A agenda eleitoral europeia inicia-se no dia 23 de abril com a primeira volta das eleições presidenciais em França. Como aconteceu com os eventos políticos do ano passado, o mercado já está a tentar espelhar no preço os riscos que estão em jogo. Esta antecipação tem vindo a alimentar o ruído mediático gerado pelas campanhas de François Fillon e Emmanuel Macron, em especial pelo escândalo que envolve o primeiro. De qualquer das formas, os investidores estão cientes de que o potencial de disrupção está na candidatura de Marine Le Pen, e o medo de uma vitória inesperada na segunda volta levou ao aumento recente de 75 pontos base do risco da dívida francesa em relação à alemã (atualmente, está ligeiramente mais baixa, nos 68 pontos), levando as obrigações francesas a dez anos a ultrapassar a barreira do 1%. Este é um fato muito importante se o contextualizarmos: ao contrário dos países em seu redor, a França quase não sentiu tensão na sua dívida ao longo de toda a crise financeira.
“O manifesto eleitoral de Le Pen, publicado a 4 de fevereiro, demonstra a sua clara intenção de retirar a França do euro e de convocar um referendo relativamente à sua continuidade na União Europeia. Ainda que provavelmente Le Pen não alcance, de todo, a maioria absoluta nas eleições parlamentares de junho, o que a impossibilitaria de alcançar o seu objetivo, a sua eleição continuaria a ser um evento com grandes probabilidades de assustar os mercados”, disse Eve Tournier, responsável de crédito pan-europeu da PIMCO, e os gestores Nicola Mai e Philippe Bodereau.
A visão da empresa é de que Le Pen tem poucas possibilidades de se tornar na primeira mulher presidente de França. “Até pode ser que ganhe mais apoio na primeira volta, contudo, acreditamos que é pouco provável que ganhe na segunda volta, em que, historicamente, os eleitores se têm unido contra os candidatos da Frente Nacional”, afirma o trio de especialistas.
Posto isto, pedem aos investidores que não confiem e apostem tudo contra este cenário, e fazem-no por várias razões: “O principal rival de Le Pen, o centrista Emmanuel Macron do partido En Marche, é um participante relativamente novo no cenário político, e a estabilidade do seu apoio é questionável”, explicam numa primeira instância.
De seguida, observam que “ainda que seja provável que Le Pen perca contra Macron na segunda volta, as sondagens sugerem que será uma competição renhida contra Fillon e estará pendente perante os candidatos de esquerda Hamon ou Jean-Luc Mélenchon”. A todos estes fatores, terá que se acrescentar que “o ambiente político atual tem provado ser bastante improvável”, como demonstrou o Brexit ou a vitória de Trump.
A decisão que a PIMCO tomou foi de adotar um posicionamento conservador nos seus portefólios na Europa. “Ainda que a dívida soberana francesa e italiana já tenha corrigido, poderá perder ainda mais valor à medida que nos aproximamos das eleições francesas e com a continuidade da instabilidade política em Itália”. Adicionalmente, adotaram um posicionamento defensivo na dívida corporativa europeia, “dado que os spreads estão próximos de mínimos históricos”.
Bastien Drut, estratega e analista da Amundi, olha para outro detalhe que está a passar despercebido: “A probabilidade de vitória de Le Pen não subiu muito nos últimos dias, mas a sua desvantagem frente aos favoritos (em primeiro Fillon e em segundo Macron) reduziu para um novo mínimo”. Isto significa, de acordo com as apostas, a probabilidade de que Le Pen ganhe as eleições é de 33%, “perto da probabilidade de vitória de Trump ou do Brexit antes das eleições, de acordo com sondagens anteriores”. A probabilidade de que ganhe Macron é de 45%, por isso, “não está assim tão longe”.
Assim, Drut conclui que o recente alargamento do prémio de risco “não foi causado pela reputação da popularidade de Le Pen, mas sim pela queda forte e repentina de François Fillon”. Por outras palavras, o que quer dizer o especialista é que “os mercados exigem um prémio para compensar o risco de surpresas negativas associadas aos candidatos mais convencionais (como o surgimento de um novo escândalo antes das eleições).
A Amundi calculou três cenários principais para o comportamento do spread da dívida francesa a dez anos em relação à sua homóloga alemã, em termos de probabilidade de vitória de cada um dos candidatos principais, explicada nos gráficos abaixo.