A queda dos portugueses pelos depósitos e o caminho a traçar pela gestão de ativos

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A poupança nacional tem vindo a recuperar, e o Instituto Nacional de Estatística assinalou que no último trimestre de 2019 o valor poupado pelos portugueses tinha atingido o pico desde o quarto trimestre de 2018. Poupança será sinónimo de aplicação em que tipo de ativos financeiros? Que classes de ativos ou aplicações têm sido privilegiadas pelas famílias nacionais?

Em primeira análise importa assinalar que o valor alocado pelas famílias nacionais a ativos financeiros tem crescido na última década, com exceção feita a três (previsíveis) anos: 2011, 2012 e 2013.  As séries longas do Banco de Portugal (BdP) e do INE mostram uma rota relativamente crescente no total dos ativos financeiros das famílias e, ao mesmo tempo, uma conclusão também ela já expectável: a grande confiança que as famílias continuam a ter nos depósitos. No final de 2018, mais de 45% do património financeiro destes agregados estava alocado a moeda e depósitos, o que em termos numéricos cifrava mais de 182 mil milhões de euros. Interessante é perceber também que os depósitos à ordem acabam por ter “maior peso para as famílias da classe de riqueza líquida mais baixa”, atesta o BdP num inquérito à situação financeira das famílias referente ao ano de 2017. Os depósitos a prazo, por sua vez, ganham maior importância nas restantes classes de riqueza, sendo “o ativo financeiro mais importante”, “representando mais de metade do total dos ativos financeiros”.

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Faca de dois gumes 

E os fundos de investimento, que peso têm nas carteiras das famílias nacionais? Em 2018, o BdP mostra que estes instrumentos eram os menos robustos ao nível da alocação feita no património financeiro dos portugueses, o correspondente a perto de 17 mil milhões de euros, ficando atrás das ações e outras participações (110 mil milhões de euros) ou dos regimes de seguros e pensões (68 mil milhões de euros) e, claro, dos depósitos.

Contudo, a EFAMA (Associação Europeia de Fundos de Investimento e Gestão de Ativos) mostra que em 2017 as famílias eram quem mais alocava património a fundos de investimento em território nacional comparando com os restantes detentores de fundos, como por exemplo as seguradoras e fundos de pensões ou as instituições financeiras. As famílias detinham nessa altura 36% do total de ativos financeiros nesses instrumentos, em Portugal. O termo de comparação com Espanha é inevitável: embora também no país vizinho sejam as famílias o maior contribuidor para a balança dos fundos de investimento, no caso de nuestros hermanos o contributo é o dobro do nacional: 62%.

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No total dos ativos detidos pelas entidades financeiras, embora as famílias não sejam o peso pesado, a Associação europeia reporta uma ponderação de 35% deste tipo de clientes, o correspondente a 285 milhões de euros. As instituições monetárias financeiras são, por seu lado, o grande detentor dos ativos financeiros em Portugal.

Os números refletidos nesta análise não deixam grande margem para dúvida de que ainda muito há por explorar pela indústria de gestão de ativos junto das famílias nacionais. Como disse recentemente o presidente da APFIPP numa entrevista à Funds People, “num quadro em que os depósitos bancários são fortemente desincentivados pelo BCE, em que os depositantes recebem zero ou pagam mesmo por entregar dinheiro aos bancos, falta uma explicação que mostre porque é que os fundos de investimento não constituem uma escolha prioritária para o pouco de poupança que ainda existe”. Fica o desafio aos agentes de mercado, decisores e reguladores para que trabalhem no sentido de proporcionar às famílias portuguesas serviços e produtos de investimento adequados que lhes permitam ganhar algo mais do que as irrelevantes taxas dos depósitos.