Cenários sobre o eventual ‘divórcio’ grego e explicações sobre esta crise duradoura

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A situação grega agravou-se nos últimos dias. Resumidamente as negociações foram em vão, e o drama grego intensificou-se mais do que nunca. Sem consenso nas negociações, o primeiro ministro grego entregou a palavra aos cidadãos, de forma a que votem, no próximo dia 5 de julho, a oferta feita pelos credores. Mais do que este objetivo, da UBS Global AM vão diretos ao assunto. Joshua MacCallum e Gianluca Moretti, economistas da entidade, entendem que o que está em jogo é muito simples: “Este é claramente um referendo sobre se a Grécia continua a ser membro da Zona Euro”, inferem.

Com a corrida aos multibancos para levantar dinheiro, o governo anunciou o encerramento das instituições bancárias durante toda a semana. Da J.P. Morgan AM, pontualizam que o país helénico entrou claramente numa fase de “escuridão” e indefinição. “A Grécia vai muito provavelmente entrar em incumprimento com o FMI esta terça-feira, assistindo ao fracasso tanto do programa de resgate, como da oferta feita pelos credores. Depois disso, o país e a Zona Euro vão verdadeiramente saltar para o desconhecido”, assinalam da gestora. O controlo de capitais que está a ser feito pelo governo grego é, no entender da UBS, uma espécie de "pau de dois bicos", porque “pode impedir que os bancos colapsem antes do referendo, mas, ao mesmo tempo, vai conduzir a economia a um colapso ainda maior”.

Ambas as gestoras internacionais acreditam que a saída do Grécia do Euro é um cenário não tão provável como à primeira vista possa eventualmente parecer. “Um incumprimento ao FMI não é garantia de um ‘Grexit’; se o povo grego votar a favor de um acordo no dia 5, achamos provável que a Grécia continue no euro. No entanto, a probabilidade de saída da moeda única é agora maior do que antes”, dizem os especialistas da J.P. Morgan AM. Na opinião da UBS só agora os gregos estão a “provar” o gosto que pode ter uma saída da Zona Euro. “O controlo de capitais  dá ao eleitorado o “sabor” da miséria que se pode seguir a uma saída da Grécia da Zona Euro”, indicam, referindo que esta experiência, conjuntamente com algumas sondagens, “sugerem que o resultado do referendo é mais provável que seja um “sim”.

Lidar com o eventual "divórcio"

A J.P. Morgan AM prevê algumas implicações da situação nos mercados financeiros. “Os movimentos de mercado durante esta semana serão provavelmente marcados pelo contágio e pela aversão ao risco”, indicam. Entendem também que “um euro mais fraco, yields das obrigações períféricas mais altas e ações de mercados periféricos em níveis mais baixos, provavelmente serão compensados pelo fortalecimento de classes de ativos tidas como seguras, como é o caso das bund alemãs, das Gilts inglesas, etc”. Também da entidade, Manuel Arroyo, diretor de Análise e Estratégia, pronuncia-se sobre a alocação e ativos, e clarifica que durante as últimas semanas têm vindo “a reduzir o risco nas carteiras de obrigações à exposição a dívida periférica”, onde ainda estão neutrais. Nas carteiras de ações, por seu lado, não mantêm exposição a Grécia. Para o especialista o mais importante é “entender o que se passa com o referendo e perceber como é que reagem os distintos organismos (FMI, BCE e a Comissão Europeia”. 

Da Pioneer Investments, o CIO da entidade, Giordano Lombardo, acredita que não existem ainda razões para pânico. “A Zona Euro está muito melhor preparada do que há quatro anos atrás para um evento desta magnitude, com a exposição direta aos ativos gregos a ser relativamente baixa em termos internacionais”. Para além disso, o profissional prevê que “as instituições europeias – o BCE em primeiro lugar – vai suavizar, tanto quanto possível, a excessiva volatilidade”.  

Num quadro mais geral sobre as repercussões financeiras, a UBS Global AM inferem que “se a Grécia deixar a Zona Euro, mais uma vez vai assistir-se a uma grande quantidade de vendedores de obrigações soberanas, mas apenas dos mais corajosos. O BCE poderá ser um desses vendedores mais destemidos”.

Resumo do que aconteceu

Voltando aos primórdios do que aconteceu com a Grécia, a Fidelity Worldwide Investment propôs-se a resumir a situação grega com recurso a quatro gráficos. Para além do vencimento do empréstimo de 1.600 milhões de euros ao FMI, e da devolução da primeira metade dos 7.200 milhões de euros ao BCE no dia 20 de julho, são mais os compromissos gregos por cumprir, como demonstra o gráfico abaixo. Nos próximos meses os gregos deverão satisfazer o FMI, o BCE e o BEI (Banco Europeu de Investimento), os seus obrigacionistas, os governos da Zona Euro que lhes emprestaram dinheiro, os investidores privados e o mecanismo de estabilidade financeira europeia (EFSF).

“Teria que se chegar rapidamente a um acordo por estar próximo o fim do programa de resgate e há o risco dos bancos gregos perderem o financiamento do BCE”, indica neste contexto Dierk Brandenburg, analista de dívida soberana da Fidelity. O seu ponto de vista é de que a posição em dívida governamental é segura porque representa apenas uma pequena parte da estrutura de capital grega, ao contrário do grande sector da dívida oficial que foi restruturada”. Isso significa que, depois da absolvição de 2012, as obrigações seguintes foram emitidas com contratos estritos regidos pela lei internacional e com cláusulas de ação colectiva para evitar a aceleração do pagamento ou a redenominação, salvo nos casos em que haja o interesse dos obrigacionistas. “Além de um pequeno pagamento em julho, o seguinte pagamento de cupão está previsto para 2016. Especialmente depois de uma saída da Zona Euro, o governo grego teria incentivos para manter estas obrigações e assegurar o acesso ao financiamento externo”, conclui Brandenburg.

Não estamos em 2012

Caso as negociações fracassem, a postura da gestora é de que, ao contrário do desastre de 2012 (duas eleições gerais, um segundo resgate e um perdão de dívida), neste caso hipotético “a Zona Euro estará em posição de mitigar o contágio a outros mercados financeiros através dos mecanismos de financiamento e do QE do BCE”. A diferença neste contexto é que não será possível “livrarem-se do precedente aberto por um Grexit para outros membros da Zona Euro, se as suas economias sofrerem outra recessão severa”. Para além disso, da gestora acreditam que serão necessários mais passos em direção a uma maior coordenação política e fiscal na Zona Euro.

Num olhar pelos mercados de obrigações também se denotam diferenças relativamente à crise da dívida soberana de 2011: por esta altura, o aumento das taxas das obrigações periféricas tem sido modesto, por três razões: o apoio do QE do BCE, a melhoria generalizada na Zona Euro do contexto macro e da posição fiscal dos países membro, e o facto de tanto o BCE como os países europeus estarem melhor preparados nesta ocasião para o evento ‘Grexit’ do que nas crises prévias.

      Pode observar-se a mesma dinâmica nos movimentos das ações: agora a reação não tem sido tão violenta como em 2012. “É improvável que os mercados globais de ações sejam afectados fundamentalmente pelo comportamento grego, mas no muito curto prazo pode assistir-se a volatilidade que tem por base o sentimento”, indicam da gestora. Para além disso, os especialista sublinham que atualmente a Grécia representa menos de 1,5% do PIB da Zona Euro, e o seu mercado bolsista é ainda mais pequeno em comparação com os índices europeus e globais, como se pode observar neste gráfico.

Paras Anand, responsável de ações europeias, concorda que “o risco de contágio económico na Zona Euro pode ser mitigado não só pela escassa participação em dívida grega de investimentos que não sejam instituições, mas também pela reconstrução do capital do sector financeiro na região. O especialista indica que, no caso de acordo, “é necessário considerar a provável longevidade do Syriza, inclusive se for alcançado um acordo aceitável. As divisões dentro do partido podem crescer e os eleitores aprenderão que não há soluções económicas rápidas”.

Mas também não é uma situação comparável à do Chipre

O objetivo será manter a Grécia na Zona Euro se não pagar. Ao contrário do Chipre, pode não funcionar. A Grécia é uma entidade económica muito maior, com fronteiras terrestres e um sistema financeira mais poroso. Portanto, é provável que uma crise de dívida se converta numa crise de taxa de câmbio que poderia ter sido evitada”, reflete Dominic Rossi, diretor de investimentos globais de ações.