Tapering do BCE, Brexit e China: os três riscos que o BiG identifica para o resto do ano

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Artigo de opinião de João Lampreia, head of research do BiG. 

Nos  EUA, à medida que as expectativas do Trumponomics arrefecem e a capacidade da economia norte-americana de manter o ritmo de crescimento é questionada – assistimos a  uma reversão total das expectativas reflacionárias pós-Trump – não será de excluir se alguns indicadores macroeconómicos tresladarem algum arrefecimento, o que seria consistente com o estágio do ciclo mais avançado da actual economia líder.

Adicionalmente, consideramos que o mercado ainda não incorpora totalmente o ritmo de normalização da política monetária pela Reserva Federal – este não reagiu muito ao anúncio dos detalhes sobre a redução do balanço (atualmente no valor recorde de USD 4,5 tri), sendo que o mercado desconta apenas uma nova subida da taxa refi em março de 2018 (vs. um 3º aumento em 2017 projectado pela Fed) - verificando-se assim um mismatch entre a retórica relativamente hawkish do FED e as atuais expectativas do mercado, o que acaba por exponenciar o risco de downside (se a FED não alterar a linha delineada). Continua a observar-se uma divergência relevante entre o nível de preços do mercado acionista e obrigacionista, cujo prolongamento terá um limite, isto é um eventual downside do equity ou expectável pick-up de taxas.  Pensamos que o mercado acionista norte-americano se encontra bastante complacente face à deterioração dos indicadores recentes (retracement de taxas, queda do breakeven para níveis pré-Trump, fragilidade do USD, entre outros), pelo que  estes factores acabam por justificar a nossa visão mais defensiva/neutral para os EUA.

Na Europa não acreditamos que o 2H17 inviabilize a suavização dos riscos políticos vigentes no bloco, ainda que as eleições na Alemanha (setembro) e a eventual convocação de eleições antecipadas em Itália (outubro) serão temas chave, sendo que o impacto negativo do segundo ao nível da evolução dos spreads de crédito na periferia não será surpreendente.

Moderadamente positivos na Europa

Numa perspectiva de mercados, projetamos que o processo de normalização da política monetária pelo BCE deverá tomar as delineações iniciais ainda este ano, na reunião de setembro. O ritmo e data de início do expetável tapering serão dois factores que ditarão o impacto deste evento no mercado. A nossa visão é que a redução de compras de ativos e o aumento das taxas de juro apenas ocorram em 2018 (redução do programa de compras a zero e subida da taxa de depósitos) e 2019 (subida da taxa refi) respetivamente.

A conjugação destes factores leva-nos a tomar uma posição moderadamente positiva na Europa, uma vez que o processo de retoma económica se apresenta globalmente robusto – atividade económica e ciclo de lucros empresariais - e o nível de avaliações mostra-se relativamente consistente com o estágio do ciclo vigente.

Nos mercados emergentes, focamo-nos em duas economias distintas – China e Brasil. Na China consideramos que a fuga de capitais terá um impacto negativo na moeda chinesa, o yuan, não obstante os esforços do Banco da China (até agora frutíferos) de gerir a moeda. No Brasil, a atual conjuntura política despoleta mais ‘ruído’, distraindo da evolução dos fundamentais positivos da economia Brasileira  que pensamos deverá continuar no médio prazo.

Alocação de ativos

Estamos positivos para small caps brasileiras, que estão na linha da frente para beneficiar das perspectivas económicas mais positivas do país. Tal como referido anteriormente, temos uma posição defensiva/neutral para os EUA e moderadamente positivos no bloco acionista europeu. Acreditamos que face ao nível de avaliações implícitas de mercado, estratégias ativas de stock picking serão premiadas no médio prazo (vs estratégias de investimento passivo). Do ponto de vista, dos principais riscos, identificamos em baixo:

i) Tapering BCE – ainda que a inflação se mantenha distante dos targets do BCE, a actividade económica na Europa continua a ganhar tracção, pelo que se assistirmos a uma reversão dos níveis deprimidos das commodities e/ou de um pick-up das expectativas da inflação nos EUA, o BCE terá pouco espaço/tempo para prolongar o actual plano de estímulos. Acreditamos que em Setembro deverá ser anunciado o tapering do QE Europeu, sendo que o mercado ainda não incorporou totalmente esta situação.

ii) Brexit - os potenciais cenários do acordo são diversos e reflectem o quão complexas serão as negociações nos próximos 2 anos. Assim, um derrapar do calendário de negociações é possível, assim como um impasse. Qualquer cenário, que não uma saída relativamente suave, poderá ter um impacto negativo no mercado.

iii) China - No médio prazo, consideramos o abrandamento da economia chinesa representa o principal factor de risco na esfera global.

Cautelosos

Numa perspectiva acionista, a nossa posição para o 2º semestre é mais defensiva, devido aos ganhos já conseguidos pelos mercados. O S&P 500 e Euro Stoxx 50 encontram-se a negociar atualmente a níveis superiores (EUA) ou próximos (Europa) do nosso cenário mais bullish até final do ano, o que justifica a nossa posição neutral para o mercado norte-americano e neutral/ligeiramente positiva para as ações europeias. Na Europa, poderemos assistir a uma rotação sectorial – transição de cíclicos (exportadores clássicos) para defensivos – em função da perspectiva do anúncio do tapering pelo BCE que ditará um pick-up do nível de taxas e suportará a tendência de valorização do Euro.

Ainda em relação ao eventual tapering do BCE, consideramos que se o mesmo ocorrer já em Setembro, esta situação poderá reverter a tendência de compressão vigente dos spreads de crédito periferia-bunds. Pensamos ainda assim que este efeito negativo será essencialmente temporário, pelo que continuamos estruturalmente negativos em dívida alemã, sendo que no caso de Portugal - caso a economia continue o actual desempenho acima das expectativas - poderá beneficiar de uma revisão em alta do rating para Investment Grade pela Fitch (15/DEZ.), o que deveria colocar os spreads (10 anos) PGB-Bunds entre os 150-200 p.b. até final do ano e/ou em meados de 2018.

Já nos EUA, com a reversão total das expectativas de inflação espoletadas pela eleição de Trump (Breakeven 10 Yr abaixo da média de 5 anos e diferencial face ao PCE relativamente estreito), voltamos a identificar valor relativo em instrumentos de dívida Inflation Linked (TIPS) e no mercado de Equity acreditamos no upside táctico no segmento de small caps, em detrimento do sector tecnológico que enfrenta riscos regulatórios, o qual para além do mais liderou ostensivamente o movimento altista do mercado nos primeiros seis meses do ano.