Crónica de uma morte anunciada

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algo, Flickr, Creative Commons

Os piores resultados da história do Banco Espírito Santo foram anunciados na semana passada. Um prejuízo de 3,57 mil milhões de euros precipitou medidas extremas, e a solução encontrada para recapitalizar o Banco acabou por ser anunciada ontem, pela voz de Carlos Costa, governador do Banco de Portugal.

Mais ainda antes do anúncio, já vozes internacionais enunciavam o desmantelamento do banco como o melhor a fazer. A dar conta desta “morte anunciada”, a Bloomberg escreveu um artigo intitulado de “Portugal deve deixar cair o grupo Espírito Santo”. No texto pode ler-se: “Portugal deve supervisionar um rigoroso desmantelamento do grupo. Até que os governos mostrem ao sector bancário que o mundo financeiro sofre as consequências das suas falhas, os bancos vão continuar a fazer malabarismos com o dinheiro”, pode ler-se.

Novo Banco

Carlos Costa, por volta das 22h45 anunciou ontem qual afinal o “destino” deste caso intricado. “O conselho de administração do Banco de Portugal deliberou hoje aplicar ao BES uma medida de resolução. A atividade e o património serão transferidos para um banco novo, designado “Novo Banco”, devidamente capitalizado e expurgado de activos problemáticos”, começou por dizer o líder do regulador.

Enfatizando o agravar da situação do BES durante os últimos dias, tendo deixado de “cumprir requisitos ao nível dos rácios de capital”, Carlos Costa referiu que se começou a “assistir a uma situação de sério risco”. “Tendo em conta a relevância do BES e o efeito de contágio para o sistema financeiro português, o Banco de Portugal viu-se obrigado a tomar uma decisão”, sublinhou.

Desta forma, para o “Novo Banco” serão transferidos os ativos e os passivos “saudáveis” da instituição, bem como “os colaboradores e os recursos materiais”. Esta nova entidade será resgatada pelo Fundo de Resolução - uma entidade criada em 2012 financiada pelos bancos portugueses e pelas receitas da contribuição especial que o sector paga ao Estado.

Como o “Novo Banco” irá necessitar de uma injecção de capital que ronda os a 4,9 mil milhões de euros, e do Fundo de Resolução apenas fazem parte 182 milhões de euros, “o Fundo terá de contrair um empréstimo temporário junto do Estado, vindo da linha de recapitalização anteriormente criada pela Troika”.

O “Novo Banco”, que terá um rácio Core Tier I de 8,5% a nível consolidado, será posteriormente vendido através de uma oferta pública inicial na bolsa portuguesa. Já em relação à administração do “Novo Banco” os atuais administradores permanecem – Vítor Bento e João Moreira Rato – porque, segundo Carlos Costa, “permitem garantir uma instituição de referência, recuperando a confiança dos investidores”. Salienta-se, também, que ainda na noite passada as mudanças se tornaram visíveis na antiga página web do BES onde surgia a atual designação de "Novo Banco" e Vitor Bento emitia um comunicado onde se assumia como o novo presidente executivo da entidade deixando, definitivamente, para trás o nome Espírito Santo. 

“Bad Bank”

A outra metade do banco, que se pode denominar de bad bank por conter os ativos tóxicos e prejudiciais, passará a pertencer aos accionistas do BES, tal como aos detentores de obrigações subordinadas. O Banco Espírito Santo de Angola, poderá também estar incluído neste “banco mau”.

Reforço de confiança

Durante a conferência de imprensa levada a cabo ontem, Carlos Costa fez ainda questão de deixar uma mensagem de serenidade. “Para os depositantes e clientes de crédito, o “Novo Banco” está capitalizado e é merecedor de confiança”. Em comunicado, o Banco de Portugal sublinhou ainda que a "medida de resolução não tem implicações para os clientes destas entidades: clientes do BESI, BEST, Banco Espírito Santo dos Açores, ESAF, BES Vida e várias sucursais, incluindo Espanha, Macau, Nova Iorque e Londres". 

Contudo... muito água ainda vai rolar

Apesar do exposto, está claro para muitos que fica tanto por definir... Muito embora, esta possa ter sido a "melhor e talvez a única solução para o BES", conforme sublinha Gonçalo Pereira Coutinho, CEO do Grupo Patris, ficam algumas perguntas sem respostam entre as quais: que ativos transitam e com base em que critérios? Fica o "bad bank" sob ação judicial? Ou quem garante a sua liquidez por forma a assegurar uma gestão adequada? Os proceeds revertem a favor de quem? E ainda, que dizer da reputação e credibilidade do Governador do Banco de Portugal que garantiu que o banco estava protegido e havia investidores? Repare-se que, acrescenta Gonçalo Pereira Coutinho, "se a actuação do BdP tivesse sido mais eficiente ou actuado mais cedo será que seria necessário uma solução tão radical e as perdas não teriam sido menores para o BES e para muitos investidores?, lança a pergunta".