A diferença entre o que é pequeno e o que está longe

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JDRAMIRE, Flickr, Creative Commons

“A volatilidade está a voltar, mas não está verdadeiramente de volta. Parece-nos muito elevada em relação ao que experienciamos recentemente, mas, em termos históricos, não está nos níveis mais elevados. Pelo menos para já”. Assim comentou Captura_de_ecra__2019-02-14__a_s_18Paul Casson, gestor na britânica Artemis Investment Managers, num evento organizado em Londres com jornalistas europeus. O gestor não deixa de criticar a lógica (ou falta dela) dos investidores ao longo dos últimos anos, mas a ideia que passa é de tranquilidade perante o comportamento dos mercados em 2018. “Nos últimos anos os preços das ações têm subido muito, enquanto os resultados não subiram tanto. Tudo se tem tornado mais caro. É fácil encontrar uma justificação para tudo na vida, mas a verdade é que os mercados têm vindo a criar um vazio que tem que ser preenchido. Um vácuo que tem que ser ocupado.  E se por um lado vimos o mercado a preencher esse vazio, com os preços a recuar, por outro, os resultados têm estado a subir e estamos ainda no princípio da época de resultados. Não é o fim do mundo,” metaforiza. Por outro lado, acrescenta: “É possível termos recessões que não se traduzem em crises financeiras globais. Mas estas últimas são aquelas que são pouco comuns, não o contrário. Contudo, nada pode ser fantástico eternamente e eventualmente terá de mudar”.

O que está longe e o que é pequeno

Para ilustrar a sua visão do que é incerto e menos incerto, Paul Casson faz a referência a uma sitcom britânica chamada ‘Father Ted’, uma série acerca de um padre numa ilha ao largo da costa este da Irlanda. “Na série, e neste excerto em específico, vemos o padre Ted, um velho clérigo, e o padre Dougal, um jovem padre, muito entusiástico, mas bêbado e muito, muito estúpido. O padre Ted tenta explicar ao padre Dougal a diferença entre um brinquedo, uma miniatura de uma vaca em cima da mesa, e uma vaca que pastava do lado de fora da janela. Explicava que uma é efetivamente pequena, e a outra apenas parecia pequena porque estava longe”, conta o gestor em jeito de introdução. “E porque conto esta história? Exatamente porque há uma grande diferença entre as coisas que estão longe e as coisas que são pequenas. As ações que cotam a níveis muito caros, como a Netflix, por exemplo, fazem-no por uma de duas razões.  Ou porque os investidores esperam que os lucros que estão muito longe, à medida que se aproximam, fiquem mais atrativos, o que justificará as valuations, ou esses lucros são efetivamente pequenos o que se vai revelar uma terrível notícia para o preço da ação. É um fenómeno que tem feito com que a amplitude da liderança do mercado se tenha afunilado”, explica Paul Casson.

Há limites para a disrupção

O gestor realça assim a grande diferença entre uma ação growth e uma ação value. “Perante estas ações de ‘conceito’, como a Netflix, ninguém foca na quantidade de dinheiro em caixa que está a ser consumido todos os trimestres. Querem apenas saber do conceito do negócio e confiam que tudo estará bem quando o futuro chegar. Por outro lado, empresas como as do sector do tabaco ou telecomunicações, que mostram cash-flows fortes e imediatos, ninguém quer, tal como todas as outras que, aparentemente, estão a ser ultrapassadas pelas grandes empresas disruptivas. Bons e fortes cash-flows, cash-flows muito ‘próximos’, valuations muito atrativas...Ninguém quer saber. É um admirável mundo novo ... ou não!”.

Para Paul Casson a persecução dos conceitos de investimento disruptores não é o único caminho e tem os seus limites. “Como é que uma pessoa toma posse das suas compras online? Vêm pelo rooter dentro de casa? Pela internet? Ou alguém toca à campainha e entrega a encomenda em mãos? Há um limite para a quantidade de disrupção que pode acontecer, mas o mercado bifurcou completamente. Já não quer saber se uma empresa mostra cash-flows próximos e previsíveis. Está interessado, isso sim, em cash-flows que estão longe e que são, por definição, muito mais incertos”, conclui.