A resiliência dos ETF de obrigações num momento de stress dos mercados

André Themudo
Cedida

O mercado de ETF terminou o ano de 2017 com um recorde de fluxos de entrada de 630 mil milhões de dólares, uma subida de quase 70% face ao ano anterior. Este ano, o primeiro mês do ano foi o melhor mês de sempre para este segmento do mercado – com entradas de cerca de 100 mil milhões de dólares – mas a volatilidade do mês de fevereiro fez com que terminasse de forma mais neutral. De facto, o pico de volatilidade verificado no início de fevereiro fez soar alguns alarmes nos mercados, registando-se quedas significativas. Passado esse período mais turbulento, o contexto parece agora mais calmo, embora existam riscos que continuam a figurar no radar dos investidores. Uma das principais questões que têm sido colocadas relativamente aos ETF de obrigações está relacionada com o seu comportamento em períodos de stress de mercado.

Para André Themudo, diretor de vendas para Iberia da BlackRock, a segunda semana de fevereiro acabou por ser um excelente teste à liquidez e ao bom funcionamento dos ETF, uma vez que demonstraram a sua resiliência. “Vimos um movimento crescente, até três vezes mais, do nível transacionado, tendo representado 40% de todo o volume negociado nos Estados Unidos. O interessante é que apenas uma pequena percentagem desse volume foi em mercado primário, o que significa que o mercado secundário funcionou perfeitamente bem. Existe uma liquidez adicional, e essa é uma das razões pelas quais os ETF de obrigações estão a crescer cada vez mais”, revela.

Mas as razões pelas quais a procura por este tipo de produtos tem vindo a crescer não se esgotam na liquidez. O preço, segundo André Themudo, é o principal factor: “Em média, é muito mais barato transacionar um ETF de obrigações do que ir ao mercado comprar todo o cabaz de obrigações que existe, em que o spread é muito mais alto”. A diversificação surge como outro factor importante, uma vez que existe a possibilidade de obter exposição a inúmeras obrigações com uma única transação. Dito isto, os gestores têm vindo a perceber cada vez melhor o potencial dos ETF de obrigações em comparação com a compra de obrigações diretamente. “Na BlacRock verificamos que são os gestores de obrigações, os chamados ‘bond-pickers’ que normalmente só investiam em obrigações diretamente, que têm vindo a transformar a sua carteira através de ETF. Fazem, portanto, a sua alocação de forma muito mais diversificada através de 10 ou 15 building blocks com ETF – crédito americano, high yield emergente, corporate emergente, etc. – de forma muito mais eficaz”, explica o especialista.

Em Portugal, 72% do negócio da BlackRock está em gestão passiva, sendo que desta percentagem, 45% está em ETF de obrigações. Uma preponderância que “demonstra que o ruído relativamente à liquidez dos ETF de obrigações tem vindo a ser desmistificado”, destaca André Themudo. Quanto às categorias, embora a dívida de mercados emergentes seja uma categoria importante pelo contexto de mercado e macro-económico, aquela que se destaca é a categoria de obrigações de crédito europeu.

Saber diferenciar os ETF dos ETN é importante

Para o profissional, os ETN tiveram algum impacto no pico de volatilidade e na consequente quebra de mercado durante a semana de fevereiro, mas não foram a principal razão, apenas amplificaram esse movimento. “Os ETN de volatilidade, eram notas alavancadas, sintéticas e com posições curtas. Fazem aquilo que nós achamos que não se deve fazer num ETF e é destes produtos que nos pretendemos distanciar”, começa por dizer, acrescentando que “são produtos com estruturas totalmente diferentes, que criam muito mais confusão no mercado, sendo que a replicação dos índices é muito mais difícil nestes casos do que no caso dos ETF long only de réplica física, que são muito mais transparentes”.

Inovação e tendências para o futuro

No que diz respeito aos novos produtos do segmento de ETF lançados pela entidade que maior procura têm gerado, o grande destaque têm sido os produtos com classes cobertas de divisas. Por outro lado, o lançamento de ETF socialmente responsáveis tem sido uma constante, com bastante procura por parte de clientes institucionais, como é o caso de fundos de pensões ou fundações. Um segmento cuja oferta tem também crescido é o de ETF temáticos, uma área na qual André Themudo destaca o lançamento de um ETF ligado ao envelhecimento da população, “cujo investimento vai incidir sobre campos de golf, farmácias ou hospitais, por exemplo”.

Quanto a tendências para o futuro, uma delas é adoção crescente de ETF por parte dos gestores ativos. Na opinião do profissional, o debate ativo versus passivo tem vindo a perder importância, uma vez que “qualquer decisão é ativa – quem investe num ETF vai ter de decidir em que ETF quer investir ou que índice quer seguir”, revela. O aumento da regulação e da pressão nas margens no sector financeiro têm vindo a ser alguns dos impulsionadores da adoção de soluções multiativos, que o profissional considera ser uma das tendências que tem ganho terreno e que vai ter cada vez maior importância na gestão de ativos. Outra das tendências é a alteração da utilização de ETF por parte dos gestores, isto é, “se antes a adoção destes produtos era mais tática, hoje é mais estratégica e de longo prazo, procurando deter exposições muito mais nucleares e em mercados mais abrangentes”, detalha o profissional.