Não faz sentido tentar prever dados ou eventos macro

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Matt Cornock, Flickr, Creative Commons

Muitas vezes, os gestores de fundos tendem a ficar obcecados com a tentativa de prever a evolução económica e, mais concretamente, o PIB. Realizam análises exaustivas para tentar determinar qual será o dado de crescimento do próximo trimestre. O problema é que tanto esforço poderá não ser produtivo no que diz respeito a investimentos. “O crescimento económico não se reflete nos rendimentos de ações. Pode-se prever o PIB, mas ao mesmo tempo as bolsas oferecerem rentabilidades bastante negativas. O PIB não é um bom indicador do comportamento dos mercados”, afirma Ian Ormiston, gestor de ações europeias na Old Mutual Global Investors, na conferência realizada pela instituição em Oxford, Reino Unido.

Da organização mostram-se convencidos que uma das razões que explica o facto de muitos gestores não serem capazes de bater os índices de referência, relativamente àqueles que comparam os seus produtos, está na insistência destes profissionais em tentar prever eventos ou dados macroeconómicos. Fazê-lo é uma tarefa inútil e muito difícil. Na Old Mutual Investors esta é uma convicção generalizada. Para além de Ormiston, esta teoria é também defendida por Ian Heslop, co-gestor do fundo Old Mutual Global Equity Absolute Return, um fundo com selos Favorito dos Analistas e Blockbuster Funds People. “Ainda que se acerte na previsão, falta uma segunda parte: descobrir de que forma vai o mercado reagir”, destaca.

Na sua opinião, as lições dos últimos anos devem servir como uma importante chamada de atenção para aqueles que se dedicam a tentar antecipar o futuro e a posicionar-se para ganhar vantagem a partir da sua previsão, tendo em conta que os mercados, muitas das vezes, reagem de forma imprevisível. Pode dar-se o paradoxo de dois factos similares serem interpretados de forma bastante diferente pelos investidores. Observámos esta situação com o BCE. Em 2015, durante os 30 dias que sucederam aos estímulos anunciados a 22 de janeiro por Mario Draghi, o EuroStoxx 50 reagiu com uma subida de 5%. Contudo, a 10 de março de 2016 o presidente da autoridade monetária anunciou mais estímulos monetários e, durante os 30 dias que se seguiram, o índice pan-europeu caiu 2%.

Por outras palavras: o gestor que em março de 2016 conseguiu antecipar o novo programa de compra de ativos do BCE e pensou que a reação dos mercados seria idêntica à de 2015, acabou por estar errado. Vimos outro exemplo bastante claro com o comportamento registado pelo mercado depois da forte depreciação do renminbi. Em agosto de 2015, a moeda chinesa depreciou em 3%, o que foi recebido durante o mês seguinte pelo MSCI World com uma queda de 7%. Em maio a queda do yuan foi de 2% e, apesar disso, o índice global de ações não registou nenhuma variação. E o que dizer do que se passou em 2016 com a vitória, contra todos os prognósticos, do Brexit ou da vitória de Donald Trump nas eleições dos Estados Unidos?

“Reconheçamos. Quase ninguém antecipou que os partidos que apoiavam a saída da União Europeia iriam vencer o referendo. E, mesmo assim, venceram. Mas isso não significa que os que conseguiram acertar na sua previsão tenham acertado corretamente no seu posicionamento”, afirma Heslop. Recordemos: antes do referendo, muitos dos clientes mostravam-se preocupados pela exposição à bolsa britânica e, paradoxalmente, acabou por ser o mercado com melhor comportamento. E não foi só isso. Durante os sete dias posteriores a 15 de junho, o FTSE 100 subiu 5% na expectativa de que, tal como previam as sondagens, se impusesse a opção da permanência. A partir de 23 de junho, conhecido o resultado do referendo, o FTSE 100, longe de ser corrigido, subiu mais 3% durante os sete dias seguintes. Os problemas também afetaram os gestores de obrigações.

Tal como explica David Simner, gestor do fundo Fidelity Euro Short Term (produto detentor de selo Blockbuster Funds People), “um gestor que tivesse conhecido antecipadamente o resultado do referendo teria posicionado a sua carteira de forma defensiva, dando prioridade à dívida pública relativamente aos ativos de risco, como é lógico. Quem o tivesse feito seria considerado um herói nos dois dias posteriores à vitória do referendo, mas, a meio da semana estaria a registar um comportamento pior que o do mercado. Isto é algo notável, que demonstra até que ponto os mercados se tornaram imprevisíveis. O cenário é tão complexo que, ainda que existisse a capacidade para saber de antemão aquilo que se vai passar a nível político ou económico, poderiam ser tomadas decisões tremendamente erradas”.

E relativamente ao caso mais recente, das eleições dos Estados Unidos? Algumas entidades chegaram a prever quedas superiores a 10% no caso de vitória do candidato republicano, uma possibilidade que, segundo as sondagens, tinha probabilidades bastante baixas, de apenas 10%. E, apesar disso, desde 8 de novembro, o S&P 500 aumentou mais 10%. “Prever os eventos macro é não só muito difícil, mas também contraproducente. O que funciona hoje, amanhã poderá não funcionar. Se se quiser criar uma carteira consistente ao longo do tempo, é necessário criá-la de forma a que seja diversificada por estilos de investimento. Se se apostar numa carteira value, poderá obter-se bons resultados em alguns períodos, quando esse estilo está na moda, e maus noutras alturas. O mesmo sucede com o momentum, growth, baixa volatilidade… O que funciona hoje, poderá não funcionar amanhã, pelo que é necessário ir adaptando a carteira e não estagnar”, destaca Heslop.