Gestores nacionais leem nas entrelinhas do discurso de Janet Yellen

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International Monetary Fund, Flickr, Creative Commons

Recentemente nomeada como Presidente da Reserva Federal, Janet Yellen teve na semana passada as suas duas primeiras provas de fogo. Discursou no dia 11 de fevereiro perante o Congresso onde defendeu a continuidade da política de estímulos à economia norte-americana e onde disse esperar também a continuidade na abordagem à política monetária. No dia 13 foi a vez da nova presidente enfrentar o Comité Bancário do Senado. Mas que interpretações se podem fazer dos primeiros discursos oficiais da líder da Fed? Que mensagens subliminares estão implícitas?

Eis a opinião de alguns profissionais portugueses:

Filipa Teixeira, Head of Research da Patris Gestão de Activos, começa por explicar que “relativamente ao declínio na taxa de participação da força laboral, Yellen admitiu que uma parte significativa seria estrutural, contudo assumiu também a influência de importantes factores cíclicos, particularmente entre os trabalhadores jovens”. Desta forma, existe a “convicção da necessidade de continuar a estimular agressivamente a procura, por forma a fomentar o regresso de trabalhadores desencorajados à força laboral e transformar empregos part-time em postos a tempo inteiro”. No que diz respeito ao campo económico, a especialista afirma que Yellen “acentuou os potenciais benefícios de uma política de controlo óptimo, o que vincularia o Fed a manter as taxas de juro perto do zero até a folga económica ser absorvida”.

Para Filipa Teixeira “as condições económicas necessárias para se dar início a uma política de subida das taxas de juro teriam que passar por uma concretização da taxa de desemprego abaixo de determinado nível”. Como expectativa inicial para este mandato, Yellen “parece ter optado por uma linguagem mais qualitativa do que quantitativa, permitindo assim bastante margem ao nível de política”. Num discurso curto, para Filipa Teixeira, Janet Yellen “não acrescentou muito de novo apontando antes para uma continuidade relativamente às políticas do seu antecessor, Ben Bernanke”.A profissional da Patris lembrou ainda que “a recente volatilidade nos mercados financeiros globais não seria um risco substancial ao outlook económico dos EUA, assegurando contudo uma monitorização contínua por parte do Fed”. Filipa Teixeira acrescenta também que “o mandato parece portanto estar focado em ajudar a economia a recuperar o emprego em pleno, bem como um nível de inflação em torno dos 2% assegurando, em paralelo, que esta não fique persistentemente muito acima nem abaixo deste objectivo”.

José Barroso, Gestor de Activos, da Popular Gestão de Activos, começa por dizer que se denota uma “continuidade nas linhas directoras da política monetária da Reserva Federal”, já que “a entidade mantém em cima da mesa, como condição para as futuras reduções do QE3, a evolução das melhorias no mercado de trabalho norte-americano, bem como a sua consistência”.

Luís Carvalho, Diretor da Gestão de Activos da CA Gest, indica que o discurso da nova presidente perante o Senado “mereceu atenção acrescida, primeiro por se tratar do seu primeiro discurso enquanto governadora e segundo por acontecer numa altura em que alguns dados macro nos Estados Unidos colocam em questão o ritmo da recuperação económica”. Assim, Yellen “mostrou-se confiante e assertiva, em alguns momentos utilizou uma linguagem menos técnica que os seus antecessores, o que lhe valeu o elogio de alguns senadores”. Para o profissional da CA Gest, a nova líder da Fed “não desiludiu o mercado que poderia estar à espera de alguma gaffe que pudesse minar a confiança na nova governadora. Deixou claro que irá prosseguir uma política de continuidade em relação a Ben Bernanke”. Nesta política de seguimento Luís Carvalho refere que “a nova governadora mantém-se comprometida com o mandato da FED em procurar a estabilidade de preços e o maximum employment e para isso prevê manter as taxas de juros a níveis próximos de zero muito para além do objectivo de 6,5% definido para a taxa de desemprego se a inflação se mantiver abaixo do objectivo de 2%”. Outra das características denotadas pelo especialista foi o distanciamento de Janet Yellen de um certo entusiasmo compartilhado por algumas pessoas perante a taxa de desemprego. A presidente da Fed “mostrou-se preocupada com o elevado número de trabalhadores em part-time (cerca de 5% da força de trabalho); com o número persistente de desempregados de longa duração e; com a dificuldade dos salários acompanharem o aumento de produtividade”.

Já no que diz respeito ao abrandamento do ritmo de compras de activos por parte da Fed, o especialista entende que “a Sra. Yellen manteve-se fiel ao plano iniciado pelo antecessor, não se mostrando preocupada com os dados mais recentes (em especial os do emprego) por achar que poderão ter sido motivados pelas condições climatéricas adversas”. A líder da Fed revelou ainda que “que a FED só estaria disposta a alterar o plano de redução de estímulos se se desse uma alteração significativa no Outlook”. Por outro lado, o especialista lembra que “quando questionada sobre o que a faria voltar a aumentar os estímulos, a resposta foi que apenas uma deterioração significativa do outlook poderia fazer. Deixou claro que entre alteração significativa e deterioração significativa existe um gap muito grande”. Em suma, “foi um discurso que procurou aumentar a credibilidade da FED e revelou que a nova governadora é uma dovish dadas as suas preocupações com a criação de novos postos de trabalho e com a redução do desemprego”, diz.

Rui Bárbara, Gestor de Activos do Banco Carregosa, acredita que o que Yellen tentou fazer foi “um equilíbrio”“Se por um lado disse que a economia norte-americana ainda está longe de estar normalizada, sobretudo no plano do emprego,  por outro lado, garantiu que o plano de retirada de estímulos não vai abrandar”. Para o especialista do Banco Carregosa a “mulher forte” da Fed deixou claro que as taxas de juro “ainda vão continuar baixas por mais algum tempo, já que a inflação não é uma ameaça – o perigo pode vir, ao contrário, da deflação – mas que só perante acontecimentos bem mais graves poderá rever a política de diminuição do chamado “quantitative easing”.