A fiscalidade dos fundos de investimento imobiliário: Quo vadis?   

Bruna Melo
Cedida

Tem sido errante o caminho traçado pelo legislador e pelo intérprete da lei fiscal na definição do quadro fiscal aplicável ao investimento imobiliário. Neste artigo debruçar-nos-emos sobre a figura dos Fundos de Investimento Imobiliário (FII) e o modo como a legislação fiscal e a doutrina administrativa têm vindo a colocá-los (ou a afastá-los) no radar dos investidores estrangeiros.

Em jeito de nota prévia, recordamos que os FII são instituições de investimento coletivo, cujo objetivo principal é o da captação de capitais junto de investidores para os aplicar em ativos imobiliários, numa ótica de rentabilização do investimento angariado e de partilha de riscos.

Os FII são assim, em muitos casos, a válvula de escape do investidor não institucional que pretende investir no sector imobiliário mas que não tem o capital necessário para o fazer a título individual e que, na ausência deste tipo de instrumentos, provavelmente reveria a sua opção de movimentação de poupanças. De uma outra perspetiva, o investimento canalizado por este tipo de instrumentos tem vindo a dar um importante contributo à reabilitação do tecido urbanístico português, ainda que com maior enfoque nos grandes centros urbanos.

Por tudo o que vai dito, este é claramente um tipo de instrumento de que a economia portuguesa precisa e deve valorizar, seja como incentivo à poupança, seja como catalisador do investimento na regeneração dos centros urbanos.

Foquemo-nos agora na tributação dos FII. Ainda não há muito tempo, o legislador fiscal, numa jogada arrojada de busca pela competitividade fiscal e atração de investimento estrangeiro, reviu profundamente o regime de tributação dos lucros apurados por estes veículos, terminando com o modelo até então seguido de tributação “à entrada” (i.e. tributação na esfera do próprio FII) e implementando um regime de tributação “à saída” (i.e. tributação no momento da distribuição do rendimentos aos investidores nos FII). De acordo com este novo regime, estes veículos são isentos de IRC relativamente um conjunto alargado de rendimentos, dos quais se destacam os rendimentos prediais, decorrentes, por exemplo, do arrendamento de imóveis, bem como as mais-valias, designadamente as decorrentes da respetiva venda. Em contrapartida, e porque falamos de um regime de tributação “à saída”, os rendimentos obtidos pelos investidores estrangeiros (seja por distribuições de lucros por parte dos FII ou com a venda ou amortização das suas participações no respetivo capital) são tributados a uma taxa fixa de 10% (já os investidores nacionais singulares e coletivos são tributados, respetivamente, à taxa de 28% e às taxas gerais de IRC, num panorama fiscal claramente menos atrativo).

Um dos aspetos a realçar, pela negativa, relativamente à aplicação deste regime, prende-se com a possível interpretação restritiva que tem vindo a ser defendida por alguns quadrantes da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) relativamente aos rendimentos que estão objetivamente abrangidos por esta isenção, o que tem tido um efeito pouco positivo na confiança dos investidores neste enquadramento fiscal. Sem um cabal esclarecimento por parte do legislador ou do intérprete fiscal nesta matéria, este é um dos aspetos que poderá continuar a fazer esfriar a corrida ao investimento no setor imobiliário através de FII.

Nota negativa merece também a revogação da isenção de IMT aplicável à aquisição de imóveis por parte de FII, primeiro reduzida a metade em 2013, em pleno programa de ajustamento económico e financeiro e finalmente abolida em 2016. A boa notícia é que, e graças à intervenção desajustada do legislador, alguns FII têm conseguido recuperar, ainda que com recurso à via judicial, o IMT que lhes foi exigido nos últimos anos. No entanto, a partir de 2019 e na sequência da retificação legislativa então implementada, restarão aos FII as isenções de IMT disponíveis aos demais investidores, como a aplicável à aquisição de imóveis para revenda ou na sequência da realização de obras de reabilitação urbana.

Mas porque nem tudo são más notícias, temos de saudar o entendimento recentemente divulgado pela AT no sentido de reconhecer aos FII o direito a beneficiar da isenção de Imposto do Selo sobre empréstimos contraídos junto de instituições financeiras, incluindo juros e comissões cobradas, o que pode ter um impacto significativo (positivo) na respetiva atividade.

O Orçamento do Estado para 2020 não traz melhores notícias para os FII. No entanto, não obstante haver algum trabalho a fazer por parte do legislador, consideramos que, ainda assim, o regime fiscal aplicável a estes veículos deve continuar a merecer um olhar atento por parte dos investidores internacionais.