A lei de Murphy aplicada à gestão de ativos

Fernando_A
Fernando A. Carvalho, Flickr, Creative Commons

Não falha. Reduz-se o nível de risco das carteiras e o mercado dá a volta. Trata-se da lei de Murphy aplicada à gestão de ativos. Os que em meados de fevereiro não aguentaram mais a pressão e optaram por vender, perderam a recuperação.  Esta é mais uma prova da importância de manter a calma em períodos de incerteza, e da má experiência de investimento que pode advir de se tentar fazer market timing. “A tentativa de prever os movimentos de mercado não é uma forma de garantir a segurança financeira. Os fluxos históricos dos fundos mostram que atitudes mais passivas de investimento nos mesmos, por parte do investidor médio, teriam melhores resultados do que tentar antecipar o mercado. Com o tempo, a própria rentabilidade do investidor pode fazer estragos nos resultados”, revela Brendan McCurdy, membro da equipa de Strategic Advisory Solutions da GSAM.

Para demonstrar a sua teoria, o especialista ilustrou este fenómeno em termos agregados. Nela demonstra que (1) os dez maiores fluxos mensais de entrada em fundos de ações norte-americanas (representadas com um “+”) aconteceram, frequentemente, próximos de subidas a curto prazo no S&P 500, e também (2) que os dez maiores fluxos de saída de fundos (“-“) se acumularam em momentos de mínimos, a curto prazo, no S&P 500. “A conclusão é clara: os investidores deveriam ter evitado a tentação de antecipar o mercado e, em vez disso, ter adoptado uma perspectiva de investimento a longo prazo”. No mesmo sentido tem-se vindo a pronunciar a Fidelity, ao recordar que muitos investidores perdem as subidas, porque se confrontam com investidores que estão fora do mercado. O estudo da gestora também reflete o elevado custo em termos de rentabilidade que tudo isto acarreta. O seu conselho segue na mesma linha: evitar sair e entrar dos investimentos para que depois não existam lamentações.

Isto é o que acaba de acontecer. No dia 11 de fevereiro o EuroStoxx 50 acumulava um retrocesso anual de 18%. Existia a informação de que muitos investidores cortavam drasticamente o risco das suas carteiras. Apenas dez dias depois as perdas do índice tinham-se reduzido até aos 10%. No caso do S&P 500 a descida anual passou dos -11% para os -5%. “A existência de volatilidade era algo que estávamos a antecipar desde há um ano e meio. O que acontece é que até agora ainda não se tinha materializado. Estamos no meio de uma transição da ordem mundial, na qual a revolução tecnológica, o carro elétrico, o fracking ou a reconversão chinesa vão gerar mudanças muito importantes. Até que aconteça esse reajuste em direção à nova ordem existirá seguramente incerteza. O pânico que existe é excessivo. Nem quando os mercados sobem as coisas estão a evoluir assim tão bem, nem quando descem estão assim tão mal ”, assegura Ana Guzmán, diretora geral e responsável de desenvolvimento de negócio da Aberdeen para Ibéria.

Os investidores têm antecipado que o colapso do preço do petróleo e dos mercados em geral não é uma recessão. No entanto, tal como recorda James Swanson, diretor da estratégia da MFS IM, “a história diz-nos que as quedas do mercado como as que aconteceram desde o início do ano não têm por que ser um sinónimo de recessão. Desde 1959 aconteceram onze quedas do S&P 500 da magnitude das que temos assistido nos últimos meses – quedas entre cerca de 10 e 19%. No entanto, apenas três destes episódios terminaram em recessão, enquanto que os outros oito não. A média de queda do mercado durante esses oito episódios foi de aproximadamente 16%, e seis meses depois da queda, o S&P subiu cerca de 18%-19%. Desta forma, é importante assinalar que a média do forward P/E ratio nesses períodos foi de 19-20, enquanto que hoje se encontra a 15,5 vezes”. A questão é que a volatilidade deixou o investidor nervoso.

O VIX voltou à sua média histórica (21 pontos). Até agora cotava abaixo de 20, o que indicava uma certa complacência. Uma forma sensata de medir a recente volatilidade é contar o número de dias em que as bolsas se movimentaram mais de 1% em qualquer direção. Nas primeiras semanas do ano, o S&P500 oscilou +/-1% em 20 dias, o que equivale a três dias por semana. Mais do que em todo o ano de 1993 e 1995. Segundo A J.P.Morgan AM, a este ritmo, este ano teria 180 dias com movimentos de +/-1%, o que representaria mais do que quando nos encontrávamos no pico da crise da Zona Euro e da crise financeira. A pergunta é: estas oscilações vão continuar? “É improvável que os mercados continuem a movimentar-se com esta magnitude e frequência. Mas com os receios acerca do crescimento global, as oscilações dos preços das commodities e as politícas monetárias radicais a nível global, é provável que 2016 continue a ser um ano instável para os investidores”.

A volatilidade parece estar a regressar a níveis mais normais. “Ficámos mal acostumados a uma volatilidade nos mercados de ações inferior a 15%, mas o normal é que se movimente no intervalo 15-20%. Inclusivamente quando se acalmarem os recentes episódios de pânico, é pouco provável que a volatilidade volte aos baixos níveis de 2013 e 2014, à medida que as taxas de juros se forem normalizando. É provável que uma situação de mercado dominada pelos bancos centrais fosse necessária, mas era sabido que a transição não seria fácil, pelo que a subida de volatilidade seria inevitável”, reconhece Scott Wolle (Invesco). Nesta conjuntura, os especialistas concordam que a questão mais importante que deve colocar o investidor é se há algo que tenha realmente mudado e se a reação do mercado foi ou não exagerada. Responder a esta pergunta e manter-se fiel aos seus ideais ajudará na sua tarefa de posicionar a carteira para enfrentar qualquer cenário.