Cinco afirmações que se podem discutir com um gestor

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Rodaniel, Flickr, Creative Commons

Nas conversas que os investidores mantêm com os gestores ou nas apresentações que estes fazem aos seus clientes, por vezes escutam-se algumas afirmações por parte dos responsáveis de estratégia que, pelo menos, são discutíveis, e que convém aclarar. No seguinte texto mostram-se cinco frases que podem ser discutidas com um gestor.

Afirmação # 1: “A minha carteira de retorno absoluto não tem enviesamentos de nenhum tipo”.  “Pessoalmente, suspeitaria de alguém que me diga que todos os cenários económicos estão cobertos. É impossível fazer cobertura de risco de todos os cenários. Isso implicaria que, sem assumir riscos, se conseguiria gerar um retorno positivo. Todos os gestores têm algum tipo de enviesamento na sua carteira. O importante é estar consciente de quais são esses enviesamentos para saber como reagir, ou que tipo de comportamento se deve esperar do produto em determinados cenários. Quando o investidor perguntar ao gestor como se comportaria o fundo num cenário económico ‘x’ e a carteira reage da forma esperada, é um bom sinal, já que demonstra que está consciente de qual é a direccionalidade e sensibilidade da sua carteira”, reconhece Andrés Sánchez Balcázer, gestor do Pictet Absolute Return Fixed Income.

Afirmação # 2: “Nunca tive a experiência de passar por um default”. É um comentário muito habitual dos gestores de high yield perante o interesse dos investidores, de forma a conhecer qual é o historial de defaults em que incorreu o gestor. O que o gestor afirma até pode estar certo. A chave neste caso está em saber o que entende o gestor por default. Tecnicamente, cair em default significa que o emissor de obrigações deixa de pagar e, por isso, o obrigacionista inicia um processo judicial para recuperar o seu capital. Mas, se uma empresa declara que não irá cumprir com as suas obrigações e o gestor vende a obrigações a desconto, por exemplo, de 80%...considera-se isto como um default? Esta é uma boa pergunta que se deve fazer ao gestor para saber qual é a sua história, afirma Bernard Lalière, gestor de high yield da Degroof Petercam AM.

Afirmação # 3: Tentar convencer que se ‘recolheu’ 100% da subida de uma empresa que está em carteira e cujo comportamento tem sido extraordinário. É frequente que os gestores mostrem casos de empresas que tiveram êxito, como garantia da sua habilidade e, que inclusive, façam questão de ter este tipo valores no top 10 da carteira. Na realidade, esta situação é garantia de muito pouco. Em primeiro lugar, é importante conhecer a data em que se comprou o título e, mesmo assim, essa seria uma informação muito incompleta (manteve-se sempre investido na empresa? como tem vindo a operar?...). “É curioso que em toda a minha carreira a minha melhor ideia foi a Inditex... e foi também a pior. Sou acionista do grupo têxtil desde há 15 anos. Nunca perdi dinheiro com o título, mas vendi uma pequena parte e recomprei sempre a um preço mais elevado. Acredito que nunca recomprei a Inditex a um preço mais baixo do que o nível anterior”, afirma Firmino Morgado, da W4i Investment Funds.

Afirmação # 4: “O value é o estilo de investimento que melhor funciona a longo prazo”. É uma afirmação clássica dos gestores que afirmam procurar empresas que negoceiem a pelo menos 33% abaixo do seu valor intrínseco. É também uma afirmação muito discutível. Depende do momento em que o estudo está a ser feito. O período que se considera para fazer a análise é determinante, sendo também imprescindível perceber face ao que é que se está a comparar. Isto apesar da comparação face ao estilo growth, na última década, a situação não ter  sido bem assim. Nos últimos 10 anos o retorno anualizado gerado pelo MSCI Europe Growth tem sido de 4%, face ao de -1,8% do MSCI Europe Value. São quase seis pontos de diferença. Nos EUA o índice growth acumula na última década uma revalorização anualizada de 9,3%, face aos 6,1% do índice value, retirando-lhe assim 3,2 pontos.

Afirmação # 5: “Embora o gestor tenha saído, na realidade nada muda”.  A figura do gestor é um dos elementos mais importantes na hora de valorizar um fundo. Na realidade, é muito provável que os novos responsáveis da estratégia tenham a firme intenção de manter a filosofia, a estratégia e o processo do seu antecessor, embora isto seja algo que não deve ser ‘despachado’ com muita ligeireza, já que os resultados futuros poderão não ser tão bons como até então.