Porque é que o big data revolucionará a indústria de gestão de ativos?

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re_birf, Flickr, Creative Commons

A teoria do mercado eficiente defende que a bolsa é um jogo limpo no qual toda a informação disponível é reflectida no preço de maneira instantânea e, por tanto, as ações estão sempre perfeitamente valorizadas. O problema é que, num mundo cada vez mais interconectado, uma notícia que se produza num extremo do planeta pode afectar direta ou indiretamente uma empresa com sede do outro lado do mundo, afectando o sentimento do investidor e a cotação de título em bolsa. A questão é que o volume de informação disponível é tão vasto que a sua gestão se torna muito difícil, mais ainda se a isso somarmos o novo fenómeno que as redes sociais representam. É aqui que entra em cena o processamento de dados em grande escala. “Contudo, não estamos ainda conscientes do que significará a big data para a indústria de gestão de ativos”, assegura Kenneth Cukier, editor no The Economist e co-autor do livro Big Data: uma revolução que transformará a forma como vivemos, trabalhamos e pensamos.

Recentemente num evento celebrado pela BNY Mellon IM, Cukier explicou que o big data se converteu numa classe de ativos, por si mesma. “No mundo atual, o acesso à informação é chave. Hoje dispomos de mais informação do que nunca... muito embora seja difícil retirar valor dela. Mas é possível. É possível, por exemplo, medir qual é o crescimento económico em que está uma determinada região ou cidade está, em tempo real, através da análise dos dados de tráfego. Isto fornece informação muito valiosa”. No entanto, construir um sistema que permita recompilar todos esses dados e torná-los manejáveis não é fácil. As entidades têm que ultrapassar alguns obstáculos. No contexto atual, talvez o mais relevante seja a impossibilidade para alocar recursos, sobretudo num contexto no qual a regulação acrescenta pressão sobre as margens. Portanto, a "elasticidade" que uma entidade dispõe parece ser um factor determinante. Cukier assegura que, por agora, o custo que acarreta preparar-se para o desafio que o big data pressupõe é alto, embora no futuro se vá reduzir.

Na hora de construir a plataforma, as gestoras podem eleger entre três caminhos: comprar uma start up, chegar a acordos com empresas especializadas ou apostar no desenvolvimento interno. Neste último grupo ponto encontra-se a Goldman Sachs AM, entidade que já  aplica esse desenvolvimento na sua gama Core (GS US Core, GS Global Core, GS Europe Core...), na qual nenhum dos fundos assume um tracking error superior a 3,5% (o do GS US Core tem como máximo 2,5%). A estratégia que segue passa por olhar para o índice de referência como um ponto de partida e, posteriormente, ir adoptando posições relativas em função de quais sejam as convicções da equipa a partir da análise fundamental. Isso é complementado, por sua vez, pela análise do sentimento e do momentum. Aqui é onde entra em jogo o big data, já que a equipa de gestão quantitativa – fundada por Bob Jones e Rob Litterman e formada por 90 profissionais – pode processar diariamente 40.000 artigos em distintos idiomas.

Uma maneira que têm de captar o sentimento do mercado é analisando os relatórios dos brokers, através de plataformas automatizadas de processamento de linguagem. Diariamente, a equipa revê centenas de relatórios de analistas de todo o mundo sobre uma determinada empresa ou conjunto de empresas. A informação extraída é armazenada numa base de dados que dá à equipa um acesso efecivo e eficiente para digerir e interpretar estes documentos em tempo real. Esta base de dados está categorizada por empresa e inclui diferentes métricas que permitem à equipa levar a cabo análises individualizadas de cada título. A partir do uso das plataformas inteligentes de processamento de linguagem, a equipa desenvolveu um modelo de análise dos relatórios, através dos quais inferem uma “pontuação de sentimento” que tem por base o tom e a linguagem empregue pelo analista. Esta pontuação, que recolhe mais informação do que a simples recomendação sobre o título, é tida em conta na hora de avaliar a empresa.

A equipa trata de melhorar a técnica para capturar o detalhe/tom do analista e assim entender a sua autêntica opinião sobre o valor. “O modelo que utilizamos não revoluciona. O que faz é evoluir a metodologia. Vai melhorando e inovando a si mesmo para aprofundar ferramentas que nos permitam melhorar ainda mais o processo de avaliação das empresas e conhecer melhor as relações globais que existem entre as diferentes empresas. O desenvolvimento dos sistemas de ‘big data’ servirão para aperfeiçoar ainda mais a nossa estratégia  neste sentido”, assinala Javier Rodríguez-Alarcón, responsável pela região EMEA da equipa Core da Goldman Sachs AM. Os resultados, por enquanto, têm apoiado uma boa parte destas estratégias. No caso da gama Core da Goldman Sachs AM, muitos fundos ostentam já  as cinco estrelas Morningstar. Além disso, a estratégia de ações large-cap/blend dos Estados Unidos ostenta já o selo de produto Consistente Funds People.

Algumas entidades chegarão antes. Outras, depois... mas a tendência é clara e cada vez são mais as gestoras que acreditam que a indústria entra numa nova era, e que creem que dispor desta nova ferramenta pode resultar numa vantagem competitiva. “O big data voltará a esculpir a indústria da gestão de ativos”, considerando que se utilizarão novas aproximações à informação disponível na “pesquisa, análise, distribuição, trading e gestão de risco”, afirmam da BNY Mellon IM. Os especialistas da entidade acreditam que as novas ferramentas permitirão analisar com mais detalhe tanto as componentes fundamentais das empresas como as diferenças temáticas. Também consideram que um processamento mais rápido e eficiente incrementará a dificuldade que os gestores enfrentam na geração de alpha. O que é evidente é que o mundo de amanhã será muito diferente do atual, e que a indústria de gestão de ativos também terá que se adaptar à mudança e aperfeiçoar as suas metodologias.