Risco a vermelho nos mercados: é possível manter a volatilidade em perspetiva?

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mikebaird, Flickr, Creative Commons

Os mercados financeiros parecem andar num verdadeiro sobressalto. Os receios sobre o crescimento global – particularmente na China – a incerteza na Grécia, e o potencial de subida das taxas de juro nos EUA são os factores que inevitavelmente estão a deixar as bolsas com os “nervos à flor da pele”.

Esta segunda-feira, dia 24 de agosto, os dados falaram por si, e foram uma extensão do negro final da semana passada. Como recordam David Stubbs, global market strategist e Alex Dryden, market analyst, da J.P. Morgan Asset Management, na semana terminada a 21 de agosto os mercados, em termos globais, caíram quase 6%, o que representou “o maior declínio semanal dos mercados em 4 anos”. Em continuação, esta segunda-feira as bolsas globais mantiveram a tendência de queda “com as ações chinesas a caírem perto de 9%, o que provocou uma forte onda de vendas noutros mercados globais”.

Será esta volatilidade tão despropositada assim?

Da entidade norte-americana acreditam que mais do que um evento em específico, foram vários os acontecimentos que provocaram esta fraqueza dos mercados. Por um lado falam da crença de muitos na desaceleração do crescimento global, que é suportada pela “queda dos preços das commodities”, mas também pelo “contínuo colapso do mercado de ações chinês”. Toda essa narrativa que rodeia o abrandamento da economia chinesa e, consequentemente dos mercados emergentes em geral, “estendeu-se aos mercados de commodities e também cambiais”, assinalam da entidade, que acreditam que esse foi o principal motivo de uma “nova onda de aversão ao risco”.

A época estival também não ajuda, e a baixa liquidez dos mercados é mais um motivo que faz ampliar o sell-off. Num tom mais irónico, lembram que por esta altura “muitas das cabeças mais experientes estão sentadas na praia em vez de estarem nos escritórios, o que pressiona ainda mais as vendas”. Também da UBS Global AM acreditam que “os constrangimentos de liquidez em condições de negociação no verão”, a par das “posições concentradas em determinados investimentos”, influenciaram fortemente a situação vivida nos mercados.

Mas como há sempre uma segunda forma de olhar para as situações e a J.P. Morgan coloca em perspetiva o que aconteceu. Entendem que embora o MSCI Europe Index tenha registado uma queda de 13% intra-anual, esta dimensão de quedas ou até superiores “não é algo incomum, de todo”. “Durante os últimos 35 anos os mercados experienciaram, em média, um declínio médio intra-anual de 16%”, indicam.

Gestoras pouco negativas em relação à China

Como já referido acima, os receios sobre a economia chinesa são dos maiores motivos para esta quebra dos mercados globais. Maria Municchi, especialista de investimentos adjunta da equipa de multia-ativos da M&G Investments diz mesmo que “grande parte da complexidade dos mercados pode resumir-se a um único tema, o que permite que as mudanças bruscas no sentimento do investidor se intensifiquem”.

Matthew Sutherland, diretor de produto asiático, da Fidelity Worldwide Investment, entende que mesmo dentro do mercado chinês há vários motivos por detrás das quedas. Em primeiro lugar falam da “evidência de desaceleração económica”, que se lê em indicadores como as vendas de automóveis ou o uso de eletricidade. “Ou já estão em território negativo, ou em positivo, mas a desacelerar-se”, clarificam sobre os recentes números referentes a esses indicadores.  Em segundo lugar apontam o programa de reformas do país que “parece estar a tropeçar em algumas áreas, entre as quais a criação de concorrência e a redução do intervencionismo”. Por último, um dos motivos mais sonantes: “a desvalorização do renminbi”. Apesar desta lista de factores, a equipa de investimentos asiática da Fidelity entende que “a China está a desacelerar mas não a parar”. Recordam que apesar das “pedras no caminho”, o programa de reformas no país mantém-se em funcionamento, e que muito provavelmente em breve acontecerá uma maior flexibilização monetária “que ajudará o país no final do ano”.

Igualmente positiva – ou pouco negativa - é também a visão da UBS Global AM. Não esquecem que “o PBoC  tem uma série de poderosas ferramentas à sua disposição para combater o abrandamento da economia”. Ao nível desses instrumentos fala da “grande escala de gastos com infraestruturas, do recurso a taxas de juro mais altas, bem como de cortes do RRR (Reserve Requirement Ratio). Contudo fazem questão de assinalar que a desvalorização da moeda, do seu ponto de vista, não entra neste rol de ferramentas, mas sim numa perspetiva de “internacionalização do yuan”, que indica uma “clara mudança da antiga abordagem cambial das autoridades”.

Recordar a palavra “oportunidade”

Por esta altura de mercado, os especialistas das gestoras internacionais recordam um conceito básico de quem investe: ter em mente o conceito de oportunidade. Da J.P. Morgan AM, por exemplo, salientam que “este sell-off está a criar oportunidades para os investidores comprarem empresas de qualidade, com perspetivas de lucros brilhantes, com avaliações mais baixas do que há algumas semanas atrás”.

Na mesma perspetiva, da UBS Global AM referem que "sendo a volatilidade o melhor amigo de alguns dos investidores", este contexto “pode providenciar oportunidades atrativas para os investidores que são ágeis o suficiente para se posicionarem de forma a beneficiarem dos movimentos dos preços dos ativos”. Da Fidelity são proferidas palavras muito semelhantes. Matthew Sutherland indica que a estratégia da casa passa por “encontrar boas empresas ao preço adequado”, e por isso, “os mercados que caem com mais frequência fazem com que isto seja mais fácil”. 

Algumas considerações sobre os ativos 

Luca Paolini, diretor de estratégia da Pictet AM, acredita que a "economia chinesa está a mostrar-se mais débil do que o esperado, gerando preocupações numa altura em que os dados económicos nos EUA e na Europa são mediocres. A isto acrescenta-se que a Reserva Federal continua no caminho de subida das taxas de juro, que acontecerão ou em setembro ou em outubro. Daí que os investidores se mostrem mais cautelosos e nervosos. Assim é difícil continuar demasiado otimista em ações, ativo ao qual reduzimos exposição nas últimas semanas". 

Continuando ao nível da alocação de ativos, o especialista considera, sobre as obrigações, que embora a expetativa de subida das taxas seja negativa, "os investidores, perante sinais de maior debilidade do crescimento global, têm estado a comprar ativos defensivos, entre os quais se encontra a dívida soberana dos EUA", o que justifica o último rally das Treasuries. No entanto, a equipa da Pictet não espera grandes quedas nas rentabilidades com vencimentos da dívida soberana a partir dos níveis atuais: "Há que ter em conta que para que se chegue à recessão global é necessário que o crescimento do PIB na China baixe até níveis de 2% a 3%, o que não é previsível. Para além disso, a situação não é tão má como em 2007, visto que, em conjunto, existe o suporte de políticas monetárias. O risco de recessão global, embora tenha aumentado, é baixo", conclui Paolini.