afirmar que os mercados de obrigações já iniciaram o caminho de regresso para uns níveis de valor mais razoáveis. Mas ao diagnóstico somam-se também umas melhores perspectivas económicas, assim como um aumento das previsões de inflação. Certamente, é demasiado cedo para proclamar um grande desvio das taxas a longo prazo”, assinala Saint-Georges.

 Tal como recorda o membro do comité de investimentos da Carmignac, o mundo não passou repentinamente a ser inflacionista: nestas alturas, conforma-se por ser menos deflacionista. “Inclusivamente nos EUA, onde a inflação já corrigiu e justifica uma subida de taxas mais rápida que na Europa, neste momento estamos simplesmente perante uma subida cíclica: as pressões demográficas e o endividamento público continuam a representar importantes travões estruturais. Portanto, a possibilidade de uma subida rápida das taxas de juro poderá se ruma dos principais riscos e carece de estratégias de fixed income ágeis”, indica.

A terceira ramificação chave é um novo desafio para os mercados emergentes. “O conjunto formado pelo dólar forte, taxas de juro em alta e ameaças protecionistas não é, em absoluto, um bom augúrio para as economias emergentes e os mercados rapidamente deram conta desta circunstância. Os ativos mexicanos, afetados diretamente pelas ameaças de Donald Trump foram especialmente penalizados e descontam o cenário de que as ameaças serão postas em prática sem reservas. Serão realmente tão radicais?”, pergunta-se o especialista. Saint-Georges duvida.

“Para Donald Trump não vai haver outro remédio que encontrar um equilíbrio entre proteger a classe trabalhadora norte-americana e salvaguardar os interesses das empresas do país, que necessitam de mão de obra mexicana, os recursos naturais do Canadá e os custos de produção asiáticos”.

Relativamente às relações comerciais com a China, da Carmignac consideram que estas se verão influenciadas enormemente pelo encaixe político que se quiser preservar no Extremo Oriente. “Sem dúvida, serão renegociados tratados comerciais e talvez de substituam acordos multinacionais por tratados bilaterais, mas é improvável que se possa reverter 25 anos de globalização económica. Mais do que as tensões de curto prazo, e sem distinguir entre as classes de ativos, os mercados emergentes que tenham sabido recompor uns fundamentais sólidos desde 2013 parecem ter sofrido um castigo excessivo desde 9 de novembro”.