Algumas linhas para perceber as implicações da última subida da taxas de juro pela Fed

298178781_7df6d9179f_b
Gaetan Lee, Flickr, Creative Commons

A Reserva Federal subiu as taxas de juro em 25 pontos base, tal como anteciparam os mercados. A primeira variação desde dezembro do ano passado, que foi acompanhada de uma previsão de subidas adicionais em 2017 e um caminho monetário mais rápido e agressivo do que o previsto em setembro. Não se produziram grandes mudanças nas previsões de crescimento, desemprego e inflação e estas não refletem qualquer estímulo no orçamento que Donald Trump poderá aplicar. Se o presidente eleito usar uma política fiscal expansionista de grande escala, a Fed poderá ver-se obrigada a acelerar a normalização da sua política, explica Mitul Patel, responsável de taxas de juro na Henderson. "Até agora os mercado consideraram que este anúncio é mais agressivo do que o esperado", afirma.

Estes reagiram dando maior enfâse à perspetiva revista das taxas para 2017. As obrigações soberanas dos EUA foram vendidas massivamente, elevando os rendimentos a dez anos em 15 pontos base, para 2,59%, o máximo desde meados de 2014. No entanto, foram os vencimentos mais curtos que mais subiram, refletindo assim o potencial de que se realizem mais aumentos das taxas do que aqueles que estavam previstos. A obrigação a dois anos dos EUA era de cerca de 1,3% quando no início de novembro se situava em 0,8%. O spread entre os rendimentos nas obrigações soberanas dos EUA e da Alemanha alcançou níveis que não se viam desde 1989.

"A subida das taxas pela Fed, mais as que se esperam em 2017, provavelmente irão aumentar ainda mais este spread. No entanto, não devemos esquecer o jogo das expetativas. Até agora são, em geral, positivas para os EUA e negativas para a Zona Euro. Por outras palavras, parte do efeito Trump já se reflete no spread dos rendimentos dos EUA e da Alemanha. Em 2017 poderá haver um novo máximo", refere Stefan Kreuzkamp, director de investimentos da Deutsche AM.

Enquanto isso, o mercado de ações acusou uma certa pressão, dado que a normalização da política monetária poderia pesar no otimismo alimentado por uma melhoria das perspetivas de crescimento, enquanto que o dólar se apreciou face às restantes divisas, alcançando um nível mais alto, face ao euro, desde 2003. "Com a subida das taxas de juro a registar-se no momento esperado com uma mensagem neutra, o rally do dólar pode fazer uma pausa, embora acreditemos que em 12 meses irá alcançar a peridade com o euro", vaticina Kreuzkamp. Agora a chave está em saber como irá responder o dólar à decisão da Fed. "Um dólar forte pode não ser o melhor para a economia norte-americana, mas é possível que agrade aos investidores de obrigações, já que a divisa irá exercer uma pressão descendentes sobre o crescimento económico e a inflação", afirma Jack McIntyre, gestor da Brandywine (Legg Mason).

A principal preocupação é...

Apesar de já terem descontado o movimento da Fed, observou-se uma postura ligeiramente agressiva nas perspetivas de subida das taxas por parte dos membros do Comité, para os próximos anos. Para 2017, a autoridade monetária antecipa três subidas, o que supõe uma aceleração no ritmo de endurecimento, tal como recorda Ken Taubes, diretor de investimentos da Pioneer Investments nos EUA. Essa é, agora, a principal preocupação dos investidores. "A frequência e a magnitude das novas subidas de taxas irá depender principalmente dos prazos e das repercurssões das políticas inflacionistas favoráveis ao crescimento de Donald Trump, assim como a sua capacidade para aumentar tarifas comerciais", indica Kasia Kiladis, diretora de investimentos em ações norte-americanas da Fidelity.

O que foi interessante no discurso?

John Bellows, gestor e analista da Western Asset, outra das filiais da Legg Mason, considera que o mais interessante foi a evolução prospectiva do FOMC. "O comité não fez uma revisão substancial da sua previsão de crescimento, embora o mercado parece ter reavaliado consideravelmente as perspetivas desde as eleições. O FOMC, provavelmente, decidiu que era demasiado rápido fazer mudanças significativas às suas previsões para 2017 e anos seguintes. Para um grupo de economistas prudentes, de pensamento empírico, existe demasiada incerteza sobre a magnitude, o alcance e os detalhes da nova política orçamental do Governo, para não falar que essas políticas podem implicar para o crescimento. Existe uma preocupação real acerca do endurecimentos da política comercial, com repercurssões na procura e na predisposição para o risco".

Mas...o que implica tudo isto?

Para Rick Rieder, diretor de investimentos em obrigações da BlackRock, "em geral, as características mais importantes desta nova política e contexto dos mercados são, claramente, a reflação, a inflação e uma maior otimismo sobre a possibilidade de chegar ao equilíbrio entre um maior peso da política orçamental e um menor estímulo monetário". Neste ambiente, Rieder acredita que os mercados de obrigações do tesouro norte-americano estão protegidos contra a inflação (TIPS), continuam interessantes e os mercados de ativos de risco poderiam ver-se mais reforçados.

"As taxas de juro podem subir de forma moderada, as perspetivas da inflação podem acelerar e, o que é mais importante, o investimento económico e financeiro pode crescer - e vai acontecer - graças a estes factores", assegura. Mas também existem os riscos. Para Ignacio Díez, gestor de obrigações do Credit Suisse Gestión, o aumento da taxas a curto prazo vão encarecer o custo dos empréstimos. "Apesar dos lares americanos estarem em fase de desalanvacagem, este cenário poderá prejudicar o consumo em 2017. O sector imobiliário, que leva vários trimestres em alta e que está mais ligado às taxas de longo prazo, também podem sofrer uma estagnação. Seria desejável que a Fed fosse mais cautelosa na hora de dar indicações futuras em matéria de política monetária para não afetar de forma negativa a recuperação da economia americana e provocar uma forte correção de certos ativos e sectores são mais próximos das obrigações".