A necessidade aguça o engenho: a transformação digital e a relação entre saúde e tecnologia

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Costuma-se dizer que a necessidade aguça o engenho, e a atual situação que vivemos não podia ser mais prova disso. Sem a possibilidade de as reuniões de trabalho e contactos poderem ser feitos presencialmente, multiplicaram-se as plataformas acessíveis para o fazermos… à distância de um ecrã. Mas esta transformação digital quase que forçada para alguns organismos e empresas será um boost temporário? Ou impregnar-se-á nas rotinas, mesmo quando o contacto físico voltar a ser possível e aconselhável?

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Foi precisamente num pequeno-almoço virtual promovido pela DNB Asset Management em colaboração com a FundsPeople, com a presença de Mikko Ripatti, responsável da entidade gestora nórdica para o mercado português, que algumas impressões foram trocadas sobre o tema, com três profissionais da indústria: Fernando Castro Solla, diretor da gestão de ativos do Haitong em Portugal, Nuno Sousa Pereira, responsável de Investimentos da Sixty Degrees e Carlos Pinto, gestor de carteiras sénior na Optimize IP.

Vítor DuarteCarlos Pinto, da Optimize IP, é da opinião de que a transformação para o formato digital não será repentina, “não vamos passar do oito, para o 80”. “Acho que será gradual: as pessoas vão-se habituar a este meio de comunicação – porque é mais prático, mais flexível, etc. –, mas por outro lado, o contacto presencial também vai continuar. Não se trata de uma questão binária. Por exemplo, se até aqui a esmagadora maioria das reuniões eram tidas presencialmente, muitas destas vão passar a ser à distância usando as várias ferramentas digitais”, começou por referir.

Recordando o ainda curto espaço de tempo que leva este confinamento, Fernando Castro Solla é da opinião de que a intensidade da transformação digital “depende de quanto tempo este contexto irá demorar”. “Quando visto a camisola mais pessimista, temo que a saída seja de tal forma progressiva que de facto dê mais tempo para a adoção deste tipo de tecnologias de que estamos a falar”, conjetura, referindo que, provavelmente, se amanhã a nossa vida voltasse 100% ao normal, “algumas resistências à adoção de tecnologia eventualmente também voltariam”. Para o profissional é uma questão de proporcionalidade: “Quanto mais tempo tivermos de recorrer obrigatoriamente a este tipo de alternativas, mais elas se entranharão na rotina”, acredita.

Nuno_Pereira_BPI_Gesta_o_de_Activos_BPI_Obrigac_o_es_Alto_Rendimento_Alto_RiscoCom uma experiência proveniente da juventude da própria entidade onde trabalha, Nuno Sousa Pereira fala de como têm conseguido fintar a necessidade de presença física. “Como fomos construídos há pouco tempo, a nossa matriz tem muito já de possibilidade de resposta online. Conseguimos a abertura da conta do cliente de ponta a ponta virtualmente, com assinatura digital reconhecida, etc.”, introduz. Na relação com o cliente enfrentaram “uns 15 dias de maior resistência”, mas agora estão a conseguir gerar reuniões online, e há mesmo clientes novos que nunca viram presencialmente. É ponto assente para o profissional que o “o teletrabalho está para ficar”, embora em atividades como as vendas, por exemplo, “haverá algum retrocesso assim que a economia abrir”, por uma maior resistência a não serem efetuadas presencialmente. O sistema 5G, por seu turno, trará outras oportunidades como uma maior robustez do sistema “que irá permitir que as empresas mantenham estes processos de teletrabalho”.

Na opinião de Mikko Ripatti, não há “como substituir totalmente o contacto pessoal”, mas, de facto, “há muita coisa que pode ser feita sem estar fisicamente no mesmo lugar”. Assinala, também, e como já referido, as vicissitudes do hábito, com um exemplo mais banal: “Na televisão finlandesa entrevistaram professores sobre o ensino à distância. Uma professora com uma certa idade falou da dificuldade que teve no início do processo, tendo de trabalhar mais horas para se adaptar; no entanto, dizia também que passado esse período de adaptação passou a gostar e já fazia parte do seu dia-a-dia!”, ilustrou.

Saúde e tecnologia: quo vadis?

Outra das relações extremamente comentadas nos últimos tempos é a de dois sectores em específico: saúde e tecnologia. Que virtudes traz a sua conjugação e o que se pode aprender desta crise sobre a sua interligação?

Otimizar a capacidade de analisar  dados e estabelecer padrões, são duas das vertentes que, relembra Carlos Pinto, “já vários estudos demonstram a sua eficácia e rapidez” quando se fala desta relação entre saúde e tecnologia”. Por outro lado, assinala também que “o efeito da tecnologia é mais visível agora, pela maior desburocratização das várias entidades regulatórias fruto da urgência de tratamentos à epidemia. Verificamos testes a serem aprovados em dias quando demoravam meses e vamos certamente ter as vacinas mais cedo do que o previsto.””.

Fernando Castro Solla_HaitongPara Fernando Castro Solla, um dos grandes ensinamentos que podemos tirar desta crise é que em situações vindouras teremos “que usar todos os meios para reforçar a resposta”. “Em termos históricos, não é aceitável a quebra económica que se está a gerar com um vírus que é de média perigosidade”, diz, referindo que “com todas as dificuldades que os países enfrentam na Europa” não vê “outra forma que não seja a tecnologia a dar essa folga e capacidade de resposta adicional”. Nas carteiras que gerem, refere mesmo que dentro da área da tecnologia, o healthcare é onde fazem maior stockpicking.

Também Nuno Sousa Pereira é da opinião de que “a saúde e a tecnologia são os dois sectores essenciais para estarmos a ultrapassar esta pandemia”. Acredita que “cada governo terá de manter o modelo de saúde existente em cada país e construir Mikko Ripattium novo assente numa matriz tecnológica”. Por outro lado, também os profissionais de saúde terão que ser maximizados. “Quando for possível terão de existir consultas à distância ou, quando não forem à distância, com equipamento que permita esse distanciamento”, aponta.  “Já existem alguns investimentos em tecnologias de ponta para fazer cirurgias não invasivas, e uma maior monitorização do corpo. Acho que isso vai continuar”, conclui. 

Embora a tecnologia não tenha conseguido evitar a pandemia, Mikko Ripatti considera que esta tem tido “um papel importante para sairmos desta crise”. Noutra crise semelhante, no futuro, “a tecnologia poderá ser muito importante para nos prepararmos melhor”, acredita o profissional, que é da opinião de que continuará a ser essencial o ser humano para “comandar e planear” essa tecnologia.