O novo regime fiscal da emissão do Papel Comercial e sua equiparação ao regime dos Títulos de Dívida

Manuela_Silva_Marques
Nuno Coimbra

Inserida no âmbito das medidas legislativas destinadas a potenciar o recurso ao mercado de capitais e captação de financiamento junto de novos investidores, a Lei n.º 83/2013, de 9 de Dezembro, veio proceder à alteração do actual Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Dívida.

Este Regime Especial estabelece uma isenção de tributação em sede de IRS e de IRC relativamente aos rendimentos da dívida pública e não pública transaccionável, incluindo as obrigações convertíveis em acções. Dispensando tais rendimentos de retenção na fonte, a isenção abrange os ganhos obtidos em território português, quer no momento do vencimento do cupão ou na realização de operações de reporte, mútuos ou equivalentes (rendimentos de capitais), quer na transmissão dos valores mobiliários (rendimentos qualificados como mais-valias).

A recente alteração legislativa, em simultâneo com a revisão e sistematização do referido regime, veio alargar o seu âmbito de aplicação no sentido de abranger não só os valores mobiliários representativos de dívida mas também os valores mobiliários de natureza monetária, designadamente Bilhetes do Tesouro e Papel Comercial.

Esta medida de equiparação de regimes tem como intenção facilitar a expansão da utilização dos títulos representativos de dívida de curto prazo, vulgarmente denominados «Papel Comercial», cujos rendimentos passarão igualmente a poder beneficiar de isenção de IRS ou IRC.
Para o efeito, impõe a lei que todos os valores mobiliários transaccionados estejam integrados em sistema centralizado gerido (i) por entidade residente em território nacional, (ii) por entidade gestora de sistema de liquidação internacional estabelecida em outro Estado membro da União Europeia ou, ainda, de Estado membro do Espaço Económico Europeu desde que, neste último caso, este esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia.

Em matéria de procedimentos, com o objectivo de simplificar o acesso a este regime fiscal e simultaneamente salvaguardar o benefício indevido da isenção de imposto, sujeitaram-se a alterações alguns aspectos do funcionamento do sistema. Assim:

1. No que respeita, em particular, às regras de reembolso do imposto retido indevidamente na fonte na data do vencimento do cupão ou do reembolso, o beneficiário da isenção de IRS ou IRC (que assim não tenha sido enquadrado, por erro ou insuficiência de informação, e tenha sido objecto de retenção na fonte) pode apresentar um pedido de quick refund junto da entidade registadora directa, no prazo de seis meses (a contar da data em que foi efectuada a retenção indevida), ou junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, no prazo de dois anos (a contar do termo do ano em que foi efectuada a retenção).

2. Quanto aos mecanismos específicos de comprovação dos pressupostos da isenção fiscal ou dispensa de retenção na fonte foram objecto de revisão:

(i) os procedimentos de prova da qualidade de não residente - feita uma única vez e dispensada a sua renovação periódica, devendo, no entanto, o beneficiário efectivo informar imediatamente a entidade registadora das alterações verificadas nos pressupostos da isenção  (o mesmo se aplicando no caso dos organismos de investimento colectivo);

(ii) os deveres das entidades emitentes a cumprir perante a Autoridade Tributária e Aduaneira e as responsabilidades da entidade gestora de sistema de liquidação perante a entidade registadora directa - nomeadamente quando os valores mobiliários sejam transaccionados e registados em sistema de liquidação internacional, deve ser transmitida pela primeira entidade à segunda, relativamente ao universo das contas sob a sua gestão, em cada data de vencimento dos rendimentos: a identificação e quantidade dos valores mobiliários, bem como o montante dos rendimentos e, quando aplicável, o montante do imposto retido, desagregado pelas diferentes categorias de beneficiários;

(iii) os procedimentos de identificação dos beneficiários efectivos abrangidos pela isenção.

3.    Quanto à produção de efeitos, o novo regime fiscal introduzido pela Lei n.º 83/2013 aplicar-se-á aos valores mobiliários emitidos a partir de 1 de Janeiro de 2014 e aos valores mobiliários emitidos até 31 de Dezembro de 2013 apenas aos rendimentos obtidos posteriormente à data do primeiro vencimento que ocorra após 31 de Dezembro de 2013.

Em suma, em termos de resultados das alterações ora consagradas, espera-se que as mesmas alcancem o seu propósito vindo estimular o recurso à emissão de Papel Comercial, como fonte alternativa e eficiente de financiamento, e demonstrar que um regime fiscal mais favorável pode, de facto, ser um factor potenciador da atracção de investidores e contribuir para a dinamização do mercado de capitais nacional.