A interpretação que fazem as gestoras internacionais da última mensagem da Fed

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United States Government Work, Flickr, Creative Commons

O último discurso da Reserva Federal dos Estados deixou a porta aberta para uma possível subida das taxas de juro antes do final do ano. A autoridade monetária considera agora que “os riscos a curto prazo para a economia norte-americana têm diminuído", que “o mercado de trabalho se tem estado a fortalecer” e que a atividade económica “se está a expandir a um ritmo moderado”, o que tem sido interpretado por parte das gestoras internacionais como uma maior predisposição da Fed para endurecer a sua política monetária. Pelo menos é isso que acredita Rick Rieder, diretor de investimentos de obrigações na BlackRock e co-gestor do fundo BlackRock Fixed Income Global Opportunities (FIGO), que assegura que se trata de uma declaração “ligeiramente menos acomodatícia e que continua a conseguir um equilíbrio entre a sua atitude e a expectativa, e as maiores probabilidades de que aconteça uma subida de taxas antes do final do ano”.

No entanto, na opinião do especialista, a utilidade de taxas de juro em níveis extraordinariamente baixos  há muito que não consegue estimular o crescimento da economia real e, desde há algum tempo, apenas tem tido efeito na economia financeira como mecanismo de apoio para os preços. “Isto sugere que chegou a hora das autoridades passarem o testemunho às políticas monetárias para poderem assistir a uma recuperação notável do crescimento económico nos Estados Unidos. Esta possibilidade traz consigo um elevado nível de incerteza, já que as suas possibilidades estão marcadas tanto por acontecimentos políticos como pelo sentido comum aplicado ao plano económico”, indica. Para Luke Bartholomew, gestor da Aberdeen, “não é uma surpresa que nesta reunião não se tenham aplicado subidas das taxas de juro, mas levantaram-se alguns dos bloqueios à subida das mesmas”.

Na sua opinião, a linguagem empregue na reunião sugere que a Fed está menos preocupada com os riscos, comparativamente com outras alturas. “Tudo permanece tranquilo até ao encontro de Jackson Hole, altura em que se poderá encontrar alguma pista de quando é que a subida das taxas de juro vão ter lugar. A possibilidade de mais uma  subida este ano permanece como possibilidade”, assegura. Para além dos menores riscos que – segundo a Fed – existem para a economia americana, da melhoria da robustez do mercado de trabalho e da moderada expansão que a economia norte-americana está a viver, existem outros factores que fazem antever uma subida das taxas em 2016. Um deles é o referido por John Bailer, gestor na Boston Company AM, boutique da BNY Mellon IM: a maior estabilidade dos mercados. “O aumento dos preços dos ativos devido a melhores perspectivas económicas aumenta a probabilidade de que a Fed suba as taxas de juro este ano”, assinala.

Setembro ou dezembro?

Mas, ao mesmo tempo que o tom da Fed parece menos pessimista do que em junho, não há nenhuma indicação da data da próxima subida. Será setembro ou dezembro? Para a Groupama AM, no final de contas, o importante é que a Reserva Federal confirmou que a normalização da sua política monetária será muito gradual. “O Comité de Mercado Aberto (FOMC) está em linha com o nosso cenário de política monetária de uma só subida de taxas este ano; é muito difícil saber com  precisão qual será o timing (setembro ou dezembro), mas atualmente não podemos excluir setembro”, indicam. Da J.P. Morgan AM, pelo contrário, acreditam que o mais provável é que, ao aplicar-se, a subida será em dezembro, mais ainda tendo em conta que em novembro os Estados Unidos celebram eleições para saber quem será o próximo inquilino da Casa Branca. É o que refere Lucía Gutiérrez-Mellado, subdiretora de Estratégia da gestora para Iberia, na sua última apresentação trimestral realizada com jornalistas.

Concordante é também David Buckle, diretor de Análise Quantitativa na Fidelity International, que considera que o 14 de dezembro é a primeira oportunidade que Yellen tem para subir taxas. “Apenas restam três reuniões este ano – setembro, novembro e dezembro. Embora não esteja totalmente descartado, é difícil ver uma subida a 21 de setembro. Ainda há muitos riscos na economia global, para além das presidenciais dos EUA. Creio que vamos necessitar de ver fortes dados de inflação em agosto e setembro (incluída a inflação salarial) para que se assista a uma subida, algo muito pouco provável, na minha opinião. A reunião de 2 de novembro é precisamente 6 dias antes das eleições, portanto um momento totalmente descartável para subir as taxas pela primeira vez no ano. O que nos conduz, deste modo, ao 14 de dezembro. Se nessa altura o dólar não se tiver fortalecido e existir um pouco mais de inflação, existem bastantes probabilidades de uma subida no Natal”.

Por isso sugeriria que, no melhor dos casos, vamos ter uma subida de 0,25% por ano. Se isso não é o que Yellen entende como gradual, então vamos estar ainda muito tempo em mínimos. É o que esperam os investidores. “Por agora o mercado está a descontar que as taxas de juro de países desenvolvidos continuem baixas ou inclusive diminuam, e descartou a hipótese da Fed as subir este ano, enquanto que o Banco do Japão e de Inglaterra levam a cabo novas medidas expansionistas. Isto foi um factor determinante que explica o bom comportamento registado pelos mercados de crédito e pelas divisas emergentes, que se têm aguentado bastante bem. No entanto parece que o mercado considera que enquanto a Fed não aumenta as taxas, tudo vai correndo bem. Mas nós não partilhamos dessa opinião”, diz Andrés Sánchez Balcázar, gestor do Pictet Absolute Return Fixed Income, da Pictet. Para além disso o especialista sublinha que o mercado continua a descontar divergências de taxas de juro entre Estados Unidos e Europa, algo que considera pouco provável, pois o BCE está comprometido com a expansão monetária.