“Tem sido patente necessidade de dirimir cenários na actividade de gestão de fundos imobiliários”

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Maximo Garcia

Em entrevista à Funds People Portugal, o advogado da Vieira de Almeida, responsável pela área de organismos de investimento colectivo, fala ainda sobre os fundos mobiliários, o esperado impacto da nova fiscalidade na rendibilidade, e as tendências na actividade de ‘private equity’.

Como foi o ano em 2012 nos fundos de investimento?

Nos fundos mobiliários houve uma tendência expectável em função da situação conjuntural, nomeadamente em termos do tipo de fundos e de ativos; não houve quebras grandes, nem alterações significativas em termos quantitativos. Nos fundos imobiliários houve um significativo decréscimo na constituição de novos fundos. Já no que diz respeito à comercialização de fundos mobiliários estrangeiros em Portugal, área em que temos tido desde há vários anos uma participação muito activa, já que temos vindo a assessorar os líderes de mercado neste segmento, manteve-se o ritmo que temos vindo a presenciar na quantidade de novos fundos ou sub-fundos comercializados, dado que os mais importantes ‘players’ já estão no mercado português.

Disse que nos imobiliários o ano passado foi diferente. Em que aspectos?

Uma percentagem dos FII existentes em Portugal, sobretudo os fechados de subscrição particular, na sua génese, tiveram um panorama fiscal favorável e isso levou, entre outras razões, à sua constituição e à agregação de património imobiliário nesses fundos. Alterada essa legislação, o que era expectável, houve claramente uma queda, desde logo na constituição de novos FII. Como a legislação fiscal continua favorável quanto à tributação em sede de IMT e IMI nos fundos abertos e nos fechados de subscrição pública, houve algumas tentativas inicialmente do mercado para tentar ajustar, transformar alguns fundos de subscrição particular neste tipo de fundos; a CMVM aí teve um papel muito activo e travou um pouco essa tendência. Houve um aumento sim nos fundos que neste momento têm um panorama fiscal mais favorável, e também por outras razões, que são os FIIAH.

Além da constituição de fundos como evoluiu a restante actividade de assessoria?

Assistimos a uma modificação do ‘status quo’ que, em determinadas situações deu origem a um ambiente algo conturbado. Tem sido patente a necessidade de dirimir alguns cenários no âmbito da atividade de gestão de fundos de investimento imobiliário, nomeadamente no relacionamento entre as sociedades gestoras e os participantes. Porque uma coisa é uma conjuntura favorável, um enquadramento fiscal simpático, em que as entidades gestoras e os proprietários de imóveis acordavam, na estruturação de um fundo para englobar um determinado património imobiliário, mediante o pagamento de uma comissão de gestão, e as coisas funcionavam…Outra, necessariamente diversa, resulta quando as coisas começam a correr mal, uma crise global, o imobiliário em queda, financiamento parado, então deixa de haver dinheiro para as comissões de gestão, para o desenvolvimento dos projetos e, consequentemente, as relações entre os diversos intervenientes, designadamente entre as entidades gestoras e os participantes dos fundos, começam a ficar mais tensas. Em função do que foi dito, temos vindo a ter cada vez mais intervenção em matérias que até à data não abundavam, como sejam processos de substituição de sociedade gestora, de liquidação de fundos, conflitos entre participantes e as entidades gestoras, processos de reestruturação de dívidas dos fundos, insolvências, etc.

Após as recentes alterações, nomeadamente fiscais, considera que poderá assistir-se a alguma emigração nesta indústria?

Eventualmente nalguns casos admito que sim. Isso de facto poderá estar a ser considerado.  A título meramente exemplificativo, diria que um fundo de acções que já funcione há uns tempos, que tenha historicamente uma determinada rendibilidade, que não é estático... se a partir de agora as acções que vão entrar no fundo, independentemente de estarem detidas há mais de um ano, passam, em caso de alienação, a pagar imposto sobre as mais-valias mobiliárias realizadas, isso poderá ter um peso muito considerável na rendibilidade e, consequentemente, no futuro desses fundos. As gestoras têm de começar a pensar em medidas alternativas, algumas das quais poderão passar por deslocalizar esses activos e constituir uma estrutura de investimento colectivo - a opção poderá não ser necessariamente um fundo de investimento - no Luxemburgo, ou em outras jurisdições equivalentes, que têm, primeiro, um sistema fiscal mais favorável, mas, acima de tudo e muito importante, estável.

Tal terá grande impacto na vossa actividade na parte de estruturação?

Na estruturação claramente que sim. Nós também apoiamos a estruturação de veículos fora, necessariamente em conjunto com advogados das jurisdições envolvidas, temos ‘expertise’ nesse tipo de cenários. Agora, a assessoria jurídica no âmbito desta atividade é ‘ongoing’, desde logo no tratamento e resolução de temsa regulatórios, nomeadamente em casos de questões levantadas pelas autoridades de supervisão, em situações específicas de transações e nas variadas vicissitudes da vida dos fundos.

No ‘private equity’ também tem havido tendência idêntica e foco em fundos de reestruturação...

Em Portugal, durante bastante tempo, o que se chamava capital de risco não era tanto isso mas mais reestruturação. O que os fundos grandes estão agora a fazer era o capital de risco que existia, naturalmente com dimensões completamente diferentes. Obviamente que continua a haver algumas sociedades e fundos que têm uma actividade própria de capital de risco, capital semente, ‘start ups’, etc. Mas hoje assiste-se, e tem sido uma tendência, e nós também temos estado a participar nisso, à criação de fundos de capital de risco específicos para situações específicas... um empreendimento, ou negócio imobiliário, que está mal financeiramente e precisa de um apoio... então vamos pensar através do capital de risco numa forma de reestruturar, reabilitar e viabilizar determinado negócio. Em Portugal vão continuar a ser criados alguns fundos. Mas penso que a tendência para fazer fundos no Luxemburgo vai aumentar, não só pelas razões de flexibilidade e de não haver propriamente uma correspondência cá, mas porque há uma componente também de flexibilidade regulatória, de supervisão, que não é necessariamente negativa, mas que pode pesar na opção de ir para fora, além dos aspectos fiscais. Nomeadamente só pelo facto de haver lá uma abordagem com maior sensibilidade pela indústria. E mesmo para investir fora da Europa; também temos assistido ao desenvolvimento de projectos no continente africano, nomeadamente em Angola e Moçambique, estruturados mediante a utilização de um ou de vários veículos, com sede noutras jurisdições. Acredito que essa tendência vai intensificar-se.